segunda-feira, 20 de junho de 2011

FEIRA DE SANTANA FOI DESRESPEITADA

Por Genaldo de Melo

A iniciativa da Assembleia Legislativa da Bahia de fazer sessões itinerantes é pioneira do ponto de vista da democratização do poder, porque proporciona o acompanhamento do funcionamento da ordem do dia, do pequeno e do grande expediente da Casa. Coisa diferente para quem não conhece os trâmites daquela área de atuação parlamentar.
Trazer os nobres deputados para Feira de Santana para aprovarem atos legislativos de interesse maior, reveste-se de simbologia o próprio ato, porque na Bahia o acesso ao plenário do Legislativo é coisa naturalmente difícil, tanto para lideranças do povo, bem como para o próprio povo.
A casa do Parlamento baiano localiza-se num espaço inacessível, parece que foi feito exatamente para ninguém ver o que acontece no local. Bom moço deve ter sido quem pensou dessa forma, o poder longe do povo!
Mas pelo menos muita gente de Feira de Santana teve a oportunidade de ver de perto como se comportam alguns representantes do povo baiano. Houve deputado que teve a capacidade de respeitar o povo da cidade, apresentando-se como manda o figurino e cumprindo o seu papel na tribuna legislativa. Mas foram poucos esses que sabem ser educados e se comportar como gente decente em público, tanto da situação como da oposição.
Agora o que chamou mesmo a atenção dos presentes ao Teatro Amélio Amorim, foi a falta de respeito de alguns sujeitos que vestem paletós e gravatas para assumir a postura de representantes do povo, o título de deputado baiano. Alguns desses bons moços esbravejaram palavras de baixo escalão, desrespeitando o povo presente e a opinião pública.
Teve parlamentar que chamou a mídia feirense constituída, bem como os formadores de opinião de mercenários, bem como teve parlamentar que chamou instituições também constituídas de praticarem roubo ao erário público, sem apresentar provas convincentes.
O primeiro deveria respeitar pelo menos os representantes legítimos dos meios de comunicação locais, os jornalistas e os blogueiros que fazem opinião, bem como as pessoas que pensam, escrevem e falam, e são livres de correntes da dependência econômica. Em relação ao segundo, tenho que me calar, pois não sou representante de locuções partidárias, e considero que quem deveria responder ao mal-educado deveria ser os representantes das próprias agremiações agredidas publicamente.
Mas considero que ambos fizeram um papel ultrajante, de desrespeito a quem foi ao Amélio Amorim ver civilidade e coerência, com o Parlamento como interlocutor da sociedade com o Governo constituído.
Ainda bem que aprovaram o minguado projeto da Região Metropolitana de Feira de Santana, e ainda conseguiram homenagear algumas pessoas, que representam simbolicamente o trabalho feito fora dos aparelhos do poder constituído.
Na opinião de muitos, os deputados, colocando exceções claras, fizeram da primeira sessão itinerante um grande circo, aonde transformaram o povo nos verdadeiros palhaços, enquanto os mesmos apenas aproveitaram o picadeiro como animais.
Deputado eleito pelo povo deveria se dar ao respeito de pelo menos respeitar quem lhe ouve, fiscalizar o Poder Executivo, propor políticas que de fato melhore a vida do povo, bem como se comportar como deputado, e não    querer fazer circo para roubar a cena. Tomara que em Vitória da Conquista, eles respeitem aquele povo civilizado como os feirenses, porque senão realmente vamos ter que concordar com a opinião de alguns ignorantes, de que não precisamos de políticos

Gramsci e seu “grito de guerra” ecoam na blogosfera progressista

Salvo engano, o nome de Antonio Gramsci (1891-1937) não foi citado nos debates do 2º Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas, que ocorre desde sexta-feira (17) em Brasília. Mas um texto escrito há 95 anos pelo revolucionário italiano sintetiza um dos consensos mais cristalizados do movimento pela democratização da mídia.

Por André Cintra - Vermelho

Em Os Jornais e os Operários, de 1916, Gramsci exortava os trabalhadores a romperem todos os laços com a imprensa burguesa. Numa época em que a TV nem sequer existia e o rádio ainda era uma mídia incipiente e experimental – um “telégrafo sem fio” –, o jornal despontava como a principal arma de dominação ideológica do operariado.

“Antes de mais nada, o operário deve negar decididamente qualquer solidariedade com o jornal burguês. Deveria recordar-se sempre, sempre, sempre, que o jornal burguês (qualquer que seja sua cor) é um instrumento de luta movido por ideias e interesses que estão em contraste com os seus”, denunciava Gramsci. “Tudo o que se publica é constantemente influenciado por uma ideia: servir à classe dominante, o que se traduz sem dúvida num fato: combater a classe trabalhadora.”

Daí a conclamação do pensador italiano a que não se iludissem com a “grande imprensa” da época. Mais ainda, que não comprassem nem assinassem os jornais inimigos, para não garantir a viabilidade financeira do empreendimento. “Não contribuam com dinheiro para a imprensa burguesa que vos é adversária. Eis qual deve ser o nosso grito de guerra neste momento, caracterizado pela campanha de assinatura de todos os jornais burgueses: ‘Boicotem, boicotem, boicotem!’”, arrematava Gramsci.

Quase um século depois, os participantes do encontro da blogosfera parecem decididos a não dar tréguas à grande mídia. Já não se trata apenas de jornais. A imprensa burguesa deixou de ser somente impressa e se converteu num gigantesco aparato multimídia, que inclui também grandes emissoras de TV e rádio, revistas (sobretudo as semanais), portais na internet e provedores de conteúdo para dispositivos móveis. Como enfrentar esse centauro midiático – verdadeira aberração da civilização contemporânea?
O “medo de se indispor”
Um dos consensos que já é possível extrair do Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas, antes mesmo da plenária final deste domingo (19) – e ainda que não haja uma resolução formal –, é que a luta contra a grande mídia tem de se fortalecer. É preciso, claro, que o governo tome medidas aparentemente mais simples, como alastrar a internet via banda larga. Mas urge, acima de tudo, ter ousadia e coragem para lutar contra o oligopólio que toma conta das comunicações.

Na abertura do encontro, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ironizou os “falsos formadores de opinião que já não formam opinião nem na casa deles”. Implicitamente, porém, admitiu que o governo federal, tanto com ele quanto com a presidente Dilma Rousseff, não conseguiu alterar a correlação de forças do setor. Ao salientar que as propostas de marco regulatório “mexem com grandes interesses”, Lula deixou claro que a batalha não está ganha – ao contrário, apenas emergiu.

Com conhecimento de causa, dois outros convidados do encontro – a deputada federal Luiza Erundina (PSB-SP) e o ex-ministro José Dirceu (PT-SP) – lembraram, em mesas diferentes, que a maioria dos políticos tem medo de se indispor com a grande mídia. Não é por acaso que a Câmara dos Deputados criou apenas neste ano a Frente Parlamentar pela Liberdade de Expressão e o Direito à Comunicação com Participação Popular (Frentecom), com mais de mais de cem entidades e sob a coordenação de Erundina. “Já não me sinto tão só”, afirmou a deputada.
35 grupos
Já o jurista Fábio Konder Comparato sustentou que “todos os poderes do Estado, inclusive a mídia, estão nas mãos de oligarquias. Os órgãos e as instituições do Estado brasileiro não têm poder de fato. Eles agem sob pressão dos grupos que efetivamente detêm poder”.

Comparato acredita que o Executivo “cede fácil às cobranças” das grandes redes de comunicação. Para começar a reverter essa lógica, basta que o Congresso regulamente os artigos da Constituição de 1988 sobre o tema – especialmente o que proíbe a existência de oligopólios no setor. São da autoria de Comparato, aliás, as ações diretas de inconstitucionalidade que cobram a regulamentação dessas medidas.

O desafio até lá, é resistir a tais pressões dos 35 grupos que controlam 516 empresas de comunicação do Brasil. Ou, em outras palavras, fazer valer o “grito de guerra” proposto por Gramsci: “Boicote, boicote, boicote” ao oligopólio midiático. Já!

Plano plurianual focará desenvolvimento e combate à pobreza

O eixo de desenvolvimento do plano plurianual (PPA) dos próximos quatro anos (2012-2015) focará a manutenção do desenvolvimento econômico e o combate à pobreza. Para o cumprimento das metas estabelecidas, o governo estipulou como prioridade o investimento em educação, ciência e tecnologia. Segundo a secretária de Planejamento e Investimentos Estratégicos do Ministério do Planejamento, Lúcia Falcon, a peça vai reafirmar algumas conquistas que o país teve nos últimos anos e avançar um pouco mais.

“Vamos avançar um pouco mais. A ideia é consolidar esse processo de desenvolvimento, apoiado no nosso mercado interno, em um papel soberano independente no mundo. Defendendo direitos humanos e muito preocupado com equidade, o combate à pobreza e o enfrentamento da pobreza extrema. Para dar sustentação a esse processo, a gente sabe que se não tiver educação, ciência e tecnologia não é possível”, afirmou.

O PPA fixa diretrizes, objetivos e metas para as despesas de capital e despesas de duração continuada dos quatro anos seguintes ao início do mandato presidencial.

Para Lúcia, sem desenvolvimento tecnológico o país fica “obsoleto”, o que pode prejudicar a forte posição econômica que o Brasil alcançou nos últimos anos. “Em breve, nossas indústrias vão ficar obsoletas, vamos ter que importar de novo e, aí, continua a dependência. Queremos dar mais uma coluna nessa construção, que seria o pilar do desenvolvimento humano, das pessoas e do desenvolvimento tecnológico. É um suporte para que continue o crescimento econômico”, completou.

Além disso, o PPA que será seguido nos próximos quatro anos vai ser desburocratizado. Segundo Lúcia, essa é a nova meta do Ministério do Planejamento que quer aproximar o programa dos anseios da sociedade. Para isso, três tópicos foram acrescentados à peça que, antes, só continha valores orçamentários. Haverá participação da sociedade na discussão e no monitoramento do PPA, a linguagem deixará de ser técnica e passará a ser “mais amigável” e todos as deliberações discutidas, envolvendo despesas ou não, serão listadas.

“Antes, nada disso era possível achar no PPA. Não tinha espaço para o que não fosse dinheiro. Muitas vezes, o conselho setorial se reunia, fazia um pacote de propostas e, na hora que chegava no PPA, via só o dinheiro, mas o conjunto da obra não aparecia. Agora vai aparecer. Tanto o que tem a ver com dinheiro, quanto ações institucionais ou normativas”, explicou.

Com essa nova metodologia, a principal mudança é saber os benefícios das políticas públicas para a sociedade após a fixação das metas, ou seja, o que mudou na vida das pessoas. Por exemplo, não adianta o governo federal disponibilizar verba para a compra de ambulâncias se, quando chegam aos municípios, os veículos esbarram na burocracia para emplacamento e não chegam nem a sair do depósito.

Segundo Lúcia, a mudança está relacionada ao perfil de gestão da presidente Dilma Rousseff e também da ministra do Planejamento, Miriam Belchior. “As duas são adeptas a um bom controle de gestão. Querem medir o impacto final das políticas públicas”, avaliou. A secretária de Planejamento de Investimentos Estratégicos destaca, nessa nova abordagem, a vantagem de se avaliar o grau de eficácia do PPA na solução dos problemas. “[É] Saber o que eu mudei na vida das pessoas depois de gastar esse dinheiro e trabalhar quatro anos. Hoje, se olharmos somente o sistema do planejamento, só se encontra informações orçamentárias.”

Para que o novo método tenha êxito, o Ministério do Planejamento organizou o Fórum Interconselhos do PPA, no qual representantes de vários segmentos, de todas as unidades federativas brasileiras, se reuniram para discutir os planos e diretrizes da peça. Durante dois dias, cerca de 400 representantes de 32 conselhos e 86 entidades representativas da sociedade expuseram as necessidades regionais e setoriais.

Como a continuidade do fórum, na última semana, ocorreram reuniões em cada região do país, para conhecer as necessidades de cada localidade. “Os grupos que trabalharam nas questões regionais fizeram comentários e apontaram pontos críticos que nós iremos levar aos ministérios setoriais”, explicou Lúcia.

Fonte: Agência Brasil

PCdoB promete aumentar candidaturas

O PCdoB, em seminário que se encerrou ontem, em Brasília, deixou claro seu desejo de deixar de ser periférico para atuar como protagonista nas políticas públicas. Nas próximas eleições, a meta da legenda, que passou 60 de seus 89 anos na clandestinidade, é quintuplicar o número de candidatos a prefeitos no país.

Se eram aproximadamente 200 nas eleições de 2008, vão ser mais de mil candidatos no ano que vem, conforme atesta o deputado Osmar Júnior, líder do PCdoB na Câmara e ex-vice-governador do Piauí.

Na Bahia, pode-se dizer que a largada em busca da ampliação de espaços já foi dada. Mesmo indo na contramão do discurso de unificação do
projeto por parte do PT, os comunistas já anunciaram que terão candidatura própria nas cidades classificadas como peças-chave no estado – Salvador, Vitória da Conquista, Feira de Santana, Itabuna e Lauro de Freitas. O objetivo é elevar ainda mais esse número. 

 Para o embate em Feira de Santana, segunda maior cidade da Bahia, o nome do ex-vereador Messias Gonzaga é dado como certo. Em Itabuna, a articulação em prol de 2012 também está a todo vapor. Está no páreo para representar a legenda o vereador Wenceslau Júnior, estrela em ascensão do PCdoB e fortíssimo candidato, sobretudo depois das eleições de 2010, quando recebeu mais de 32 mil votos para a Assembleia Legislativa.

Em Lauro de Freitas, o cenário não é diferente. Em entrevista à imprensa local, o presidente estadual do PCdoB, deputado federal Daniel Almeida, afirmou que a filiação do deputado estadual Chico Franco (hoje, do PDT)  nas hostes comunistas está prestes a se concretizar e ele será o candidato do partido para disputar a prefeitura do município.

O deputado estadual Fabrício Falcão, por sua vez, não cansa de anunciar que é pré-candidato a prefeito de Vitória da Conquista. A capital baiana, maior colégio eleitoral do estado, sem dúvida não fica de fora. O martelo já foi batido em prol da pré-candidatura da deputada federal, Alice Portugal. (Fernanda Chagas - TB)

Eric Hobsbawm: crise econômica explica deriva à direita na Europa

O blog do italiano Beppe Grillo entrevistou Eric Hobsbawm, um dos maiores historiadores marxistas vivo. A entrevista aconteceu no dia do seu 94º aniversário, quando esteve em Roma para o lançamento da tradução italiana de seu livro How to Change the World - Why rediscover the inheritance of Marxism.
Hobsbawm analisa a possibilidade de uma deriva rumo à direita nos próximos anos na Europa, por razões relacionadas com a depressão econômica, a ânsia por segurança e a estagnação da União Europeia, arcada sob o peso da obrigação de ser cada vez maior e maior e pela falta de visão política comum. Além disso, os movimentos de resistência têm crescido mais em regiões onde há um maior número de jovens – por exemplo no norte da África e nos países em desenvolvimento, não na Europa. Mas, acima de tudo, Hobsbawm, que faz questão de dizer que é um historiador, não um futurologista – fala-nos sobre o que é hoje o marxismo e sobre os seus efeitos.

Marxismo hoje

Eric Hobsbawm: Sou o Eric Hobsbawm. Sou um historiador muito velho. Como tal, telefona-me no dia do meu 94º aniversário. Durante toda a minha vida escrevi principalmente sobre a história dos movimentos sociais, a história geral da Europa e do mundo dos séculos 19 e 20. Acho que todos os meus livros estão traduzidos para italiano e alguns foram até bastante bem recebidos.

Blog de Beppe Grillo: A nossa primeira pergunta é sobre o seu livro. O marxismo é considerado um fenômeno pós-ideológico. Poderia explicar-nos porquê? E quais serão as consequências dessa mudança?

Eric Hobsbawm: Eu não usei exatamente a expressão “fenômeno pós-ideológico” para marxismo, mas é verdade que, no momento, o marxismo deixou de ser o principal sistema de crenças associado aos grandes movimentos políticos de massa em toda a Europa. Apesar disso, acho que sobrevivem alguns pequenos movimentos marxistas. Nesse sentido, houve uma grande mudança no papel político que o marxismo desempenha na política da Europa. Há algumas partes do mundo, por exemplo, a América Latina, em que as coisas não se passaram do mesmo modo. A consequência daquela mudança, na minha opinião, é que agora todos podemos concentrar-nos mais e melhor nas mudanças permanentes que o marxismo provocou, nas conquistas permanentes do marxismo.

Essas conquistas permanentes, na minha opinião, são as seguintes: Primeiro, Marx introduziu algo que foi considerado novidade e ainda não se realizou completamente, a saber, a crença de que o sistema econômico que conhecemos não é permanente nem destinado a durar eternamente; que é apenas uma fase, uma etapa no desenvolvimento histórico que acontece de um determinado modo e deixará de existir e converter-se-á noutra coisa ao longo do tempo.

Segundo, acho que Marx concentrou-se na análise do específico modus operandi, do modo como o sistema operou e se desenvolveu. Em particular, concentrou-se no curioso e descontinuo modo através do qual o sistema cresceu e desenvolveu contradições, que por sua vez produziram grandes crises.

A principal vantagem da análise que o marxismo permite fazer é que considera o capitalismo como um sistema que origina periodicamente contradições internas que geram crises de diferentes tipos que, por sua vez, têm de ser superadas mediante uma transformação básica ou alguma modificação menor do sistema. Trata-se desta descontinuidade, deste reconhecimento de que o capitalismo opera não como sistema que tende a se auto-estabilizar, mas que é sempre instável e eventualmente, portanto, requere grandes mudanças. Esse é o principal elemento que ainda sobrevive do marxismo.

Terceiro, e acho que aí está a preciosidade do que se poderá chamar de fenômeno ideológico, o marxismo é baseado, para muitos marxistas, num senso profundo de injustiça social, de indignação contra a desigualdade social entre os pobres e os ricos e poderosos.

Quarto, e último, acho que talvez se deva considerar um elemento – que Marx talvez não reconhecesse – mas que esteve sempre presente no marxismo: um elemento de utopia. A crença de que, de um modo ou de outro, a sociedade chegará a uma sociedade melhor, mais humana, do que a sociedade na qual todos vivemos atualmente.

Deriva à direita na Europa
Blog: No norte da África e em alguns países europeus – Espanha, Grécia e Irlanda – alguns movimentos de jovens que nasceram na internet e usam redes, por exemplo Twitter e Facebook, estão aproximando-se da política. São movimentos que exigem mais envolvimento e mudanças radicais nas escolhas das sociedades. Mas, ao mesmo tempo, a Espanha tende à direita; a Dinamarca votou pelo encerramento das fronteiras com a Hungria; e na Finlândia, e até mesmo na França, com Marie Le Pen, estão surgindo partidos nacionalistas de extrema-direita. Não é isto uma contradição?

Eric Hobsbawm: Não, não acho. Acho que são fenômenos diferentes. Acho que, na maioria dos países ocidentais, hoje, os jovens são uma minoria politicamente ativa, largamente por efeito de como a educação é construída. Por exemplo: os estudantes sempre foram, ao longo dos séculos, elementos ativistas. Ao mesmo tempo, a juventude educada hoje é muito mais familiarizada com modernas tecnologias de informação, que transformaram a agitação política transnacional e a mobilização política transnacional.

Mas há uma diferença entre esses movimentos de jovens educados nos países do ocidente, onde, em geral, toda a juventude é fenômeno de minoria, e movimentos similares de jovens em países islâmicos e em outros lugares, nos quais a maioria da população tem entre 25 e 30 anos. Nesses países, portanto, muito mais do que na Europa, os movimentos de jovens são politicamente muito mais massivos e podem ter maior impacto político. O impacto adicional na radicalização dos movimentos de juventude acontece porque os jovens hoje, em período de crise econômica, são desproporcionalmente afetados pelo desemprego e, portanto, estão desproporcionalmente insatisfeitos. Mas não se pode adivinhar que rumos tomarão esses movimentos. No todo, os movimentos dessa juventude educada não são, politicamente falando, movimentos da direita. Mas eles só, eles pelos seus próprios meios, não são capazes de definir o formato da política nacional e todo o futuro. Creio que, nos próximos dois meses, assistiremos aos desdobramentos desse processo.

Os jovens iniciaram grandes revoluções, mas não serão eles que necessariamente decidirão a direção geral pela qual andarão aquelas revoluções. Cada direção, claro, depende do país e da região. Obviamente as revoluções serão muito diferentes nos países islâmicos, do que são na Europa ou, claro, nos EUA.

E é verdade que na Europa e provavelmente nos EUA pode haver uma deriva para a direita, na política. Mas isso, parece-me, será assunto da terceira pergunta.

Crise econômica

Blog: Sim, a próxima pergunta é sobre a crise econômica em que vivemos desde 2008. As crises de 29, 33, levaram o fascismo ao poder. Prevê algum risco de a crise atual ter os efeitos que tiveram as crises de 28, 29, 33?

Eric Hobsbawm: Bem, não há dúvidas de que a crise, a crise econômica que se arrasta desde 2008, tem muito a ver com a deriva à direita na Europa. Acho que, hoje, só quatro economias na Europa, na União Europeia, estão sob governos de centro ou de esquerda. Algumas daquelas devem perder. A Espanha provavelmente também se moverá em direção à direita. Nesse sentido, parece verdade. Não acho que haja aí qualquer risco de ascensão do fascismo, como nos anos 1930s. O perigo do fascismo nos anos 1930s foi, em grande medida, resultado da conversão de um país em particular, um país decisivo politicamente, nomeadamente a Alemanha sob a alçada de Hitler.

Não há sinal de que nada disso esteja a acontecer hoje. Nenhum dos países importantes, segundo me parece, dá qualquer sinal nessa direção. Nem nos EUA, onde há um forte movimento direitista, pode-se concluir que aquele movimento ganhe poder nas urnas. Nem, tampouco, no caso dos partidos e movimentos de extrema-direita nos países europeus. Apesar de serem fortes, têm-se mantido como fortes minorias sem grandes hipóteses de se tornarem maiorias. Mas, sim, creio que, no futuro próximo, praticamente todos ou quase todos os países europeus serão governados por governos de direita, de um tipo ou de outro. Recorde-se que um dos efeitos logo termo da crise econômica dos anos 1930 foi que praticamente toda a Europa tornou-se democrata e de esquerda, como jamais antes acontecera. Mas isso levou algum tempo. Portanto, há um risco, mas não é o mesmo risco que havia nos anos 1930. O risco é antes o de não se agir o suficiente para lidar com os problemas básicos, enaltecidos pelo capitalismo dos últimos 40 e enfatizados pelo renascimento dos estudos marxistas.

Blog: O que pensa sobre a União Europeia e sobre o que já foi conseguido? A União Europeia conseguirá consolidar-se ou voltará a ser uma simples reunião de estados?

Eric Hobsbawm: Acho que a esperança de que a União Europeia venha a ser algo mais que uma aliança de estados e área de livre comércio, essa, não tem grande futuro. Não irá muito além do que já foi até aqui, mas não acho que seja destruída.

Acho que o que já se fez, um grau de livre comércio, um grau muito mais importante de jurisprudência comum e lei comum permanecerão. A principal fraqueza da União Europeia, parece-me, razão do fracasso, foi o conflito entre a economia e a base social da União Europeia. Um conflito que resultou da tentativa para eliminar a guerra entre a França e a Alemanha e unificar economicamente as partes mais ricas e desenvolvidas da Europa. Esse objetivo foi alcançado. Tal foi misturado em seguida com um objetivo político associado à Guerra Fria e ao desenvolvimento após o fim deste período, nomeadamente o objetivo de extensão das fronteiras a todo o continente e mais além. Este processo dividiu a Europa em partes que já não são facilmente coordenáveis.

Economicamente, as grandes crises são ambas muito parecidas no que diz respeito às aquisições para a União Europeia desde os anos 1970, na Grécia, em Portugal e na Irlanda, por exemplo. Mesmo politicamente, as diferenças entre os antigos estados comunistas e os antigos estados não comunistas da Europa enfraqueceram a capacidade de a Europa continuar a desenvolver-se. Se a Europa continuará a conseguir manter-se como está, eu não o sei. Não creio, contudo, que a União Europeia deixe de existir e acho que continuaremos a viver numa Europa mais coordenada do que a que conhecemos, digamos, desde a II Guerra Mundial.

De qualquer modo, devo dizer que está fazendo-me perguntas enquanto historiador mas sobre o futuro. Infelizmente, os historiadores sabem tanto sobre o futuro quanto qualquer outra pessoa. Por isso, as minhas previsões não são fundadas em nenhuma especial vocação que eu tenha para prever o futuro.


Fonte: Carta Maior



Encontro reune lideranças rurais da Bahia em Feira de Santana

Nos dias 14 e 15 desse mês de junho, a Fetag-BA realizou na Pousada Central em Feira de Santana, o Encontro Estadual de Formação Social para Multiplicadores/as, para discutir a temática da sustentabilidade financeira do MSTTR na Bahia.
A atividade é resultado do trabalho da Contag e da Fetag-BA, com apoio do Senar. Estavam presentes ao evento, o tesoureiro da Federação, José Antônio, o Secretário de Formação e Organização Sindical, Jean Carlos Machado, bem como Renilda Santos e Rozete Evangelista, respectivamente coordenadora e assessora da Fetag-BA na região de Feira de Santana, Litoral Norte e Recôncavo.
O Evento foi coordenado por Mércia Porto, Leonardo França e Delçique Paraguassú, ambos assessores da entidade. Participaram do evento representantes de todas as regiões da Bahia.
Fonte: Portal CTB

Sinais contraditórios de Brasília sobre os direitos humanos

O governo federal emitiu sinais contraditórios, esta semana, a respeito da questão dos direitos humanos. De um lado, indicou a disposição de não fechar o acesso aos documentos “secretos” que se refiram às violações cometidas sob o manto do Estado brasileiro, sobretudo durante o período da ditadura militar de 1964. E também reafirmou a intensão de aprovar a Comissão da Verdade para investigar aquelas perseguições, prisões ilegais, torturas e assassinatos políticos.

Por outro lado, e na contramão destes acenos, a Advocacia Geral da União, em parecer ao Supremo Tribunal Federal, colocou uma pedra sobre o anseio democrático de revisão da Lei de Anistia de 1979, que foi feita sob medida durante o último governo militar, dirigido pelo general João Batista Figueiredo, para subtrair à justiça os torturadores e demais agentes da repressão envolvidos com as graves violações dos direitos humanos ocorridas naquele período.

A anistia, no Brasil, foi uma peça importante na transição negociada para o regime civil e para a democracia. O espírito daquela lei era justamente passar uma borracha não apenas nos crimes cometidos diretamente pelos agentes da repressão, mas poupar do necessário julgamento e condenação também os chefes militares e civis da ditadura, que foram os responsáveis, em última instância, por aqueles crimes. Sua elaboração foi guiada pelo temor, que permanece, de submeter autoridades da ditadura aos tribunais da democracia, a exemplo do que ocorre em países latino-americanos que julgaram e condenaram os torturadores e seus chefes, condenando inclusive altos oficiais das forças armadas e ex-presidentes da república.

Daí a comoção permanente que a luta para jogar luz sob os porões da ditadura provoca na direita e em muita gente que foi importante durante a ditadura e continua, quase três décadas depois de seu fim, manejando cordões do poder político, econômico e social.

A disputa em relação à investigação aparece sob a forma da argumentação jurídica, envolvendo o STF, a AGU, a Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA (que, no ano passado, condenou o Brasil por não punir os torturadores), a OAB, etc. Mas esta não é uma luta jurídica: ela é política. Investigar, julgar e condenar os torturadores significa também envolver na mesma querela aqueles que foram seus chefes.

Esta é uma questão política de caráter democrático – não pode haver democracia verdadeira, forte, consolidada, com torturadores andando por aí impunes. Sua mera presença entre os cidadãos, e mesmo ainda nos quadros do aparelho estatal, é um incentivo à impunidade à violência policial que se mantém como um câncer institucional.

O país precisa saber, pelo menos, quem foram os responsáveis pelas torturas, assassinatos e demais arbitrariedades cometidas nos anos da ditadura. Já se disse, e não é demais repetir, que os lutadores da resistência – que foram condenados judicialmente e cumpriram suas penas até o momento em que a anistia os liberou dos cárceres da ditadura – têm seus nomes e feitos proclamados país afora. Eles são festejados pelos brasileiros como heróis que ousaram enfrentar o arbítrio.

O que permanece é a necessidade de se revelar ao país o outro lado, aqueles que torturaram e assassinaram e que agora pretendem manter seus nomes sob o manto questionável da Lei da Anistia, com medo ou vergonha de uma revelação que, superado o período tenebroso da história durante o qual foram guardiões de um poder injusto, antidemocrático, antinacional e antipopular, seus nomes e seus “feitos” sejam conhecidos de todos. E que, longe da admiração votada aos que resistiram, mereçam o desprezo do povo que oprimiram.

Os crimes contra a humanidade não prescrevem. Não podem ser esquecidos. Carrascos nazistas, responsáveis por atrocidades cometidas há mais de meio século, ainda são procurados, julgados e condenados. Os brasileiros também não esquecerão – não podem esquecer – aqueles que cometeram crimes tão bárbaros.

Cumprir este desafio é tarefa para um governo democrático, avançado e fiel à luta e às tradições do povo. Os sinais contraditórios emitidos pelo governo federal indicam apenas o longo caminho que há a percorrer até que o anseio dos brasileiros por justiça seja cumprido. E este caminho precisa ser trilhado se se pretende consolidar a democracia no país. (EDITORIAL VERMELHO)

O silêncio nunca é respeitado pela história

A idéia de instituir uma lei de "silêncio eterno" para certos documentos oficiais foi lançada sem muito sucesso. As verdade são, ou se tornam caixas de pandora quando as tentamos reduzir ao silêncio eterno. Um dia elas se abrem e os monstros, como os demoninhos da lenda, vem nos puxar as pernas em nossas camas. Salve-se quem puder.

A idéia de instituir uma lei de "silêncio eterno" para certos documentos oficiais foi lançada sem muito sucesso: houve a natural grita de quase todos os setores intelectuais e é bem possível que tudo não passe de uma iniciativa abortada, antes sequer de tomar forma. Há uma incompatibilidade entre o mistério e a democracia. Não deve ser por outra razão que a Igreja Católica cultiva o autoritarismo: nada mais insondável do que a vida dos religiosos fora do confessionário. Para a literatura, no entanto, o mistério é mais que um gênero literário. É a própria razão de um livro. H. Bustos Domecq, pseudônimo do autor policial, criado por Jorge Luis Borges e Bioy Casares, parece ser uma espécie de exacerbação do que, por si, é literatura. Sabemos que no último momento Isidro Parodi - o detetive que desvenda os crimes de dentro da prisão - declinará o nome do assassino. Desfeito o silêncio.

Na paródia dos dois escritores argentinos, os próprios personagens periféricos, são nomes conhecidos da novelística universal de mistério, como o padre Brown, clássico do escritor inglês J.K. Chesterton. A questão do mistério, porém, ou do seu sucedâneo, o silêncio, parece ser que ele acaba, quase sempre, no que se convencionou chamar de segredo de Polichinelo. Numa certa medida o mistério parece, inclusive, ter prazo de validade. A história não tem como prêmio esconder fatos, sejam quais forem.

Em certas celebrações do Vaticano, século atrás, executava-se um "Miserere" (uma espécie de pedido de perdão a Deus) do compositor renascentista Gregorio Allegri (1582-1652) que, a parte ser muito belo , "um\ coro de anjos," dizia-se com certa razão - era uma espécie de monopólio da Igreja. Ninguém, por proibição expressa das autoridades religiosas, podia divulgar a partitura. Era escutá-la e só. Isso até o dia em que um menino de doze anos, no século XVIII, ao assistir o ofício religioso por apenas duas vezes, na Catedral de São Pedro, resolveu escrever, nota por nota, o contraponto intrincado da obra – tarefa de um gênio, mas que se explicava pela identidade do garoto. Tratava-se do Wolfgang Amadeus Mozart. Dali em diante estava quebrado o mistério da grande música da Igreja, o milagre do "canto dos anjos": a partitura, no tempo de divulgação possível para a época, seria, então, acessada pelo resto da Europa e, mais tarde, pelo mundo.

Para Mozart, música alguma constituía mistério. Era ouvi-la, e escrevê-la em seguida. No entanto, ele mesmo, ou melhor, sua biografia, seria assombrada, no futuro, por boatos que supõem mistérios e que acrescentam perguntas, aparentemente irrespondidas para a posteridade. Sua morte prematura prestou-se a muitas conjeturas que quase sempre avançaram para o fantástico. Seu passamento teria sido precedida por uma encomenda secreta de seu famoso réquiem. Durante anos propalou-se que o anúncio de sua própria morte, apareceu-lhe sob a forma de um espectro: ele lhe teria encomendado o réquiem (que Mozart, contudo, não concluiu), mas que deveria ser executado por ocasião da sua própria morte É uma bela página fantástica para as histórias detetivescas, mas se sabe hoje que quem a encomendou foi um nobre, que queria permanecer no anonimato, daí a sua aproximação velada do compositor E que no filme ¨Amadeus¨ aparece, claramente, como um fantasma. Uma inverdade "bene trovata", apenas isso.

Apesar de tudo, porém, persistiu o instigante da morte prematura do compositor. Como "não poderia ter morrido tão moço ", com apenas 35 anos, foi acrescentada uma outra história, ainda mais rocambolesca (palavra, aliás, que vem de Rocambole, um personagem de mistério de uma série saída em folhetim no século XIX, de autoria de Ponson du Terrail). Por ela, Mozart teria sido envenenado, e por ninguém menos que a Maçonaria. A organização secreta a que, de fato, Mozart pertenceu (escreveu várias obras para exaltá-la), teria se sentido devassada pelo compositor. Ao escrever a sua ópera "Flauta Mágica", Mozart teria revelado vários segredos do grupo esotérico. Sabe-se que isso, comprovadamente, não aconteceu, mas desde que se mantivesse silêncio a respeito, ficaria a dúvida.

Na verdade, nada desses acontecimentos tem a ver com qualquer coisa parecida com o "silêncio eterno" reivindicado por alguns políticos da base do governo. Essa é uma suposição que fica da Igreja, ou melhor, de todas as igrejas. E, mais que tudo, de todas as organizações, inclusive as empresariais. Quando não, por grupos clandestinos, que vão do IRA irlandês, a Al Qaeda islâmica. Mas disso se sabe tanto, que é até ocioso fazer qualquer menção.

Chesterton, inspirador de Borges e de Bioy Casares em muitos bons momentos de seus escritos, não apenas aos que pertencem ao gênero explicitamente ¨de mistério¨, aponta, não raras vezes, para o fantástico. Num de seus romances, em que a palavra "delicioso" talvez não seja um juízo exagerado, há que se aduzir o fantástico. Chama-se "O Homem que foi Quinta-Feira". Como o intrigante do título sugere, é um livro detetivesco , mas com um tom farsesco que se aproxima do incrível. De repente, lá pelo fim do livro, o grande vilão não é quem pensamos, se é que existe um vilão. E, nas últimas páginas, o que resta é o poético.

Talvez seja essa a questão do silêncio: ele valerá para o mistério na dimensão em que não se diz. Um dos maiores filmes de terror de todos os tempos traduzido como "Os Inocentes", do inglês Jack Klayton, assusta por nunca mostrar explicitamente as fantasmagorias. É como se os personagens fôssemos nós mesmos. A todo o momento ficamos na dúvida se estamos vendo o que parece nos observar do meio do lago. Os monstros não são explícitos e , no final, a questão persiste em aberto. Pois as dúvidas - os silêncios - são os que mais nos incomodam. E assustam.

Talvez fosse isso que o senador autor da proposta sobre a tal lei do silêncio eterno, na verdade, quisesse: que os brasileiros ficássemos na expectativa de que tenhamos medo da nossa história. Para exemplificar, o senador citou o Barão do Rio Branco. Como criador da Chancelaria, antes e depois da República, o Barão teria segredos a manter sobre o Brasil. Claramente, o tal senador, não se referiu à ditadura militar recente que a rigor, não tem como se manter silenciosa, já que os gritos dos torturados ainda ressoam entre nós, pois muitos estão vivos ainda. Mas ao se referir ao criador do Itamarati, ele talvez se referisse, entre outros, ao que quase todos sabemos; que a tomada do Acre pelos brasileiros, talvez não seja de molde mesmo a aquietar nossa consciência, já que o gaúcho Plácido de Castro, que chefiou os seringueiros contra o exército boliviano, era claramente um agente provocador a serviço do Brasil. E talvez tenha sido assassinado justamente como "Queima de Arquivo", uma história que, afinal, talvez a Globo nunca estivesse disposta a contar.

A questão, porém, continua: onde o segredo ou o silêncio, por mais "obsequioso" que seja?

No fundo, de novo, quem sabe, naquilo que a Igreja chama justamente de "Silêncio Obsequioso" que seria um calar boca que o candidato ao mutismo aceitaria de bom grado, como uma espécie de aceitação de sua confissão, de que errou em alguns pontos doutrinários. Mesmo isso, porém, sem qualquer intromissão via internet , tal qual o wikleaks , mostra-se, no mínimo, fragilíssimo. Acaba de sair nos Estados Unidos o livro de um jornalista norte-americano, "católico praticante" como ele se define, em que são reveladas com nomes e endereços, os casos de homossexualismo e de práticas heterossexuais de membros teoricamente celibatários, da Igreja. Em que até mesmo a prática do aborto - justamente para evitar escândalos, como sempre -seria explicitamente recomendado por bispos e outros membros da hierarquia da Igreja. Não se trata evidentemente de um assunto para ser discutido em colunas sociais. Ou em páginas em que se fale da arte e da cultura. Mas são casos claros em que o que sobra, afinal, é o sempiterno segredo de Polichinelo. Todo o mundo sabe,

Paganini gostava de fazer segredo quanto a sua técnica prodigiosa ao violino. Muitos juravam que ele tinha feito pacto com o demônio. Era uma história que o violinista sempre fez questão de não desmentir. O silêncio sobre sua técnica, porém, nunca foi além do que ele escrevia. E na medida em que outros instrumentistas se jogavam no violino, estudando-o e praticando-o, mais e mais foi se impondo a crença, não de que Paganini tivesse feito qualquer acerto com satanás, mas de que tudo estava nos dedos para quem quer que tivesse talento e vontade para chegar ao seu virtuosismo. Hoje sabemos que um músico extraordinário pode se alçar ao domínio que Paganini tinha de seu instrumento. Nunca houve segredo algum. Seria, aliás, uma bobagem para a sua memória. que somente ele, apenas ele, tocasse as músicas que compôs.

Digamos que seja esse o limite do segredo - que é de não ser senão o começo da verdade. Pois daí, quem sabe, advenha todo o mistério, o mistério de Paganini. Mas também da história. Não será por a termos engavetada em arquivos indevassáveis, que ela deixará de bramir. As verdade são, ou se tornam caixas de pandora quando as tentamos reduzir ao silêncio eterno. Um dia elas se abrem e os monstros , como os demoninhos da lenda, vem nos puxar as pernas em nossas camas. Salve-se quem puder. (Enio Squeff - CM)

RUAS DA ESPANHA: 200 MIL CONTRA O ARROCHO

A indignação das ruas ainda não tem programa, diz Slavoj Zizek. No seu entender, significa que não saberia o que fazer no fatídico 'dia seguinte ' de uma eventual chegada ao poder. Mas a julgar pelo que ocorreu na Espanha neste final de semana, quando 200 mil pessoas tomaram as ruas de Madrid, Barcelona, Valencia , Sevilha etc a indignação já tem um alvo claro a mirar: o Pacto do Euro. "  No, no nos representan!", protestavam os manifestantes espanhóis neste domingo, quando compactos cordões humanos se acercavam dos parlamentos, deixando clara a rejeição ao acordo dos 17 países europeus firmado em março último. Acordo entre aspas. Talvez fosse melhor dizer pacto entre a corda e o pescoço para denominar o que vem sendo tentando desde o início da crise na zona do euro, quando Alemanha e França buscam fixar as condicionalidades para ministrar soro financeiro adicional às economias combalidas (Grécia, Espanha, Portugal, Irlanda etc). Entre as 'reciprocidades' agora escorraçadas pelas ruas estão cortes e regras restritivas para aposentadorias, cortes de serviços sociais, reajustes salariais vinculados exclusivamente à produtividade, cortes drásticos nos déficits públicos (os mesmos que cresceram porque o setor público, em muitos casos, socorreu a banca privada pega no contrapé da bolha de crédito e especulação). O 'pacto do Euro'  de março já é uma adaptação 'suavizada' da austeridade prussiana requerida no início da crise por Angela Merkel como condição para colocar dinheiro alemão extra no caixa dos governos em dificuldades. O que ninguém previa nos idos de março é que multidões  de pescoços sairiam às ruas para rechaçar as ‘ofertas' da corda, como tem ocorrido com freqüência e intensidade crescentes.Zizek tem razão: não há um programa para ' o dia seguinte', o que representa um flanco histórico perigosíssmo (não por acaso a direita radical venceu as eleições regionais espanholas recentemente e ganhou o governo em Portugal). Ao mesmo tempo, quando o rechaço à espoliação financeira toma as  proporções e a contundência registradas na Espanha e na Grécia a questão é saber se o outro lado tem  legitimidade para esmagar um imaginário social que lhe é francamente hostil. No caso das privatizações impostas  à Grécia, por exemplo, que partido assumirá o ônus de nomear um síndico de massa falida, sabendo de antemão que o sacrifício é, ao mesmo tempo, leonino e  insuficiente, sangrento e inútil? Isso nos próprios termos da lógica insaciável que pretende cortar o déficit público de 12,7% para 3%, a toque de caixa. A semana promete.
(Carta Maior; 2º feira,20/06/ 2011)