segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Daniel Almeida é reeleito presidente do PCdoB na Bahia

Em Conferência finalizada na tarde deste domingo (6), em Salvador, o PCdoB na Bahia reelegeu o deputado federal Daniel Almeida como seu presidente estadual. A eleição para a direção do Comitê Estadual, composta de 63 integrantes, aconteceu de forma eletrônica com a participação dos delegados eleitos nas conferências municipais, que mobilizaram mais de 17 mil pessoas em todo o estado.


Imagens da Coferência Estadual do PCdoB/BA
A escolha dos novos dirigentes finalizou uma Conferência extremamente exitosa e representativa, que já no ato de abertura reuniu lideranças políticas de diversos partidos, como o governador Jaques Wagner, os senadores Lídice da Mata (PSB) e Walter Pinheiro (PT), o presidente estadual do PMDB, Lúcio Viera Lima, dentre outras lideranças. O evento contou ainda com a presença do ex-ministro do Esporte, Orlando Silva.
 
A consulta e a votação através de urnas eletrônicas dinamizaram o processo e simplificaram a escolha dos 63 integrantes do Comitê. Ao final do processo, a chapa proposta pelo Comitê Cessante foi eleita com ampla maioria, mostrando que foi acertada a sua composição com nomes de diversas regiões do estado e segmentos de atuação do partido. Em reunião logo em seguida, o Comitê reelegeu o deputado Daniel Almeida para a presidência do partido e marcou a primeira reunião ordinária para os dias 3 e 4 de dezembro, quando serão eleitos a nova Comissão Política e o novo Secretariado Estadual. Até lá, os antigos dirigentes tocam os trabalhos de suas pastas.

“Agradeço a todos que fizeram desta a maior conferência estadual do PCdoB do país. Agradeço também pela confiança depositada em mim para conduzir o projeto de levar o partido a todo o estado e de buscar maior protagonismo nas eleições do ano que vem, com a apresentação de candidaturas em muitas cidades do estado. O trabalho até aqui não foi fácil, mas contamos sempre com uma direção que trabalha unida e facilita as coisas. A tarefa não vai ser fácil, mas assumo este novo período à frente do partido com muito ânimo e a disposição de fazer todo o possível para fazer o PCdoB continuar crescendo cada vez mais”, destacou o presidente reeleito do PCdoB na Bahia, Daniel Almeida.
Confira a lista de nomes do novo Comitê Estadual
Adilson Gonçalves de Araújo
Aislan Reis Rocha
Alfredo Boa Sorte Júnior
Alice Mazzuco Portugal
Ana Carolina de Castro Dourado Vasconcelos
Ana Maria Guedes
Antonio Barreto de Souza
Antonio Fernando Amorim Dantas
Antonio Renildo Santana Souza
Aurino Pedreira do Nascimento Filho
Carlos Antonio Melgaço Valadares
Claudinei Xavier Novato
Cláudio Silva Bastos
Daniel Gomes de Almeida
Daniele Costa Silva
Davidson de Magalhães Santos
Denise Ribeiro Santos
Elias Nunes Dourado
Everaldo Augusto da Silva
Francisco Javier Ulpiano Alfaya Rodriguez
Francisco Nelson Castro Neves
Geraldo Eugênio Alves Galindo
Gilberto Souza Santos
Gilmar Bomfim Santos
Gisélia Santana Souza
Gustavo Augusto Barros Miranda
Haroldo Borges Rodrigues Lima
Ilka Dias Bichara
Ilza Francisca da Cruz
Irismá Santos da Silva Sousa
Isaac Cavalcante de Carvalho
Jean Fabrício Falcão
Jorge Wilton Pereira de Jesus
Jose Álvaro Fonseca Gomes
José Antonio da Silva
José Nivalto Sousa Lima
Josenaldo Carlos de Cerqueira
Julieta Maria Cardoso Palmeira
Jurandir Silva Santana Júnior
Juremar de Oliveira
Kelly Adriana Magalhães
Luiz Raimundo Barreiros Gavazza
Manuela Simões de Souza
Marcelo Brito Gavião
Maria Aladilce de Souza
Maria de Fátima Silveira de Oliveira
Maria Olívia Santana
Marilene dos Santos Betros
Milton Barbosa de Almeida Filho
Naura Caldas Coelho Matos
Ney Jorge Campello
Nilton Vasconcelos Júnior
Patrícia Alves Vieira
Paulo Sérgio Pereira Costa
Pedro Marcelino Pinto Neto
Péricles Santos de Souza
Ramon Cardoso dos Santos
Rui Oliveira
Tânia Maria Portugal da Silva
Vandilson Pereira Costa
Vicente José de Lima Neto
Vladimir Meira Nunes
Wenceslau Augusto dos Santos Júnior

De Salvador,
Eliane Costa

A atualidade de Fausto

Vender a alma ao diabo é um tema recorrente e atual, e quase não mencionamos a figura de Fausto. Quem sabe, por medo de tê-lo à frente ou dentro de nós. O personagem de Fausto é um dos mais excelsos e perfeitos para a compreensão dos homens. Principalmente dos homens iludidos com o próprio saber. E o poder.

Enio Squeff - Carta Maior

Quase todos conhecem a história do "Fausto", de Goethe (1749-1832) ou, quem sabe, de Marlowe (1564-1593). Com as devidas variações, o enredo é o mesmo e se passa em torno de um homem sábio, que ao chegar à velhice, tenta compensar de alguma forma o tempo despendido nos livros e em pesquisas, fazendo, então, um pacto com o Demônio. Em troca da mocidade perdida, ele promete a sua colaboração com as forças do mal.

É uma espécie de fábula, com origens na Idade Média européia, mas que acentua um aspecto: Fausto não é um qualquer. Seu saber, seus títulos - tudo o leva a crer que se julga um "primus inter pares". É um homem diferenciado, digamos. Goethe, em pessoa, era esse diferenciado: nele coabitavam o naturalista - nome genérico de um cientista voltado à botânica, à mineralogia etc. - com o poeta, o artista plástico, o teórico das cores e tudo mais que se possa imaginar em relação à arte. Não parece importar, enfim, essa relação: milhares de teóricos e estudiosos altamente capacitados dedicaram-se e vão se esfalfar sobre o drama do poeta alemão - principalmente. Nada a acrescentar, portanto.

Mas Ítalo Calvino explicava a sua preferência pelos clássicos, a partir da eternidade deles. Não parece haver, de fato, como fugir da persistência do Dom Quixote em cada um do nós, por exemplo; e o personagem Fausto parece existir tanto no homem que vende a consciência - o jornalista antes de esquerda, hoje de direita (o vice-versa acontece, mas é bem mais raro; e por razões óbvias), quanto no colega que ontem se solidarizava com a categoria - mas que hoje, guindado à condição de chefia, a todo o momento confirma o adagio português: "Para conheceres o vilão, dê-lhe o bordão" . É uma história pra lá de conhecida que, no entanto, se reproduz a com a mesma insistência com que, mesmo os incréus - obrigam-se a considerar "a eternidade do demônio".

Não parece uma situação irrelevante, essa a da existência de um mal a nos acicatar. Karl Marx e Sigmund Freud são, sem duvidam, ponderáveis em suas teorias: o "inferno dos outros" se faria a partir do sistema (Marx), ou do instintos (Freud). Dizer que o diabo laicizou-se naturalmente, é uma questão dos tempos e dos costumes. Não vivemos na Idade Média. O demo não seria aquele ser encruado, com um rabo em forma de flecha na ponta, os pés de cabra e a cabeça, devidamente ornada com pelo menos dois cornos. Já, agora, diabo, sem dúvida, veste Praga; ou a culpa era de seus pais que o maltratavam?

As próprias variações em torno dos temas marxistas ou freudianos - e há uma infinidade delas, devidamente enfeixadas em livros que, se não confirmam a existência do "Coisa Ruim", reafirmam a pergunta: como explicar o cronista que sabe estar mentindo, mas que mesmo assim se assume para além do bem e do mal - tudo em troca da ilusão do dinheiro e da fama como forma de alcançar a juventude eterna, a ilusão de que, fora da notabilidade, da notoriedade - nada vale nada; ou antes, vale tudo? Vender a alma ao diabo, em suma, é um tema recorrente; e quase não mencionamos Fausto. Quem sabe, por medo de tê-lo à frente ou dentro de nós.

Talvez seja essa a questão mais pertinente. Na verdade, talvez seja a única questão: de todos os sete pecados capitais, não há um só que não convirja para a figura de Fausto. Mas o personagem tem uma característica inescapável, que é o seu saber. A grande contradição reside aí. Platão pregava a sabedoria como resposta às questões políticas. Desde que o governo fosse de sábios - e não há ninguém que reivindique a sabedoria suprema, fora da filosofia - a administração da coisa público pelos filósofos seria sempre a resposta adequada da sociedade. De fato, parece ser assim. Mas Fausto, homem sábio, não hesitou em fazer o acordo com o demônio. Seria demais concluir que o homem culto não é necessariamente o mais indicado para gerir a coisa pública?

Há dúvidas, porque se a alternativa a Fausto, é o boçal, o homem que despreza o saber, a coisa pode descambar também: Hitler tinha a certeza de que dominava tudo e se for levado em conta seu êxito inicial, até se explica a ilusão de muitos. O homem que melhor encarnou o espírito da Revolução Francesa foi Robespierre. Era culto; para alguns, de um brilhantismo invulgar. Foi durante sua governança que se instaurou o período chamado "do Terror", em que mais de trinta mil pessoas foram guilhotinadas. Augusto Pinochet foi quase inigualável em sua sanha assassina: matou - e comprovadamente - roubou o quanto pode. Era um homem que se deliciava com a ópera, a grande ópera. Devia se comover às lágrimas na cena da "Tosca", de Puccini, quando o personagem título verifica que o revolucionário a quem ela ama, foi fuzilado por suas idéias.

Stalin não lhe ficou atrás - mas havia quem dissesse que a sua estirpe era de outra linha - um grosseirão. Não é um exemplo de todo convincente; interessava-se pela arte e mandou matar muita gente por não concordar com as músicas, as poesias e os quadros que eles compunham. Já Stroessner - o ditador sanguinário do Paraguai que morreu no Brasil, muito bem obrigado, teria sido um perfeito casca-grossa - tanto, quem sabe, quanto Pol Pot, do Camboja- que não podia ouvir falar em cultura sem sacar o seu revólver.

Goethe acertou em tudo ao fazer de Fausto um homem culto, refinado de um saber superior. Ve-mo-lo a cada instante encarnado, tanto no professor que não dá notas a seu aluno por este não lhe prestar as loas que ele lhes acha devidas, quanto no executivo rico que se sente no direito de xingar ou de despedir uma pobre faxineira por ter desconfiado de que ela não lhe foi suficientemente submissa. Talvez a palavra "fáustica" não se preste à senhora rica que maltrata a empregada negra e pobre: fausto tem a ver com a ilusão do próprio, quando compactuou com o diabo. A coisa toda, em suma, teria que contar com a ilusão do poder e da riqueza. O jornalista venal, o policial corrupto, o empresário entorpecido pela riqueza, seriam todos fáusticos em suas comemorações. Balzac descreve bem uns e outros; eles se deliciam com o sucesso. Os acólitos não deixam de saudá-los na fila infinda do beija-mão.

A ironia é que Goethe em pessoa foi um gênio incensado. Era um gênio até onde a palavra alcança descrever um homem sábio, detentor de inúmeros talentos, mas, sobretudo, o literário. Como Cervantes, ele imortalizou um personagem símbolo - somos todos ainda que não publicamente, ora Fausto ora Dom Quixote. Goethe percebeu com a sua quase onisciência a importância do livro de Cervantes. Dizem que aprendeu o espanhol só para usufruí-lo em sua grandiosidade. Mas nunca desceu ao quixotismo - pelo menos não de modo a ser saudado por isso. Pelo contrário, enquanto pode, manteve a sua posição na Corte; e foi bom que o Duque de Weimar o cobrisse de honrarias e de privilégios. Goethe recompensou-o à altura.

Quando as autoridades máximas de Weimar lhe possibilitaram fazer um jardim - Goethe esmerou-se em construir uma obra-prima. Só não agradou Beethoven que foi seu contemporâneo e que, quase quixotescamente, não se deixava levar muito pela vaidade, como acontecia com Goethe. Quando pode, apontou em Goethe aquela parte de Fausto que persistia em sua personalidade: o gosto pelas "lantejoulas da corte" como disse o músico, textualmente, a respeito de seu colega poeta. Enfim, não há notícia de que o músico tivesse em alta conta o Dom Quixote - mas enquanto pode julgar -e todos podemos julgar - não deixou de imitar no quixotismo de sua surdez - o pior imaginável para um músico - a vaidade do outro. Que foi um gênio, mas que não superou a vanitas vanitatis - a vaidade das vaidades de seu personagem - um dos mais excelsos e perfeitos para a compreensão dos homens. Principalmente dos homens iludidos com o próprio saber. E o poder.

Diário de Shangai (3): A cultura vai ser promovida

Hua Jian
(Diretor do Centro de Pesquisa sobre Indústria Cultural da Academia de Ciências Sociais de Shanghai)

Para construir um poder cultural, a China encara uma tarefa urgente de salvaguardar sua ”segurança cultural”, fortalecendo seu poder soft e expandindo a influência internacional de sua cultura.

Uma força nacional extensa depende tanto do seu poder hard quanto do seu poder soft. O poder cultural, uma parte importante de poder cultural soft, inclui sua habilidade para explorar seus recursos culturais internamente e disseminar seus valores através de produtos e serviços culturais. Também inclui a habilidade para implementar os vínculos culturais com outros países. O aumento desse poder cultural implica na participação da competição e da cooperação cultural internacional.

Apesar de ser a segunda economia no mundo, a China fracassou em desenvolver seu poder soft de forma proporcional a seu peso econômico. Desde 2000 as rendas culturais do país começaram a subir claramente, com um crescimento de mais de 20% ao ano, o que é muito mais alto do que o crescimento da taxa de expansão do produto interno bruto. Em 2010, o aumento do valor produzido chegou a mais de 174 bilhões de dólares ou 2,75% do PIB. No entanto essa proporção está ainda muito atrás dos EUA e de outros países desenvolvidos. Por exemplo, a escala da indústria cultural chinesa é apenas um terço da dos EUA. A enorme distância mostra a urgência da China promover o desenvolvimento de seu setor cultural para apoiar seu poder soft.

Países com a capacidade de inovação cultural e tecnológica tem uma vantagem na dura competição cultural global. Conforme um relatório co-publicado pela Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento e o Programa de Desenvolvimento da ONU, os produtos culturais e criativos exportados pelos países desenvolvidos em 2010 eram principalmente aqueles com um alto conteúdo tecnológico e alto valor agregado. Em contraste, os produtos culturais exportados pelos países em desenvolvimento eram principalmente de baixo conteúdo tecnológico e cientifico, como performances artísticas ou objetos de joalheria.

Nos últimos anos, os produtos culturais chineses, especialmente aqueles com conteúdo tecnológico e cientifico, como jogos de computador e novos serviços de mídia, ganharam uma nova importância no mercado cultural global, e desempenharam um papel cada vez maior na participação da competição cultural.

Na recém terminada sexta Conferência do 17° Comitê Central do Partido Comunista da China, o Partido sublinhou que a nação deveria incentivar o processo de auto-inovação e implementar seus níveis tecnológicos no campo cultural, incluindo filmes, novelas para a TV, desenhos e internet, para implementar a competitividade de sua indústria cultural.

Nessa visão, a China deveriam desenvolver sua manufatura e prover produtos e serviços culturais com grande conteúdo tecnológico e cientifico, fortalecer os serviços de inovação tecnológica e desenvolver distintos itens com vantagens tecnológicas para desembocar em um poder cultural.

Para ter um poder desse tipo, a China precisa promover sua cultura em escala mundial, levar adiante intercâmbios culturais com outros países e intensificar suas características e influências culturais. Os fatos provam que uma identidade cultural nacional deve se realizar através do intercambio cultural e que o poder cultural domina o peso dos produtos culturais globais e sua disseminação.

O volume do comércio cultural da China tem crescido nos últimos anos, mas alguns elementos dos produtos culturais fracassaram em conseguir um robusto crescimento. As estatísticas fornecidas pelo Conselho da China para a Promoção do Comércio Internacional mostram que o volume de livros, jornais e revistas, vídeos e artes eletrônicas, que constituem uma parte fundamental da exportação dos produtos culturais, declinou de 19% em 2008 para 12% em 2009. Um outro exemplo, a TV de animação, cuja exportação cresceu para 220.000 minutos em 2010 de menos de 10.000 minutos em 2000. No entanto, o volume de exportações da animação produzida na China era de apenas 30 milhões de dólares em 2009, em claro contraste com apenas um filme norteamericano de Pixar, Toy Store 3, que arrecadou mais do que 1 bilhão no mundo todo.

A baixa exportação de volumes de produtos chineses ilumina a urgência para o país de desenvolver reformas sistemáticas da cultura e inovações e das inovações institucionais para incrementar a competitividade cultural. Para facilitar esse processo, os governos locais deveriam tratar de desenvolver produtos culturais com sua própria propriedade cultural e estabelecer suas vantagens nos produtos culturais convergentes com a estratégia de ïr para fora do nosso país.
Fonte: Blog do Emir sader

Ramonet e a crise do jornalismo

Por Luciane Agnez, no
Observatório do Direito à Comunicação:

A Embaixada da República Bolivariana da Venezuela realizou na terça-feira (1), a conferência "O papel dos meios de comunicação no contexto da crise mundial", com a presença do jornalista Ignacio Ramonet, pesquisador e ex-diretor do jornal Le Monde Diplomatique, e do ex-ministro das comunicações da Venezuela, Jesse Chacón. O evento, que aconteceu no Memorial Darcy Ribeiro, na Universidade de Brasília, fez parte das iniciativas para integração das nações que compõem a Alianza Bolivariana para los Pueblos de Nuestra América (ALBA). A mesa foi presidida pelo Embaixador da Venezuela no Brasil, Maximilien Sánchez Arveláiz.

Ignacio Ramonet levantou reflexões sobre a revolução promovida pelas novas tecnologias, que estão mudando o panorama das comunicações em todo o mundo. Nesse contexto, a imprensa vivencia a maior crise desde o surgimento do chamado jornalismo de massa, há apenas 150 anos. A atmosfera midiática é diferente de 20 anos atrás.

O jornalista explica isso por uma metáfora: há milhões de anos, no fim da Era Jurássica, uma chuva de meteoros que atingiu a Terra, extinguindo os dinossauros e mudando o ecossistema do planeta. "A internet é o novo meteoro que vem alterar o ecossistema midiático", afirmou. A consequência inevitável é a extinção de alguns tipos de mídia, principalmente no meio impresso, como já vem ocorrendo – muitos jornais desaparecerão. A crise já se mostra mais intensa nos Estados Unidos, onde, na última década, mais de 150 jornais fecharam e houve a redução de cerca de 20 mil empregos.

Ramonet alerta que o impacto da internet não ocorre apenas no meio impresso. Os canais de TV com notícias 24 horas, como a CNN, também enfrentam uma greve crise econômica, muito diferente do sistema de televisão que vivia seu auge no final da década de 1990. "Os canais de informação contínua estão com dificuldades de concorrer com a internet. O principal canal da Espanha fechou, por exemplo", contou o jornalista.

Por outro lado, o desenvolvimento das redes sociais e dos blogs representa um avanço impossível de ser freado: há novos atores no processo de comunicação que não podem ser ignorados. "Também não quer dizer que esse cenário irá se estabilizar. Há 20 anos, o fenômeno era a CNN. Se esse nosso encontro fosse há três anos, possivelmente não falaríamos de Twitter ou de Facebook. A principal característica da realidade contemporânea é o movimento constante", explicou Ramonet.

Ramonet também comentou sobre o tema de um de seus livros publicados: "Vivemos num estado de insegurança da informação, não podemos confiar nem no que é publicado na primeira página de um jornal". Mas ele fez um alerta: "nunca foi feito esse tal ‘bom jornalismo’, nunca houve essa ‘era de ouro’, sempre foi difícil realizar esse jornalismo de qualidade". Os desafios de antes – e de agora – é a permanente negociação entre a imprensa e os poderes político e econômico estabelecidos.

Um fato é incontestável: o jornalismo perdeu o monopólio da informação. Todos podem, hoje, consultar, acessar e produzir informações. Para Ramonet, "todos podemos ser jornalistas. Talvez não ‘bons’ jornalistas, mas com certeza não existe mais os receptores passivos. Informar-se é um processo ativo".

Crise de identidade

Uma das principais consequências desse cenário é a crise de identidade vivida pelos jornalistas, pois não se sabe mais qual é a sua especificidade. "Qual a função do jornalismo na sociedade contemporânea? Qual a diferença entre um jornalista de O Estado de S. Paulo e um blogueiro que pode me dar uma informação mais trabalhada?", provocou Ramonet.

Com os blogs, segundo ele, ganhamos em liberdade, mas é importante observar que nem todos os blogueiros são revolucionários, ao contrário, muitos são reacionários, conservadores. Mas o fato é que o grande volume de informações que a blogosfera produz pode sim derrubar os profissionais de comunicação. "A produção de informação é um trabalho proletariado, mas, ao mesmo tempo, nunca se produziu tanta informação e tão facilmente", disse. Entre os fatores negativos, o jornalista destaca que, com a multiplicação das fontes, recebemos cada vez mais informações fragmentadas e não somos capazes de reconstituí-las em um contexto, compreendendo a dimensão política, social ou cultural dessa sociedade cada vez mais complexa. "Sentimos uma certa saudade de uma informação mais aprofundada, analítica", lamentou.

Estados autoritários

Os estados autoritários não controlam mais a circulação da informação e as recentes revoluções no mundo árabe ilustram bem esse momento. "Cortar a internet significa parar os bancos, os ministérios, os serviços básicos do país. E ainda assim não impede que outros meios funcionem, como a telefonia e a televisão", explicou Ramonet. Para ele, hoje, a circulação da informação funciona como um enxame, vem de todos os lados. "Não foi o Twitter ou qualquer outra rede social que derrubaram os governos na Tunísia ou no Egito, foi o movimento social, mas o ponto de partida foi, sem dúvida, a estratégia de enxame".

Utilizando um conceito do filósofo francês Pierre Levy, Ramonet destacou que o potencial da inteligência coletiva é maior que a individual, como se caracteriza pelos modelos chamados wiki, mas ainda é um ideal. Segundo o jornalista, o desenvolvimento das tecnologias da informação e da comunicação traz uma ilusão de avanço em relação à democratização da comunicação. "Manter-se informado é muito mais difícil do que usar o Twitter ou o Facebook", alerta.

Esse é um fenômeno que está apenas no início, não sabemos o que haverá daqui a cinco anos. Somos testemunhas de que novas tecnologias e novas funções surgem em pouco tempo. Para Ramonet, o que sabemos, com certeza, é que os cidadãos terão um papel muito importante para a informação e para debater a comunicação.

O acesso às tecnologias da comunicação é entendido como um direito, uma garantia de bem estar, assim como foi a energia elétrica no final do século XIX. Ter acesso está cada vez mais relacionado a um grau superior de cidadania. Independente das tecnologias, esse será o aspecto mais importante.

"Só não podemos acreditar que acessando as redes sociais estamos fugindo do controle dos grandes conglomerados de mídia. Essas são formas de comunicação do velho sistema de comunicação, que estão em crise, mas que não irão desaparecer como que por milagre. Quando fazemos uma ligação, enviamos uma mensagem de texto, usamos o Twitter, o Facebook ou o Google, estamos contribuindo para o enriquecimento dessas companhias", ressaltou Ramonet. A comunicação se torna uma matéria-prima estratégia e o importante não é mais o conteúdo, mas a circulação de mensagens – é isso que gera receitas.

Por fim, Ramonet conclui: "A democracia da comunicação ainda é uma ilusão. As novas tecnologias, que proporcionam a multiplicação de fontes e a facilidade da circulação de informação, nos tornam também mais preguiçosos. Informar-se não é mais um ato passivo e não podemos nos contentar com a questão do acesso. Se não fizermos o esforço de procurar e reunir as informações de qualidade, elas não virão ao nosso encontro".

A idade do ódio, aqui e no mundo

Duas situações – uma, internacional, outra, em nosso país – trazem-nos a sensação angustiosa de que os homens perderam a sua essência moral e retornam velozmente à idade do instinto dos répteis; enfim, desumanizam-se. Prepara-se, sem quaisquer disfarces, a guerra contra o Irã. Não basta o que se faz no Afeganistão, no Iraque, na Líbia e na Palestina. Os belicosos de Israel, com o apoio do Reino Unido e da França, e o estímulo dissimulado de Washington, acreditam que lhes será possível atacar impunemente as supostas instalações nucleares da velha Pérsia. Em lugar da retirada – inglória – do Iraque e do Afeganistão, já anunciada, o que se vislumbra é a ampliação do conflito.

Como em todas as aventuras militares, sabe-se como esta se iniciará, com o bombardeio de alvos no Irã – mas não se sabe como acabará. Se não prevalecer o bom-senso em Tel-Aviv, podemos aguardar nova tragédia, se não formos arrastados a uma Grande Guerra Euroasiática, da qual poderemos escapar na América Latina, se a estupidez não nos contaminar.

Há dias houve sinais de esperança com a troca de prisioneiros entre Israel e o Hamas. Essa esperança durou menos do que algumas horas, com a decisão de Netanyahu de construir nova colônia em território alheio, como represália à decisão da Unesco – pela maioria esmagadora de votos – de reconhecer o Estado da Palestina. Como se isso não bastasse, trata agora o governo extremista de Israel de preparar o bombardeio contra o Irã, com a presunção de que continuará impune, como tem ocorrido ao longo desses 63 anos de existência do estado judaico.

É uma pena que os governantes de Israel dessirvam a memória de um povo que se destacou na crônica de nossa civilização com as manifestações da inteligência, das artes e do humanismo. É uma lástima que os judeus sensatos, de Israel e do mundo inteiro, não consigam que seu governo aceite o convívio com o vizinho. Todas as explicações de Israel não desmentem a realidade de que os palestinos têm sido submetidos, nestas décadas, à humilhação e à opressão. Expulsos de suas terras familiares, confinados em espaços cada vez menores, submetidos ao racionamento de água e ao bloqueio comercial, os palestinos se tornaram os párias de nosso tempo.

A insensatez chega agora a nova aventura bélica, contra um povo muito mais numeroso, com forças militares preparadas, e que, em uma escalada bélica, poderá construir aliança com potências de primeira grandeza – ainda que não tenham bombas atômicas como os agressores. Será um conflito do qual dificilmente Israel sairá sem perdas políticas e humanas consideráveis. Isso, na melhor hipótese.

A outra manifestação de ódio é a que se registra, aqui no Brasil, contra Lula, no momento em que o ex-presidente passa pela hora mais difícil de sua vida, ao enfrentar a doença que já atingiu dramaticamente a própria família. É doloroso que, entre os que se excitam com seu sofrimento se encontrem pessoas das quais se poderia esperar o mínimo de entendimento do mundo. A internet se tornou, nesses dias, o repositório das frases mais repulsivas. Felizmente essa fúria dos covardes tem encontrado a repulsa de todo o povo brasileiro – já que eles, pelo seu comportamento, se excluem da comunidade nacional.

É possível divergir de Lula, de seu governo, de seu partido, de suas idéias. Mas não se trata de Lula, o político, o alvo dessas manifestações de ódio. Não se odeia o ex-presidente da República. Odeia-se o menino de Pernambuco que arrombou as portas da História e, em nome do povo mais humilhado e vilipendiado do país, assumiu o governo e colocou o país entre as nações mais respeitadas de nosso tempo.

Enfim, e para não perder a razão das coisas, é uma questão de classe. Só isso.

Mauro Santayana é colunista político do Jornal do Brasil, diário de que foi correspondente na Europa (1968 a 1973). Foi redator-secretário da Ultima Hora (1959), e trabalhou nos principais jornais brasileiros, entre eles, a Folha de S. Paulo (1976-82), de que foi colunista político e correspondente na Península Ibérica e na África do Norte. Artigo publicado originalmente na Carta Maior.

Manuel E. Yepe: Semeando tempestades

Para nada contribuíram com o propósito de evitar o flagelo terrorista em nível global ações dos Estados Unidos supostamente voltadas para este fim em consequência dos atos criminosos de 11 de setembro de 2001.

Por Manuel Yepe, em Cubadebate


Nem a promulgação das chamadas leis patrióticas que autorizavam execuções extrajudiciais ou detenções arbitrárias de cidadãos nacionais ou estrangeiros, nem as ações encobertas violadoras de leis e fronteiras, nem a discriminação e perseguição de imigrantes, nem o abandono do Direito Internacional Humanitário, nem as sanções unilaterais, nem as “listas” ou certificações de países com turvos fins políticos, serviram absolutamente para evitar o terrorismo.

Ao invés disso, ganha força atualmente nos Estados Unidos uma forma nova de promover o terrorismo. Depois que a oligarquia estadunidense, embriagada de poder, inaugurou a promoção dos sequestros de aviões como arma de sua guerra mediática contra Cuba, não passou muito tempo para que esse delito terrorista repercutisse contra a superpotência. Somente com a colaboração oficial e sincera de Cuba pôde-se dar fim a esa perigosa moda.

Recentemente, com similar embriaguez, especialistas militares e de inteligência estadunidenses sugeriram durante uma audiência convocada por vários legisladores do partido republicano na Câmara de Representantes do Congresso dos Estados Unidos a conveniência de levar a cabo assassinatos seletivos de altas patentes dos Guardiães da Revolução iranianos e ciberataques contra esse país.

“O Irã tem demonstrado com o presumido complô para tentar matar o embaixador saudita em Washington que representa uma ameaça inclusive dentro dos Estados Unidos, e não se deve descartar qualquer tipo de medida contra esse país”, afirmaram por sua parte os republicanos sem fazer notar que Teerã tinha desmentido com prontidão a acusação qualificando-a de manobra absurda.

“Por que não matá-los? Esta gente matou cerca de um milhar dos nossos, por que não os assassinamos mediante operações secretas?”, declarou o general da reserva Jack Keane, ex-chefe do Estado Maior do Exército diante do subcomitê de Contraterrorismo e Inteligência da Câmara. “Temos que agarrá-los pelo pescoçol. Eles têm que sentir esse tipo de pressão”.

“Já basta. Está claro que essas sanções não são suficientes”, disse o chefe do subcomitê de Contraterrorismo e Inteligencia, o deputado republicano pelo Texas, Michael McCaul referindo-se às penalidades que os Estados Unidos impõem ao Irã desde há três décadas.

“Este foi um complô real. Para mim isto muda as regras do jogo. Nenhuma opção deve ficar fora da mesa”, acrescentou o deputado republicano por Nova York Peter King. ”Não creio que vamos intimidar essa gente a menos que matemos alguém”, disse por sua parte Reuel Marc Gerecht, especialista da Fundação para a Defesa das Democracias.

Correntemente, se emprega o termo “terrorismo” em casos de ações levadas a cabo por unidades secretas ou irregulares que, dada sua inferioridade militar para enfrentar as instituições armadas governamentais, operam fora dos parâmetros das guerras.

Mas é óbvio que é uma linguagem terrorista a que os Estados Unidos estão empregando, não só contra o Irã, mas em escala mundial, seguramente estimulados pelos “exitosos” recentes assassinatos em abundância do líder da organização terrorista Al Qaeda, Osama Bin Laden, e do chefe de Estado da República de Massas (Jamahiriya) da Líbia, coronel Muamar Kadafi, duas das figuras mais intensamente demonizadas pelos meios de comunicação estadunidenses nos últimos anos.

O povo estadunidense, que também sofreu os horrores do terrorismo e não é responsável pelas atrocidades de seu governo, pode sair também perdedor nesta legitimação das execuções extrajudiciais que a superpotência promove ao mais alto e em todos os níveis dos governos sem respeito pelas fronteiras nem às soberanias nacionais.

Cubadebate

A caravana da crise passa ao largo da reunião do G20

Editorial do Vermelho

A reunião de cúpula do G20 acabou nesta sexta-feira (4) em Cannes, França, deixando no ar mais uma forte sensação de fracasso. O saldo final são declarações de boas intenções, como o estímulo ao mercado interno nos países superavitários, vendidas como um plano de ação para estimular o emprego, ameaças contra os paraísos fiscais e a promessa de injetar novos recursos no Fundo Monetário Internacional, o FMI, cuja principal ocupação no momento consiste em receitar e monitorar a aplicação de pacotes recessivos nos países endividados da Europa.

A crise prossegue, indiferente às deliberações dos chefes de Estado reunidos em Cannes, e na Zona do Euro, seu principal centro de irradiação ao lado dos EUA, terá por resposta a radicalização dos ajustes fiscais. A perspectiva da OCDE é de estagnação do velho continente no próximo ano, mas o futuro pode reservar novas surpresas negativas.

As divergências no interior do G20, destacadamente entre as velhas potências capitalistas e os chamados emergentes, são maiores e mais relevantes que as convergências e não é razoável esperar unidade em torno de questões consideradas centrais.

Os emergentes evitaram o compromisso de investir no fundo de resgate europeu, criado e recentemente ampliado para fazer frente à crise da dívida, o que consternou a senhora Angela Merkel, chanceler da Alemanha. O presidente francês, Nicolas Sarkozy, obteve o apoio da Argentina e do Brasil para a criação de um imposto mundial sobre operações financeiras, mas o presidente dos EUA, Barack Obama, não gostou e vetou a ideia.

A China sofreu pressões generalizadas para adotar o câmbio flutuante, mas os dirigentes do país não pretendem abrir mão do controle sobre as cotações de sua moeda, o iuan, que tem valorizado ao longo dos últimos anos dentro de limites estabelecidos pelo Estado para proteger a produção industrial.

É preciso ressalvar que os chineses têm razão quando argumentam que estão se protegendo da instabilidade monetária internacional provocada pelos desequilíbrios dos EUA e a política monetária do Federal Reserve. O câmbio flutuante no Brasil é uma causa dos problemas da indústria nacional. A óbvia necessidade de uma nova moeda mundial, em substituição ao dólar, não chegou a ser abordada, embora defendida por Sarkozy.

As contradições que predominam no grupo impõem também seus limites. Cabe recordar que o G20 foi criado em 1999 durante reunião do G7, por iniciativa da União Europeia e de George W. Bush, então presidente dos Estados Unidos. Significou certamente um reconhecimento constrangido pelos ricos da época das mudanças que estavam em curso objetivamente na economia internacional, decorrentes do desenvolvimento desigual das nações. Mas é apenas uma tentativa um pouco mais ampla de coordenação e preservação de uma ordem internacional que já caducou.

O fortalecimento do FMI, instituição remanescente dos acordos de Bretton Woods que não parece sujeita a reforma, é um caminho errado eleito inclusive pelos emergentes como via de solução para a crise. Basta atentar para a tragédia grega e o drama europeu para ver que as receitas do fundo obedecem exclusivamente aos interesses do sistema financeiro e agravam a crise da economia real com a promessa de solucioná-la.

O mundo demanda uma nova ordem mundial, com um novo sistema monetário e novas instituições. O que não é mais racional, como sugeriu Hegel, não merece subsistir. A solução para a crise, que traduz também o esgotamento da ordem internacional hegemonizada pelos EUA, não virá da reunião de cúpula. Mas é provável que venha das ruas, da guerra de classes que hoje tem como um palco privilegiado as ruas da velha Europa, onde a classe trabalhadora resiste com energia e determinação ao retrocesso social e à ofensiva talvez sem paralelo dos governos capitalistas contra suas históricas conquistas e o chamado Estado de Bem Estar Social.

O Irã e a perigosa aposta de Israel

Por Mauro Santayana, em seu blog:

Não se trata mais de hipótese: os falcões americanos e o governo britânico estão dispostos a apoiar ação militar de Israel contra o Irã, embora grande parte da opinião pública israelita advirta que essa aventura é arriscada. Aviões militares de Israel fazem manobras no Mediterrâneo e já se fala no emprego de mísseis de alcance médio contra o suposto inimigo. Seus líderes da extrema-direita, entre eles religiosos radicais, estimulam os cidadãos, com o argumento de que se trata de uma luta de vida ou morte.

Toda cautela é pouca na avaliação política da questão de Israel. Em primeiro lugar há que se separar o povo judaico do sionismo e do Estado de Israel - que parece condenado a sempre fazer guerra. Como disse um de seus grandes pensadores, se todos os estados possuem um exército, em Israel é o exército que possui o estado. É explicável que, com sua história atribulada e as perseguições sofridas, sobretudo no século 20, sob a brutalidade nazista, os judeus se encontrem na defensiva. Isso, no entanto, não autoriza a insânia de sua política agressiva contra os palestinos em particular, e contra os muçulmanos, em geral.

A política belicista de Israel, alimentada pelos fundamentalistas, e estimulada pelos interesses norte-americanos, tem impedido a paz na região. Os palestinos são tão semitas quanto os judeus, embora muitos dos judeus procedentes da Europa não sejam semitas em sua origem étnica, posto que convertidos a partir do século VIII. Os dois povos poderiam viver em paz, se o processo de ocupação da Palestina pelos judeus europeus tivesse seguido outra orientação. Mas o passado não pode ser mudado.

Sendo assim, é tempo para o entendimento entre os dois povos – mas para parcelas das elites de Israel e seus patrocinadores americanos, a guerra é um excelente negócio. Sem a guerra, a receita de Israel – um território pobre de petróleo, tão próximo das mais pejadas jazidas do mundo – seria insuficiente para manter seu poderoso e bem remunerado exército e suas elites dirigentes, contra as quais começam a mover-se também os indignados, e com razão.

Israel nasceu sob o ideal de um sistema socialista baseado na solidariedade dos kibbutzim, mas hoje não se distingue mais dos países capitalistas. Os ensandecidos partidários da ação militar contra Teerã talvez imaginem que essa iniciativa tolha o reconhecimento do Estado da Palestina pela ONU, mas deixam de atentar para os grandes riscos da operação, apontados pelos judeus de bom senso. Em primeiro lugar há uma questão ética em jogo, que o mundo já medita há muito tempo: por que Israel pôde desenvolver as suas armas nucleares, e os outros países da região não podem investigar o aproveitamento do conhecimento nuclear para fins pacíficos? Em visão mais radical, mas nem por isso contrária à ética: porque Israel dispõe de 200 ogivas nucleares e os outros países não podem dispor de armas atômicas? O que os faz tão diferentes dos outros? Se o Estado de Israel se sente ameaçado pelos vizinhos, os vizinhos também têm suas razões para se sentirem ameaçados por Israel.

Façamos um rápido exercício lógico sobre as conseqüências de um ataque aéreo – que já não se trata de hipótese, mas de timing – de Israel às instalações nucleares do Irã. Como irão reagir a Rússia e a China e, antes das duas grandes potências, o que fará a Turquia? A Grã Bretanha, segundo informou ontem The Guardian, já está estudando participar de uma expedição contra o Irã e só o governo dos Estados Unidos – exceto alguns falcões - está relutante. Haveria, assim, uma aliança inicial entre Sarkozy, Cameron e Netanyahu contra o Irã.

Talvez os europeus e os próprios norte-americanos vejam nesse movimento uma forma de superar o acelerado descontentamento de seus povos contra a submissão dos estados aos banqueiros larápios. O encontro de um bode expiatório, como parece a propósito a antiga Pérsia, poderia ser uma forma de buscar a unidade interna de ingleses, franceses, norte-americanos – e judeus. É ingenuidade imaginar que o provável ataque se concentrará nas instalações de pesquisa nuclear. Uma vez iniciada a agressão, ela não se limitará a nada, e se repetirá o holocausto da Líbia, com seus milhares de mortos e feridos, em nome dos “direitos humanos” dos ricos.

O mapa geopolítico de hoje é um pouco diferente do que era em 1948 e 1967, quando se criou o Estado de Israel e quando ele se ampliou para além das fronteiras estabelecidas pela comunidade internacional.

É assustador pensar em uma Terceira Guerra Mundial, com novos atores em cena, entre eles possuidores das armas apocalípticas, como a China, o Paquistão e a Índia. Diante da insanidade de certos chefes de Estado de nosso tempo, é uma terrível probabilidade – e com todas as conseqüências impensáveis.