quarta-feira, 18 de maio de 2011

Operação Jerônimo

Por que a ação militar que teria matado Bin Laden mereceu o nome de Operação Jerônimo? Prescott Bush integrava, em 1918, a associação estudantil Skull & Bones (Crânio e Osso). Desafiado pelos colegas, invadiu um cemitério apache e roubou o escalpo do lendário cacique Jerônimo.

Dono de terras no Texas, Prescott tornou-se um exitoso empresário do ramo de petróleo e amigo íntimo de John Foster Dulles, que comandava a CIA por ocasião do assassinato de John Kennedy, em 1963. Dulles convenceu o amigo a fazer um gesto magnânimo e devolver aos apaches o escalpo de Jerônimo. Bush o atendeu, mas não tardou para os indígenas descobrirem que a relíquia restituída era falsa…

A amizade com Dulles garantiu ao filho mais velho de Prescott, George H. Bush, o emprego de agente da CIA. George destacou- se a ponto de, em 1961, coordenar a invasão da Baía dos Porcos, em Cuba, para tentar derrubar o regime implantado pela guerrilha de Sierra Maestra. Malgrado a derrota, tornou-se diretor da CIA em 1976.

Triste com o mau desempenho de seu primogênito como 007, Prescott Bush consolava-se com o êxito dele nos negócios de petróleo. E aplaudiu o faro empresarial do filho quando George, em meados dos anos 60, tornou-se amigo de um empreiteiro árabe que viajava com frequência ao Texas: Muhammad Bin Laden. Em 1968, ao sobrevoar os poços de petróleo de Bush, Bin Laden morreu em acidente aéreo no Texas. Os laços de família, no entanto, estavam criados.

George Bush não pranteou a morte do amigo. Andava mais preocupado com as dificuldades escolares de seu filho George W. Bush, que só obtinha média C. A guerra do Vietnã acirrou-se e, para evitar que o filho fosse convocado, George tratou de alistá-lo na força aérea da Guarda Nacional.

Papai George incentivou o filho a fundar, em meados dos anos 70, sua própria empresa petrolífera, a Arbusto (bush, em inglês) Energy. Gracas aos contatos internacionais que o pai mantinha desde os tempos da CIA, George filho buscou os investimentos de Khaled Bin Mafouz e Salem Bin Laden, o mais velho dos 52 filhos gerados pelo falecido Muhammad. Mafouz era banqueiro da família real saudita e casara com uma das irmãs de Salem. Esses vínculos familiares permitiram que Mafouz se tornasse presidente da Blessed Relief, a ONG árabe na qual trabalhava um dos irmãos de Salem, Osama Bin Laden.

Em dezembro de 1979, George H. Bush viajou a Paris para um encontro entre republicanos e partidários moderados de Khomeini, no qual trataram da libertação dos 64 reféns estadunidenses sequestrados, em novembro, na embaixada dos EUA, em Teerã. Buscava-se evitar que o presidente Jimmy Carter se valesse do episódio e prejudicasse as pretensões presidenciais de Ronald Reagan. Papai George fez o percurso até a capital francesa a bordo do jatinho de Salem Bin Laden, que lhe facilitava o contato com o mundo islâmico. (Em 1988, Salem faleceu, como o pai, num desastre de avião).

Naquele mesmo ano, os soviéticos invadiram o Afeganistão. Papai George, que coordenava operações da CIA, recorreu a Osama, um dos irmãos de Salem, que aceitou infiltrar-se no Afeganistão para, monitorado pela CIA, fortalecer a resistência afegã contra os invasores comunistas.

Os dados acima são do analista italiano Francesco Piccioni. Mais detalhes no livro A fortunate son: George W. Bush and the making of na American President, de Steve Hatfield.

Em 1979, a pedido de George Bush pai, então diretor da CIA, Osama, já com 23 anos, transferiu-se para o Afeganistão para administrar os recursos financeiros destinados às operações secretas da agência contra a invasão soviética àquele país. Preocupado com a ofensiva de Moscou, o governo dos EUA havia liberado a mais alta soma que a CIA recebeu, em toda a sua história, para atuar em um só país: US$ 2 bilhões.

Quando o presidente George W. Bush, após 11 de setembro, enquadrou, como crime anexo ao terrorismo o “aproveitamento ilícito de informações privilegiadas”, sabia do que falava. Tudo indica que, graças a essas informações, Osama Bin Laden montou a sua rede terrorista mundo afora, movimentando recursos através de paraísos fiscais.

Talvez Freud pudesse explicar um detalhe das armas escolhidas pelos terroristas de 11 de setembro: aviões. O pai e o irmão mais velho de Osama Bin Laden morreram em acidentes aéreos, ambos nos EUA.

Se o escalpe de Jerônimo era falso, quem garante que Bin Laden foi mesmo morto na mansão paquistanesa?
Não seria mais útil ao combate ao terrorismo agarrá-lo vivo e obrigá-lo a revelar tudo sobre a Al-Qaeda? Não duvido que, em algum porta-aviões dos EUA, Bin Laden esteja sendo torturado para dizer o que sabe. Depois, basta adotar a “solução argentina”: atirar o corpo ao mar. Caso o encontrem boiando em alguma praia, ficam por conta dos afiados dentes dos peixes as marcas profundas.

Frei Betto - Brasil de Fato

Caso Palocci e seletividade da mídia


Leigos costumam achar que jornalismo é profissão sem rotina. Ledo engano. Todo ano tem Carnaval, Campeonato Brasileiro, enchentes em São Paulo e em cidades do Nordeste; a cada dois, eleições e bienais; de dois em dois ou Copa do Mundo ou Olimpíada; todos os dias, fofocas políticas e denúncias de corrupção. As pautas estão sempre pré-montadas à espera de repórter que lhe acentue os contornos e que tenha disposição para cobri-las com imagens candentes, com frases bombásticas, com depoimentos indignados de cidadãos.

E na falta disso tudo temos sempre de plantão articulistas indignados com o excesso de ação do governo ou, então, com a inação deste. É este o tipo de jornalismo que temos. Cabe aqui a pergunta do plantonista, do observador assíduo da imprensa: mas será este o tipo de jornalismo que gostaríamos de ter?

Perguntas sem respostas

A função do quarto poder é, sem dúvida, controlar e criticar os outros poderes tradicionais, e só pode fazê-lo em país em que vigore o estado de direito e a liberdade de expressão plena, isto porque sua crítica não tem conteúdo repressivo. Portanto, o Brasil atende a esses requisitos. O que não falta é liberdade para opinar e, no caso de se possuir algum veículo de comunicação, a liberdade inclui o direito de alçar à condição de notícia o que em condições normais de temperatura e pressão não passariam de meras suposições.

É corrente a percepção que os meios de comunicação podem influenciar a vida política do país por meio da criação de opinião. Cria-se, então, a opinião e busca-se logo em seguida quem a assine e se disponha a defendê-la publicamente. Umberto Eco foi feliz quando afirmou que os poderes tradicionais não podem controlar os meios de comunicação a não ser através deles mesmos, pois de outra maneira qualquer intervenção sua se converteria em sanção de natureza executiva, legislativa ou judiciária, algo que só pode ocorrer se os meios gerarem situações de desequilíbrio político e institucional.

Mas, surge outra questão – para muitos considerada impertinente! – sobre as reais possibilidades de existir um controle de um meio sobre o outro quando todos estão tão interligados pela preservação de sua própria influência e poderio ostensivo. A idéia monopolista veta este curso de ação e a imprensa se vê isolada, imune a qualquer marco regulatório, uma vez que o dispositivo constitucional não foi regulamentado e que qualquer tentativa nesse sentido terá ampla possibilidade de ser solapada por interesses tacanhos, quando não apenas escusos.

Com o objetivo de movimentar um pouco o noticiário é de se esperar que alguns veículos de comunicação, observando o impressionante estoque de tintas de escândalo armazenadas em suas redações cada vez mais virtuais e menos físicas, sintam-se tentados a cavar uma história em busca de indícios de corrupção. Não apenas de corrupção, mas de grossa corrupção.

Foi o que ocorreu nos últimos dias com as investigações do jornal Folha de S.Paulo sobre o enriquecimento do ministro-chefe da casa Civil Antonio Palocci: seu patrimônio teria aumentado em 20 vezes nos últimos anos. Há que se perguntar o porquê da seletividade: por que apenas Palocci teve esquadrinhada a evolução de seu patrimônio? Não seria interessante levar à mesma alça de tiro duas outras personalidades públicas, por exemplo, um grão-oposicionista e alguma vistosa autoridade do Poder Judiciário?

Obviamente esse é o tipo de pergunta que se formula com absoluta certeza de que não é para valer porque jamais será respondida. Obviamente existem interesses envolvidos, dentre os quais aqueles que se comprazem em ver sombras de suspeição pairando por sobre a Casa Civil do governo Dilma Rousseff.

Defesa vigorosa

É bem difícil para a grande imprensa assistir impávida ao autodesmoronamento da oposição no país, uma oposição tratada nos últimos oito anos a pão de ló, recebendo amplo noticiário para qualquer de suas teses, quer estivessem bem fincadas na realidade quer não. A experiência manda que tenhamos sempre um pé atrás quando, assim do nada ou do "quase nada", surge denúncia de enriquecimento ilícito envolvendo um figurão da República. Por trás da "história" pode existir lista em ordem alfabética de interesses a atender, de beneficiários a contemplar, ainda mais quando o procedimento padrão de investigação parece tão exato e preciso quanto a previsão da ocorrência concomitante de terremotos e de imensas ondas a varrer do mapa cidades e usinas nucleares.

Uma pista àqueles que têm um pendor por acompanhar as idas e vindas da imprensa brasileira é observar a forma como se dá a repercussão: que colunistas impedem que o tema morra por inanição ou por completa ausência de novos fatos; que personagens públicos são chamados a opinar; em que sequência midiática ocorre a repercussão propriamente dita. E também que assuntos que pareciam mortos e enterrados voltam como toque de mágica à superfície dos acontecimentos para abastecer quadros pretensamente explicativos e que levam o prosaico título "para entender o caso". Na pior das hipóteses, é já recorrente o expediente de oferecer bandeiras a quem, na falta delas e na falta de votação expressiva advinda das urnas, precisa de um generoso tempo de sobrevida.

Acompanhemos os desdobramentos. Nestes, encontraremos o vigor com que a imprensa defende de qualquer forma de controle constitucional e democrático a sua liberdade de expressão e de imprensa, de impressão e de pressão.

Por Washington Araújo - Observatório de imprensa

Material explosivo na zona euro

A quebra da zona euro não pode ser evitada com outros bilhões de resgate e novas imposições de austeridade. A população geme sob medidas de austeridade rígidas e responsabiliza a União Europeia por isso. Tendências nacionalistas propagam-se. Mas também em países que se vêem como o caixa da Europa o descontetamento cresce. Nos Países Baixos o “Partido pela Liberdade” quer ter de volta o florim e a retórica anti-euro presenteou ao partido “Finlandeses Verdadeiros” quase 20 por cento nas últimas eleições na Finlândia. Na França, o direitista “Front National” troveja contra o euro. O artigo é de Christa Luft.

Estaria Milton Friedman, o pai do monetarismo, certo? O igualmente influente e polêmico economista norte-americano vaticinou em 2002 que a Eurolândia colapsaria entre cinco e quinze anos. O desenvolvimento dos participantes seria muito desigual, e a ausência da moeda própria impediria uma melhoria de sua capacidade de competição internacional por meio da desvalorização. Uma moeda unificada sem uma política econômica comum e sem uma união fiscal condenaria o projeto de integração ao fracasso.

Uma década transcorreu desde o ridicularizado prognóstico. A críse da dívida do Estado ameaça inflamar o material explosivo na zona euro. Ela compreende, nesse meio tempo, 17 países com 17 diferentes títulos de governo e distintos juros, cotações e rendimentos. Um paraíso para malabaristas financeiros! Esses tomam emprestado barato em países com boa notação de crédito e investem o dinheiro em países apertados por juros mais elevados. Bancos compram títulos do governo dos países em crise, depositam-nos como segurança junto ao Banco Central Europeu, e recebem por isso notas de euro recém impressas a uma taxa de juros baixa. Mercados financeiros decidem pelo destino de Estados democráticos e de milhões de pessoas.

Guarda-chuvas de resgate já foram abertos várias vezes para salvar países da zona euro excessivamente endividados diante da bancarrota ameaçadora. Irlanda, Portugal e Grécia buscaram proteção sob ele. A preocupação cresce de que também a Espanha precisaria estar sob o guarda-chuvas. Especula-se sobre uma saída dos helenos da zona euro ou o refinanciamento.

Aos países carentes de ajuda são prescritas as mais fortes ataduras. Isso estrangula a força de suas economias. A população geme sob medidas de austeridade rígidas e responsabiliza a União Europeia por isso. Tendências nacionalistas propagam-se. Mas também em países que se vêem como o caixa da Europa o descontetamento cresce. Nos Países Baixos o “Partido pela Liberdade” quer ter de volta o florim e a retórica anti-euro presenteou ao partido “Finlandeses Verdadeiros” quase 20 por cento nas últimas eleições na Finlândia. Na França, o direitista “Front National” troveja contra o euro.

Um renovado aumento do guarda-chuvas de resgate – mesmo com referência às vantagens desse – dificilmente será intercedido nos países doadores junto à grande população, pois o principal lucrador é a economia de exportação. Um retorno à moeda nacional deixaria o país em crise afetado afogar-se em suas antigas dívidas em euro. Um refinanciamento poderia ser para a Grécia atualmemte um desafogo. Capitalistas precisariam renunciar a uma parte de suas exigências e aumentar o prazo dos títulos gregos. O problema: atingidos não seriam apenas os investidores privados como seguradoras, fundos de pensão e bancos, mas também os contribuintes. Na Alemanha, o WestLB e o estatizado Hypo Real Estate seriam forçados porventura a amortizações, e o governo federal teria de injetar capital novo.

A quebra da zona euro não pode ser evitada com outros bilhões de resgate e novas imposições de austeridades. Derrubados seriam também juros de usura de bancos privados para créditos a países em dificuldades, enquanto a Eurolândia emite títulos, cujos prêmios de risco seriam reduzidos através da boa notação de crédito de alguns membros da União. A consolidação econômica de países altamente endividados também exige, além de fortes esforços próprios, um programa de investimento europeu de promoção de crescimento.

Fonte: Christa Luft - CM

Quatro frases que fazem o nariz de Pinóquio crescer

1 – Somos todos culpados pela ruína do planeta

A saúde do mundo está feito um caco. ‘Somos todos responsáveis’, clamam as vozes do alarme universal, e a generalização absolve: se somos todos responsáveis, ninguém é. Como coelhos, reproduzem-se os novos tecnocratas do meio ambiente. É a maior taxa de natalidade do mundo: os experts geram experts e mais experts que se ocupam de envolver o tema com o papel celofane da ambiguidade. Eles fabricam a brumosa linguagem das exortações ao ‘sacrifício de todos’ nas declarações dos governos e nos solenes acordos internacionais que ninguém cumpre.

Estas cataratas de palavras – inundação que ameaça se converter em uma catástrofe ecológica comparável ao buraco na camada de ozônio – não se desencadeiam gratuitamente. A linguagem oficial asfixia a realidade para outorgar impunidade à sociedade de consumo, que é imposta como modelo em nome do desenvolvimento, e às grandes empresas que tiram proveito dele. Mas, as estatísticas confessam..

Os dados ocultos sob o palavreado revelam que 20 por cento da humanidade cometem 80 por cento das agressões contra a natureza, crime que os assassinos chamam de suicídio, e é a humanidade inteira que paga as consequências da degradação da terra, da intoxicação do ar, do envenenamento da água, do enlouquecimento do clima e da dilapidação dos recursos naturais não-renováveis.

A senhora Harlem Bruntland, que encabeça o governo da Noruega, comprovou recentemente que, se os 7 bilhões de habitantes do planeta consumissem o mesmo que os países desenvolvidos do Ocidente, “faltariam 10 planetas como o nosso para satisfazerem todas as suas necessidades.” Uma experiência impossível.

Mas, os governantes dos países do Sul que prometem o ingresso no Primeiro Mundo, mágico passaporte que nos fará, a todos, ricos e felizes, não deveriam ser só processados por calote. Não estão só pegando em nosso pé, não: esses governantes estão, além disso, cometendo o delito de apologia do crime. Porque este sistema de vida que se oferece como paraíso, fundado na exploração do próximo e na aniquilação da natureza, é o que está fazendo adoecer nosso corpo,  está envenenando nossa alma e está deixando-nos sem mundo.

2 – É verde aquilo que se pinta de verde

Agora, os gigantes da indústria química fazem sua publicidade na cor verde, e o Banco Mundial lava sua imagem, repetindo a palavra ecologia em cada página de seus informes e tingindo de verde seus empréstimos. “Nas condições de nossos empréstimos há normas ambientais estritas”, esclarece o presidente da suprema instituição bancária do mundo. Somos todos ecologistas, até que alguma medida concreta limite a liberdade de contaminação.

Quando se aprovou, no Parlamento do Uruguai, uma tímida lei de defesa do meio-ambiente, as empresas que lançam veneno no ar e poluem as águas sacaram, subitamente, da recém-comprada máscara verde e gritaram sua verdade em termos que poderiam ser resumidos assim: “os defensores da natureza são advogados da pobreza, dedicados a sabotarem o desenvolvimento econômico e a espantarem o investimento estrangeiro.”

O Banco Mundial, ao contrário, é o principal promotor da riqueza, do desenvolvimento e do investimento estrangeiro. Talvez, por reunir tantas virtudes, o Banco manipulará, junto à ONU, o recém-criado Fundo para o Meio-Ambiente Mundial. Este imposto à má consciência disporá de pouco dinheiro, 100 vezes menos do que haviam pedido os ecologistas, para financiar projetos que não destruam a natureza. Intenção inatacável, conclusão inevitável: se esses projetos requerem um fundo especial, o Banco Mundial está admitindo, de fato, que todos os seus demais projetos fazem um fraco favor ao meio-ambiente.

O Banco se chama Mundial, da mesma forma que o Fundo Monetário se chama Internacional, mas estes irmãos gêmeos vivem, cobram e decidem em Washington. Quem paga, manda, e a numerosa tecnocracia jamais cospe no prato em que come. Sendo, como é, o principal credor do chamado Terceiro Mundo, o Banco Mundial governa nossos escravizados países que, a título de serviço da dívida, pagam a seus credores externos 250 mil dólares por minuto, e lhes impõe sua política econômica, em função do dinheiro que concede ou promete.

A divinização do mercado, que compra cada vez menos e paga cada vez pior, permite abarrotar de mágicas bugigangas as grandes cidades do sul do mundo, drogadas pela religião do consumo, enquanto os campos se esgotam, poluem-se as águas que os alimentam, e uma crosta seca cobre os desertos que antes foram bosques.

3 – Entre o capital e o trabalho, a ecologia é neutra

Poder-se-á dizer qualquer coisa de Al Capone, mas ele era um cavalheiro: o bondoso Al sempre enviava flores aos velórios de suas vítimas... As empresas gigantes da indústria química, petroleira e automobilística pagaram boa parte dos gastos da Eco 92: a conferência internacional que se ocupou, no Rio de Janeiro, da agonia do planeta. E essa conferência, chamada de Reunião de Cúpula da Terra, não condenou as transnacionais que produzem contaminação e vivem dela, e nem sequer pronunciou uma palavra contra a ilimitada liberdade de comércio que torna possível a venda de veneno.

No grande baile de máscaras do fim do milênio, até a indústria química se veste de verde. A angústia ecológica perturba o sono dos maiores laboratórios do mundo que, para ajudarem a natureza, estão inventando novos cultivos biotecnológicos. Mas, esses desvelos científicos não se propõem encontrar plantas mais resistentes às pragas sem ajuda química, mas sim buscam novas plantas capazes de resistir aos praguicidas e herbicidas que esses mesmos laboratórios produzem. Das 10 maiores empresas do mundo produtoras de sementes, seis fabricam pesticidas (Sandoz-Ciba-Geigy, Dekalb, Pfizer, Upjohn, Shell, ICI). A indústria química não tem tendências masoquistas.

A recuperação do planeta ou daquilo que nos sobre dele implica na denúncia da impunidade do dinheiro e da liberdade humana. A ecologia neutra, que mais se parece com a jardinagem, torna-se cúmplice da injustiça de um mundo, onde a comida sadia, a água limpa, o ar puro e o silêncio não são direitos de todos, mas sim privilégios dos poucos que podem pagar por eles. Chico Mendes, trabalhador da borracha, tombou assassinado em fins de 1988, na Amazônia brasileira, por acreditar no que acreditava: que a militância ecológica não pode divorciar-se da luta social. Chico acreditava que a floresta amazônica não será salva enquanto não se fizer uma reforma agrária no Brasil. Cinco anos depois do crime, os bispos brasileiros denunciaram que mais de 100 trabalhadores rurais morrem assassinados, a cada ano, na luta pela terra, e calcularam que quatro milhões de camponeses sem trabalho vão às cidades deixando as plantações do interior. Adaptando as cifras de cada país, a declaração dos bispos retrata toda a América Latina. As grandes cidades latino-americanas, inchadas até arrebentarem pela incessante invasão de exilados do campo, são uma catástrofe ecológica: uma catástrofe que não se pode entender nem alterar dentro dos limites da ecologia, surda ante o clamor social e cega ante o compromisso político.

4 – A natureza está fora de nós

Em seus 10 mandamentos, Deus esqueceu-se de mencionar a natureza. Entre as ordens que nos enviou do Monte Sinai, o Senhor poderia ter acrescentado, por exemplo: “Honrarás a natureza, da qual tu és parte.” Mas, isso não lhe ocorreu. Há cinco séculos, quando a América foi aprisionada pelo mercado mundial, a civilização invasora confundiu ecologia com idolatria.

A comunhão com a natureza era pecado. E merecia castigo. Segundo as crônicas da Conquista, os índios nômades que usavam cascas para se vestirem jamais esfolavam o tronco inteiro, para não aniquilarem a árvore, e os índios sedentários plantavam cultivos diversos e com períodos de descanso, para não cansarem a terra. A civilização, que vinha impor os devastadores monocultivos de exportação, não podia entender as culturas integradas à natureza, e as confundiu com a vocação demoníaca ou com a ignorância. Para a civilização que diz ser ocidental e cristã, a natureza era uma besta feroz que tinha que ser domada e castigada para que funcionasse como uma máquina, posta a nosso serviço desde sempre e para sempre.

A natureza, que era eterna, nos devia escravidão. Muito recentemente, inteiramo-nos de que a natureza se cansa, como nós, seus filhos, e sabemos que, tal como nós, pode morrer assassinada. Já não se fala de submeter a natureza. Agora, até os seus verdugos dizem que é necessário protegê-la. Mas, num ou noutro caso, natureza submetida e natureza protegida, ela está fora de nós. A civilização, que confunde os relógios com o tempo, o crescimento com o desenvolvimento, e o grandalhão com a grandeza, também confunde a natureza com a paisagem, enquanto o mundo, labirinto sem centro, dedica-se a romper seu próprio céu.

16 de maio de 2011
Por Eduardo Galeano
Escritor e Jornalista urugaio

Com presença de Lula, Foro de SP debate novos rumos da esquerda

Desafios para a esquerda na América Latina, crise do capitalismo, guerra na Líbia, crescimento econômico da China e imperialismo dos Estados Unidos são alguns dos temas que serão abordados na 17ª edição do Foro de São Paulo. O encontro começa nesta quarta-feira (18) em Manágua, Nicarágua, e vai até sexta (20).


Um dos principais assuntos discutidos será a integração latino-americana e caribenha, já que o encontro está programado para as vésperas da criação e consolidação da Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), em Caracas, na Venezuela.

A reunião aproveitará o ano em que o país comemora o 32º aniversário da Revolução Sandinista – quando a oposição organizou constantes protestos contra a ditadura de Anastácio Somoza. A campanha, liderada pela Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN), levou à derrota militar da ditadura em 1979. Com isso, os esforços da FSLN, que governou de 1979 até 1990, levaram a sociedade a uma reforma econômica, fazendo o país adotar diretrizes de esquerda no governo.

Haverá, dentro da programação, exposições de representantes do governo nicaraguense e exibição de documentários da Frente Sandinista de Libertação Nacional. Está prevista uma exposição de Iván Acosta, vice-ministro da Fazenda da Nicarágua e de Paul Oquist Kelley, secretário privado para Políticas Nacionais da Nicarágua sobre as realizações do governo de Reconstrução e Unidade Nacional.

 No evento de três dias, que terá a presença do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, se discutirá também a crise internacional do capitalismo, o "contra-ataque" da direita na América Latina e no Caribe, e os desafios atuais das esquerdas populares na região. As informações constam no documento de base elaborado pelo Grupo de Trabalho do Foro de São Paulo.

"Em relação à Líbia, embora existam diferentes opiniões sobre o conteúdo do governo (de Muamar) Kadafi, é fundamental uma rejeição categórica contra a ingerência externa, intervenção militar e contra os riscos à soberania nacional líbia", indicou o documento.

Além disso, serão discutidas as manifestações populares na Tunísia, Egito, Bahrein, Omã, Iêmen e Marrocos, que "dificultam o exercício da hegemonia dos Estados Unidos e Israel na região" e "afetam os preços do petróleo", de acordo com o documento oficial.

Outro aspecto do debate será a crescente participação chinesa na economia europeia, africana e latino-americana, e inclusive na norte-americana. O documento de trabalho indica que o crescimento da China constitui não só um fenômeno econômico, mas tem "projeções políticas e militares que o Foro deve debater com muita atenção".

A crise internacional do capitalismo e a deterioração da política norte-americana que procura enfrentá-la "lançando mão de sua hegemonia monetária e militar" será outro tema de discussão no encontro da esquerda continental. Além disso, serão analisados os desafios das esquerdas populares, democráticas, nacionalistas, socialistas e comunistas na América Latina, entre eles, o de "manter os espaços conquistados", assinala o texto base do Foro.

Espera-se a presença de mais de 80 partidos e organizações de 50 países, segundo o coordenador de evento, Jacinto Suárez, secretário de Relações Internacionais da legenda governista na Nicarágua, FSLN (Frente Sandinista de Libertação Naciona). O encontro lembra o 50º aniversário da FSLN e o 116º aniversário de nascimento do herói nacionalista Augusto César Sandino, que inspirou a Revolução Sandinista.

Entre os integrantes do foro estão partidos socialistas e comunistas de diversos países, movimentos como Frente Ampla (Uruguai e Costa Rica) e a Frente Grande (Argentina), Frente Farabundo Martí para la Liberación Nacional (El Salvador), Polo Democrático Alternativo (Colômbia), a Frente Nacional de Resistencia Popular de Honduras, Frente Sandinista de Liberación Nacional da Nicarágua e o Partido Comunista Cubano. Do Brasil participam o PT, o PCdoB, o PCB, o PDT, o PSB.

No dia 20, na maior plenária do encontro, o debate girará em torno do tema "Construindo uma mudança de era: o projeto alternativo dos setores populares, progressistas e de esquerda latino-americana". E na plenária final, serão apresentadas as conclusões de todos os grupos de trabalho.

Antes do evento, três secretarias regionais deverão estar reunidas para discussão, entre elas, a Andino-Amazônica, Cone Sul e Centroamérica-Caribe. Durante o evento, os participantes assistirão ao documentário sobre a história da Frente Sandinista de Liberação Nacional, de acordo com a agenda divulgada.

Vermelho, com agências.