terça-feira, 8 de novembro de 2011

O Partido do atraso

Por Genaldo de Melo

Estamos presenciando uma fase histórica bastante perigosa para a democracia brasileira, totalmente diferente de outros momentos em que as instituições naturalmente organizavam e formulavam os fatos políticos e sociais vigentes. Politicamente falando estamos vivendo num momento em que existem de fato em funcionamento forças paralelas ao Poder do Estado e aos Aparelhos Privados de Hegemonia, que querem a todo custo darem as cartas do jogo político no Brasil.

Essas forças perderam a capacidade de convencer politicamente as massas populares de que seu projeto é o melhor para a nação brasileira. Já que não convencem com propostas diáfanas o conjunto da sociedade brasileira, bem como não conseguem mais imprimir a marca de seus partidos políticos conservadores, estão atuando politicamente através do Partido da Imprensa golpista (PIG).

Como não vão conseguir mesmo derrubar a Presidente da República, que tem sem sombra de dúvida reputação ilibada, partem para apartes escabrosos contra os membros de seu Governo. Assim, vão derrubando ministro após ministro, somente pelo fato de derrubá-los para desgastá-la junto à opinião pública e ao senso comum. Não sei se vão conseguir tal feito demoníaco, porque a história é a prova dos nove e quem pensa demais acaba morrendo de idiotice.

O mais interessante desse novo partido sem personalidade jurídica é que na sua mais descarada atuação não estão preocupados com a apuração dos fatos, mais pura e simplesmente praticar o denuncismo, porque não tem de fato nada para oferecer a sociedade brasileira. Pois quem coordena esse novo aparelho político já está mais do que desgastado, tanto dentro da classe média como nos rincões aonde vivem a grande parcela da população mais pobre desse país, que naturalmente são maioria absoluta a deixaram de serem os escravos ideológicos da minoria conservadora, que se acham os novos arianos do pedaço.

É bastante triste e digno mesmo de pena ver uma minoria fraca e sem direção insistir num erro que nunca vai dá certo, porque quem coordena o Governo é Dilma! Parece que são cegos mesmo, pois ainda não passaram um olhar, pelo menos de vergonha na cara, para ver o que acontecendo no Brasil, bem como no mundo. Agora é a vez da mulher na política, porque ela pode e a história deve isso a ela. Estão totalmente perdidos...

Agora já tem outro membro do Governo na mira do novo partido sem personalidade jurídica. A limitação dessa turma de fracos é achar que derrubar um ministro é eliminar um projeto político que vem dando certo e consolidando o Brasil como uma potência mundial, e ainda convencer o povo brasileiro.  Acho que ele deveria não seguir o exemplo do jornalismo da obediência argentino. Lá a mulher esmagou politicamente a mentira e apaixonou as multidões.

Trabalho neles, Dilma!

Iraque: amargo regresso dos EUA

Wallerstein analisa nova derrota internacional de Washington. E antevê um avanço dos xiitas que, paradoxalmente, pode não interessar ao Irã.

Por Immanuel Wallerstein - Revista Fórum

 Tradução de Daniela Frabasile para o Outras Palavras.

Agora é oficial. Todas as tropas norte-americanas — com uniforme dos Estados Unidos — serão retiradas do Iraque em 31 de dezembro de 2011. Podemos interpretar essa decisão de duas maneiras. Uma delas segue a visão do presidente Barack Obama: é o cumprimento de uma promessa eleitoral feita em 2008. A segunda é a interpretação dos candidatos republicanos à presidência. Eles condenaram Obama por não ter feito o que dizem que o exército dos Estados Unidos queria, que é manter alguns soldados depois de 31 de dezembro para treinar o exército iraquiano. De acordo com Mitt Romney, a decisão de Obama é “o resultado de um cálculo político ou simplesmente inaptidão nas negociações com o governo iraquiano”.

As duas explicações não têm sentido, e são meras justificativas para os eleitores. Obama tentou ao máximo — e em total conjunção com os comandantes do exército e com o Pentágono — manter as tropas norte-americanas depois de 31 de dezembro. Mas falhou, não pela inaptidão, mas porque os líderes políticos do Iraque forçaram os Estados Unidos a sair. A retirada marca o final da derrota americana, que pode ser comparada à derrota dos Estados Unidos no Vietnã.

O que realmente aconteceu? Nos últimos dezoito meses, as autoridades de Washington realmente tentaram negociar um acordo com os iraquianos. Esse acordo iria se sobrepor ao termo assinado pelo presidente George W. Bush, que se comprometia com a retirada total das tropas em 31 de dezembro de 2011. Eles falharam — e não é que não tenham se esforçado.

No Iraque, os grupos mais favoráveis aos Estados Unidos são os grupos sunitas liderados por Ayad Allawi, um homem com relações notoriamente próximas à CIA, e o partido de Jalal Talebani, o presidente curdo do Iraque. Os dois homens disseram — relutantes, sem dúvida — que seria melhor as tropas americanas deixarem o país.

O líder iraquiano que se trabalhou duro para chegar a um acordo que mantivesse as tropas norte-americanas foi o primeiro-ministro Nouri al-Malaki. Obviamente, ele acreditava que a pouca habilidade do exército iraquiano em manter a ordem levaria o país a novas eleições, nas quais sua posição política estaria muito enfraquecida e ele, provavelmente, colheria maus resultados nas urnas. Enfim, deixaria de ser primeiro-ministro.

Os Estados Unidos fizeram concessão atrás de concessão, reduzindo constantemente o número de soldados que manteriam no Iraque. No fim das contas, o ponto de atrito foi a insistência do Pentágono em garantir a imunidade jurídica dos soldados americanos (e dos mercenários), liberando-os da acusação de qualquer crime que cometessem no país. Maliki estava pronto para concordar com isso, mas ninguém mais estava. Os sadristas chegaram a dizer que iriam retirar seu apoio ao governo, se Maliki aceitasse as condições de Washington. Sem os votos dos sadristas, Maliki não obteve a maioria necessária no parlamento.

Então, quem ganhou? A retirada foi a vitória do nacionalismo iraquiano. E a pessoa que veio para encarnar o nacionalismo iraquiano é Muqtada al-Sadr. É verdade que al-Sadr lidera um movimento xiita que sempre foi violentamente contrário ao partido de Saddam Hussein, o Baath — o que, para seus seguidores, costuma significar ser contra muçulmanos sunitas. Mas al-Sadr afastou-se de sua posição inicial, para converter a si próprio e a seu movimento nos grandes defensores da retirada dos Estados Unidos. Ele estendeu uma mão para líderes sunitas e líderes curdos na esperança de criar uma frente nacionalista pan-iraquiana, centrada na restauração total da autonomia do Iraque. Foi ele quem ganhou.

É certo que al-Sadr — assim como Maliki e outros políticos xiitas — passou uma grande parte de sua vida exilado no Irã. Sua vitória seria o triunfo do Irã? Sem dúvida, Teerã ampliou sua credibilidade no Iraque. Mas seria um erro analítico enorme acreditar que o Irã substituiu o domínio dos Estados Unidos sobre o cenário político iraquiano.

Existem tensões fundamentais entre os xiitas iranianos e os xiitas iraquianos. Por um lado, os iraquianos sempre consideraram o Iraque — e não o Irã — como centro espiritual do mundo xiita. É verdade que, nos últimos 50 anos, as transformações no cenário geopolítico permitiram que os aiatolás do Irã parecessem dominar o universo do xiísmo. Mas isso é parecido com o que aconteceu na relação entre os Estados Unidos e a Europa Ocidental depois de 1945. A força geopolítica dos Estados Unidos provocou um deslocamento na relação cultural entre dois lados do Atlântico. A Europa Ocidental teve que aceitar o novo domínio dos Estados Unidos — mas nunca gostou disso. E agora tenta retomar a hegemonia cultural. O mesmo acontece com o Irã e o Iraque. Nos últimos 50 anos, os xiitas iraquianos tiveram que aceitar o domínio cultural do vizinho, mas nunca gostaram disso. E agora irão trabalhar para retomar o predomínio cultural.

Apesar das declarações públicas, tanto Barack Obama quanto os republicanos sabem que os Estados Unidos foram derrotados. Os únicos norte-americanos que não acreditam nisso encontram-se entre o pequeno grupo marginal de esquerda que de algum modo não pode aceitar que os Estados Unidos não são capazes de ganhar sempre, em todos os lugares. Esse pequeno grupo, atualmente em declínio, está tão obcecado em denunciar os Estados Unidos que não tolera o fato de que o país está em sério declínio.

Para esse grupo marginal, nada mudou. Agora, o representante dos interesses dos Estados Unidos no Iraque não é mais o Pentágono, e sim o Departamento de Estado, que está fazendo duas coisas: deslocando mais fuzileiros para providenciar segurança à Embaixada dos Estados Unidos e contratando especialistas para treinar as forças policiais iraquianas. Mas levar mais soldados é um sinal de fraqueza, não de força.

Significa que até mesmo a bem guardada embaixada norte-americana não está suficientemente segura dos ataques. Pela mesmíssima razão, os Estados Unidos cancelaram os planos de abrir mais consulados no país.

Quanto aos especialistas, estamos falando em aproximadamente 115 conselheiros policiais que precisam ser “protegidos” por milhares de seguranças privados. Eu garantiria que os conselheiros policiais serão muito cautelosos ao sair do território da embaixada — e que isso irá dificultar a contratação de seguranças privados em número suficiente, dado que não terão mais imunidade jurídica.

Ninguém deve se surpreender se, depois das próximas eleições no Iraque, o primeiro ministro for Muqtada al-Sadr. Nem os Estados Unidos nem o Irã vão gostar.

O capital está acuado

O concreto é concreto porque é a síntese de múltiplas determinações, portanto unidade da diversidade” (Karl Marx – Grundrisse)
Por Ari de Oliveira Zenha - Caros amigos
O capitalismo encontra-se em um impasse gigantesco diante da crise profunda, estrutural, que vive desde a eclosão em 2008. É a maior e mais aguda crise desde a de 1929, que acabou desembocando na segunda guerra mundial. Hoje, uma saída deste teor levaria à destruição do planeta.

Não devemos menosprezar a capacidade do capital de “superar” – a um custo elevadíssimo para a população mundial – os prováveis “transformismos” que o capitalismo como sistema hegemônico tem realizado há pelo menos dois séculos, impondo ao mundo sua dominação, sua influência e seu controle opressor soberano sobre o planeta.

Estão surgindo em praticamente todo o mundo movimentos populares que atuam no sentido – de questionar o próprio sistema capitalista em sua totalidade. A ocupação de Wall Street, centro nevrálgico financeiro do mundo e do capital hegemônico mundial – os Estados Unidos da América – com cartazes e palavras de ordem que colocam em xeque o capital com toda a sua superestrutura e estrutura de dominação, exploração e reprodução política- econômico- social. A Europa convulsionada.

No Oriente Médio também está sob fogo cerrado o domínio do capital. Querem democracia, querem direitos fundamentais, querem participação, querem liberdade, querem justiça social. Ditaduras com décadas de dominação estão caindo ou seus detentores estão entregando os anéis para se salvar da avalanche popular. Enfim o céu não é de brigadeiro para o capitalismo, mas sim um imenso nevoeiro que paira sobre seu domínio há bem pouco tempo inimaginável, há uma hemorragia, um esgotamento que atinge as vísceras do capital.

Os organismos internacionais, como o FMI, estão sendo questionados, e, indo mais além, o próprio sistema está sendo discutido, posto em dúvida sua validade como sistema produtivo-social-político. Não devemos esquecer que no capitalismo as contradições e suas repercussões no mundo se dão de forma desigual, porém combinada, ou seja, todos pagarão, uns mais, outros menos, mas todos hão de pagar a conta da degradação e da barbárie que o capitalismo se apresenta neste início de século que promete ser o século das grandes transformações sociais, das grandes transformações de caráter estruturais e porque não revolucionárias!

O momento atual nos impele a ousar, esta é a palavra ou expressão mais válida para o momento histórico que vivemos. Ousar, ir além dos limites impostos pela dominação do capital, pressionar, romper os limites da exploração do capital e trazer o ser humano para o seu devido lugar, no seio, no âmago da existência digna em que o homem possa se tornar dono do seu próprio destino, destruindo qualquer tipo de opressão e exploração, onde ele se torna senhor de sua própria existência, o verdadeiro reino da liberdade, da confraternização internacional dos povos, da conformidade em ser para si, estabelecendo no mundo uma sociedade harmônica, humana e fraterna.

Ari de Oliveira Zenha é economista.

Crack é problema em 90,7% dos municípios brasileiros

Pesquisa com 4.430 municípios brasileiros mostra ainda que em 81% deles não há CAPS, que é a porta de entrada para o tratamento da dependência pelo SUS
 
Segundo o relatório, o consumo de entorpecentes é uma questão social que invade outras áreas, como saúde, segurança pública e educação (Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)
São Paulo – Nesta segunda-feira (7), a Confederação Nacional de Municípios (CNM) divulgou os dados da segunda pesquisa sobre a presença do crack nas cidades brasileiras. Dos 4.430 municípios que responderam os questionários, 84,4% afirmaram enfrentar problemas com a circulação de drogas. Transtornos devido à circulação do crack são comuns em 93,9% e para 90,7%, esse tipo de droga representa o principal problema para a prefeitura.

Segundo o relatório com os dados da pesquisa, o consumo de entorpecentes é uma questão social que invade outras áreas, como saúde, segurança pública e educação. Conforme as prefeituras, aumento de furtos e roubos, da violência doméstica no campo e nas cidades estão relacionadas ao crack, que está substituindo o álcool entre os trabalhadores rurais em muitas localidades.

O relatório da CNM aponta ainda a carência de equipamentos de apoio em muitas cidades, como Conselhos Municipais Antidrogas (Comad), Centro de Referência de Assistência Social (Cras), Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas), Centro de Atenção Psicossocial (Caps), Núcleo de Apoio à Saúde (Nasf) e Conselho tutelar.

São Paulo
Das 556 prefeituras paulistas que responderam à pesquisa, 510 afirmam enfrentar problemas com a circulação de drogas. Em 143 dos municípios não há CAPS (Centro de Atenção Psicossocial), em 142 deles não existe CREAS (Centro de Referência Especializado em Assistência Social), unidade que oferece serviços especializados e continuados a famílias e indivídiuos em situação de ameaça ou violação de direitos. Em 154 faltam Núcleos de Apoio à Saúde Familiar (NASF). E entre 455 cidades paulistas ainda não foi constituído o Conselho Municipal Antidrogas.

Tambores de guerra contra o Irã

Editorial do Vermelho

A aliança entre o imperialismo dos EUA e o sionismo que governa Israel é a grande ameaça contra a paz no mundo, evidência que se reforçou desde a semana passada quando os tambores da guerra voltaram a soar em Tel Aviv e Washington anunciando um provável ataque militar contra instalações nucleares no Irã.

O roteiro que levou à agressão contra o Iraque, em 2003 e contra a Líbia, neste ano, é reencenado nas chancelarias do imperialismo. Acusa-se o Irã de desenvolver um programa nuclear para finalidades militares (construir uma bomba atômica), alegação tão improvável e hipócrita quanto a mentira de dez anos atrás, que acusava o Iraque de produzir armas químicas, alegação que nunca foi comprovada – ao contrário, foi cabalmente desmentida.

As ameaças podem ser explicadas por vários pretextos. A correlação de forças no Oriente Médio tem mudado. Malgrado as agressões a povos e países soberanos, como na Líbia, o ambiente político não é tão favorável à execução dos planos imperialistas. Castelos de carta cuidadosamente construídos por uma diplomacia mentirosa e belicosa, que enfatizava a ameaça contra a segurança de Israel, ruíram fragorosamente e o realinhamento de forças na região aprofundou o isolamento de Israel e o descrédito da diplomacia hoje comandada por Hillary Clinton. A catástrofe provocada no Iraque levou ao efeito, indesejado e imprevisto pela diplomacia dos EUA, de alçar o Irã a uma potência regional que precisa ser levada em conta. Por outro lado, o levante de populações árabes fez Turquia e Egito deslizarem para posições hoje consideradas inseguras, para Israel. E a ameaça de repetir, na Síria, agressão semelhante à ocorrida contra Líbia parece encontrar obstáculos não calculados pelo imperialismo. Seus planos não prosperam, embora os cães de guarda rosnem com vigor contra o governo de Damasco.

Esta é uma parte do quadro. A outra, que os analistas militares (entre eles alguns oficiais graduados inclusive de Israel) levam em conta, é o inegável crescimento da capacidade militar e logística do Irã, dotado hoje de meios (mísseis) capazes de atingir Israel e mesmo algumas capitais europeias. Configura-se uma capacidade de reação grande, inaceitável para o imperialismo, mesmo que aqueles mísseis transportem armas convencionais e não a alegada bomba atômica que acusam o Irã de pretender construir. Além disso, outro fator inesperado e desestabilizador, para Israel e para o imperialismo, é a capacidade de mobilidade alcançada pela marinha iraniana depois da liberação, pelos novos governantes egípcios, da passagem de seus navios pelo canal de Suez, dando-lhes acesso ao Mediterrâneo e, em consequência, ao litoral de Israel.

Na semana passada, os rumores crescentes de uma preparação militar israelense para atacar o Irã, com apoio dos EUA, provocaram resposta iraniana imediata. Serão recebidos a bala – este foi o tom dessa resposta.

O apoio para uma aventura irresponsável e criminosa como essa tem sido vacilante. Os falcões de Tel Aviv e de Washington puseram os dentes de fora. O governo britânico declarou-se pronto a acompanhar a agressão contra o Irã; o “moderado” presidente de Israel, Shimon Peres, defendeu a ação militar; uma pesquisa mostrou uma população israelense dividida (41% a favor, 39% contra o ataque, e 20% sem opinião); e um general dos EUA, Jack Keane, defendeu, na Câmara dos Deputados de lá, o assassinato puro e simples de chefes militares iranianos.

A tensão vai crescer depois que a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) divulgar seu relatório (previsto para esta terça feira, dia 8) com “demonstrações” contra o programa nuclear iraniano. Mas já não é o mesmo xadrez enfrentado pelos belicistas de Washington quando tramaram, há uma década, e com apoio de Tel Aviv, a agressão contra o Iraque. Os EUA já não são a alegada única superpotência e sua capacidade financeira e sua credibilidade estão abaixo da crítica neste mundo multipolar onde o declínio relativo do imperialismo estadunidense é nítido.

Manifestações contrárias à aventura militar no Irã começam a aparecer. Rússia e França, por exemplo, alertaram para o agravamento da instabilidade regional que viria na esteira desse ataque. Os russos foram específicos e falaram que seria um “erro muito grave de consequências imprevisíveis”, alertou o chanceler Sergei Lavrov. E mesmo graduados militares de Israel, como dois generais que já foram chefes do Mossad (o serviço secreto local) condenaram a hipótese; um deles disse que seria “uma estupidez”. Ou “um suicídio”, como disse a emissora PressTV, lembrando o conjunto de mísseis desenvolvidos pelo Irã, com capacidade para atingir todo o território israelense.

A reação iraniana reforça estes temores. O imperialismo e os sionistas “sofrerão perdas enormes”, disse um general. Terão uma “resposta arrasadora”, disse outro, lembrando a capacidade iraniana de atingir os navios e bases militares dos EUA no Golfo Pérsico, além de deterem o controle do Estreito de Ormuz, por onde circula 40% do petróleo consumido no mundo. Este seria o preço alto a ser pago por uma agressão militar que, muitos pensam, poderia não chegar aos resultados esperados pois o projeto nuclear iraniano é disperso e algumas instalações ficam em casamatas subterrâneas praticamente inatingíveis.

O mundo mudou num ritmo acelerado e desfavorável ao imperialismo e ao sionismo. É difícil prever o desdobramento das ameaças que se acentuaram desde o início de novembro, da mesma forma como é difícil prever as consequências de um ataque aventureiro e irresponsável contra o Irã. Nestes dias, só há uma certeza: a de que a ameaça real e concreta contra a paz e contra os povos está sediada não em alguma capital árabe mas nos salões das principais capitais do imperialismo, como Londres e Washington, coadjuvada com o ladrar dos cães de guarda de Tel Aviv.

Augusto Buonicore: Marx e a modernidade capitalista - Parte 5

Na seção anterior vimos que, na obra de Berman, destinada a analisar a chamada “modernidade”, não existia nenhuma proposta para a construção de uma nova modernidade que fosse alternativa e oposta à modernidade destrutiva do capitalismo na sua fase imperialista. No fundo existia um temor conservador sobre o futuro constituído por uma revolução.

Por Augusto Buonicore*


O pessimismo e o conservadorismo de Berman ficam também claros na seguinte passagem do texto:

“Por fim, nossas dúvidas e ceticismo quanto às promessas dos agentes promotores (de revoluções) devem conduzir-nos a questionar uma das promessas fundamentais de Marx: a promessa de que o comunismo, ao preservar e, na verdade, aprofundar as liberdades trazidas pelo capitalismo, nos libertará dos horrores do niilismo burguês (...). É fácil imaginar como uma sociedade empenhada no livre desenvolvimento de cada um e de todos pode muito bem desenvolver suas próprias e peculiares formas de niilismo. De fato, um niilismo comunista pode vir a ser bem mais explosivo e desintegrador que seu antecedente burguês (...), pois, enquanto o capitalismo reduz as infinitas possibilidades da vida moderna a limites preestabelecidos, o comunismo de Marx pode lançar o ego liberado na direção de imensos espaços humanos desconhecidos, sem qualquer limite” (Berman, 1987: 11).

Perry Anderson, respondendo a Berman afirmou:

“A coesão e a estabilidade, que Berman se pergunta se o comunismo seria capaz de encontrar algum dia, reside para Marx na própria natureza humana que o comunismo finalmente viria a emancipar ― uma natureza muito distante de uma mera catarata de desejos sem forma. Apesar de toda a sua exuberância, a versão que Berman dá de Marx, enfatizando de modo virtualmente exclusivo a liberação do eu, acaba por aproximar-se desconfortavelmente (...) das suposições da cultura do narcisismo” (Anderson, 1986: 14).

Para Berman, a proposta de constituição de uma comunidade dos produtores associados não seria mais do que uma quimera utópica que, se pudesse ser realizada, necessariamente seria varrida pelas ondas avassaladoras e a-históricas (ou supra-históricas) da modernidade. A constituição de um movimento de trabalhadores estável, assentado na solidariedade de classe, que brotasse das condições comuns de exploração e de opressão, pareceu-lhe possível apenas provisoriamente. Berman, assim, chegou a conclusões antiassociativas.

Escreveu ele:

“Mas, caso seja verdadeira essa visão abrangente da modernidade, por que razão as formas comunitárias produzidas pela indústria capitalista seriam mais sólidas que qualquer outro produto capitalista? Não seria o caso dessas coletividades se revelarem, como tudo o mais, apenas temporárias, provisórias, condenadas à obsolescência? Marx, em 1856, se referirá aos operários da indústria como “homens-frutos de uma moda passageira (...), nada mais que uma invenção dos tempos modernos, como o próprio maquinário”. Se isso é correto, sua solidariedade (...) poderá mostrar-se tão transitória quanto as máquinas que eles operam ou os produtos que daí resultam (...). Como poderão eventuais vínculos humanos crescer e frutificar num solo assim precário e movente?” (Berman, 1987: 102)

O proletariado perderia as condições históricas e sociais de se constituir enquanto agente de transformação social, pois a modernidade dissolveria permanentemente os laços de solidariedade produzidos pelas posições que aquele assumiria no mundo da produção e na própria vida social. A modernidade capitalista não produziria mais os seus próprios coveiros, mas apenas operários-para-o-capital.
* Augusto Buonicore é historiador e secretário geral da Fundação Maurício Grabois

A esquerda e a necessária repolitização do discurso contra a corrupção

Por Newton de Menezes Albuquerque
 
O tema da corrupção tem se constituído na bandeira central da direita brasileira na atualidade, em uma grande “Santa Aliança” que agrega liberais, neoliberais, reacionários fascistas, anticomunistas et caterva. O que não é propriamente nenhuma novidade, pois em vários momentos de nossa história a direita sempre recorreu ao moralismo como principal emblema de seu combate a esquerda e as forças populares. Foi assim com o governo Vargas denominado pela mesma como “mar de lama”, como também no Golpe de 64 quando as vivandeiras civis e empresariais em nome dos “bons costumes” e dos sacrossantos “valores cristãos e ocidentais” destituíram o governo legítimo de João Goulart.

Estratégia moralista da direita que teve lá seus êxitos práticos, ao galvanizar apoios de certos segmentos da classe média para seus empreendimentos e objetivos de conquista do poder. Êxito este que em grande medida se deve – nos últimos anos - a ampla associação entre a ação da direita e setores expressivos e majoritários da imprensa, unidos na defesa dos fundamentos neoliberais do mercado. Mesmo discurso, aliás, adotado pela direita pelos nazistas contra a “República de Weimar” na Alemanha nos anos 20, por Franco contra os republicanos na Espanha nos anos 30 ou por Pinochet e seus gorilas amestrados contra o governo legítimo e popular de Salvador Allende nos anos 70 e assim por diante.

Na verdade a retórica do moralismo abstrato esgrimido pela direita tem um intuito claro e insofismável, o de buscar afastar a dinâmica da política de seu campo específico, o enfrentamento dos diversos interesses que conformam o horizonte concreto das sociedades de classe capitalistas, conduzindo-a ao terreno da ideologia “universalista” da ética, dos princípios metafísicos da liberdade e da igualdade formais gerados no interior da ordem burguesa. Pois é com base em uma leitura formalista da igualdade e da liberdade e de sua “natural” projeção na propriedade privada enquanto espaço de objetivação da personalidade individual que se estrutura o discurso hegemônico da ética, da moral e do direito da modernidade burguesa. Nesse sentido o modelo ético promovido pelo liberalismo ou pelas correntes autoritaristas da política, não obstante suas diferenças internas apontam para um ponto comum, a dissolução da política na pré-compreensão individualista das relações humanas, inclusive do dever-ser ético. A conduta ética é compreendida como algo que decorre das “boas intenções”, da natureza intrínseca de cada pessoa, e não das relações sociais dominantes ou das estruturas de poder institucionalizadas. Ser corrupto ou afastar-se da ética para os defensores da cosmovisão burguesa de mundo significa postular qualquer conduta distinta da tábua de valores privatista que a cinzela. Não à toa que diante das lutas sociais, dos processos mobilizatórios “dos de baixo” ou de qualquer demanda coletiva, o sistema reage atribuindo-lhes um caráter subversivo, lesivo a ordem e aos valores da ética e da “civilização”.

Na concepção liberal a corrupção decorre da presença artificial da política na vida social em substituição a “naturalidade” do mercado e da presumida espontaneidade de suas demandas e interesses. O Estado deve se restringir a atuar quando chamado buscando satisfazer os direitos individuais em caso de sua expressa violação, mas nunca, segundo os liberais, na consecução da política e na reestruturação das relações de poder e da sociedade. Daí nasceria a corrupção, da imposição externa, heterônoma do Estado e de seus “tentáculos” sobre o espaço natural da troca de interesses e de produtos organizado em torno do mercado, como, aliás, predicam os neoliberais da Casa das Garças no Brasil em Seminário recente tendo a frente seus ideólogo maior, Fernando Henrique Cardoso.

Contudo, tal retórica contra a corrupção tem evidentes fragilidades, sérios problemas de credibilidade, pois é da essência da ordem capitalista a violação sistemática da vida, da uniformização massificadora do indivíduo e da mercantilização de tudo em nome do grande Moloch, o dinheiro. Daí a insustentabilidade do discurso da ética reivindicado pelos liberais e autoritários da direita, dada sua intrínseca desumanidade, especialmente, na América Latina e no Brasil, onde a direta patrocinou por décadas políticas de subalternização colonial e de desigualação social, política e cultural das maiorias trabalhadoras. Um breve exame de nossa história do período monárquico, passando pela República Velha até os dias de hoje nos revelam a ação concentradora de renda, de poder, além das inúmeras iniquidades, fisiologismos e corrupção geradas pelo nosso modelo de capitalismo periférico e dependente. Das chagas do escravismo às dores lancinantes de um assalariamento precarizado o que assistimos em nossa história é a quase omnipresença de relações de subcidadania em relação ao povo brasileiro em dissonância a qualidade de sobrecidadania imputado aos ricos desse país.

A fúria inquisitória da oposição liberal-conservadora liderada pela grande mídia (principal partido de oposição), pelo PSDB, DEM e PPS tem óbvios pés-de-barro, afinal de contas foram estes segmentos os responsáveis pela imposição de uma nova Era Neoliberal de castração de direitos fundamentais, da criminalização dos movimentos sociais e pelo estabelecimento de relações incestuosas, francamente promíscuas entre setor privado – nacional e internacional - e o aparato do Estado. Aceitar passivamente o discurso desses segmentos sem opor um amplo movimento de contestação de seus pressupostos é um imperdoável erro da esquerda brasileira, mais precisamente do Partido dos Trabalhadores como a mais importante organização de esquerda da América Latina.

Erro do PT que decorre da sua assimilação gradativa à ordem, à lógica eleitoralista da “pequena política”, à aritmética da governabilidade que transforma nosso projeto estratégico socialista em um conjunto de movimentos táticos esparsos de obtenção de maiorias eventuais para votar ou aprovar medidas isoladas de nosso governo. Claro que a governabilidade é importante, inegável, mas não pode circunscrever nossa ação mais longa, de perspectiva histórica, de transformação profunda, radical das relações sociais, políticas e culturais a que nos propomos quando da fundação do Partido dos Trabalhadores na década de 80. Além do nosso encapsulamento posterior ao episódio denominado de “Mensalão” e seu tratamento insatisfatório pelas instâncias dirigentes do PT do sério problema da absorção de muitos de nossos quadros ao pragmatismo do sistema.

Precisamos urgentemente sair da defensiva, assumir protagonismo no debate sobre a corrupção, suas causas e motivações, revelando que sua gênese deflui da captura do Estado pelas tendências privatistas inscritas no capitalismo, assim como, do processo concentracionário de renda e poder historicamente produzido pela direita e suas políticas anti-sociais. Com que autoridade a direita tucana e seus sócios podem protestar contra corrupção, se foram exatamente eles que entregaram o Estado e suas instituições a sanha mafiosa das corporações empresariais? Como falar de corrupção quem desprezou a vida de milhões, ignorando as políticas de combate à fome, às desigualdades sociais e regionais? Como ser favorável a moralidade quando esses partidos transformaram a política, a educação e a cultura em um mercado persa, onde tudo vale? Como serem consequentes com a corrupção se colocaram o Brasil genuflexo perante os EUA e os demais centros imperialistas?

O discurso consequente da anticorrupção só pode ser feito por quem esteve do lado da transparência do poder, da descentralização política, do fornecimento de meios de fiscalização do Estado e de suas políticas, do fortalecimento das instituições como a Receita e a Polícia Federal através do qual se encetou um sólido combate a elisão fiscal e ao crime organizado- dentro e fora do Estado – e, principalmente, por quem buscou reconstruir os fundamentos cívicos da sociabilidade, apostando na participação da Sociedade Civil, dos movimentos sociais, das ONGs, da intelectualidade, etc. Daí a importância da apropriação pelo Partido dos Trabalhadores e da esquerda brasileira de nossa história mediata e imediata para deflagrar um debate sério e indispensável sobre a corrupção no Brasil. Em que mostremos pedagogicamente os responsáveis pela mesma, o que fizemos, os limites do sistema capitalista e de sua inerente falta de ética, e de como a radicalização da democracia tende ao socialismo, única alternativa universalista frente aos desafios de uma ética política generosa e emancipatória porquê radicalmente humanista e desalienadora. Uma abordagem da corrupção que a exemplo do proposto por Gramsci a vincule a disputa contra-hegemônica de valores com o capitalismo brasileiro e seus representantes liberais-conservadores no marco da construção de novos fundamentos ético-políticos.

Newton de Menezes Albuquerque Doutor em Direito, leciona na Universidade Federal do Ceará (UFC) e na Universidade de Fortaleza (Unifor). É procurador administrativo do município de Fortaleza e é membro do Conselho Curador da Fundação Perseu Abramo

O companheiro FMI, quem diria...

A Zona do Euro foi com sede ao pote do G-20, munida da euforia despertada pelo acordo em torno do montante e da função do Fundo de Estabilidade, da redução da dívida grega e da re-capitalização dos bancos europeus.

A imagem não podia ser mais acachapante: quando os líderes europeus, Ângela Merkel e Nicolas Sarkozy à frente, passaram pela platéia sacudindo a latinha de moedas, esperando captar mais din-din, ninguém pingou... A imagem não é minha, pertence a Larry Eliot, do The Guardian (“G-20 was a lesson in disunity and the markets passed judgement”, 04/11). Mas descreve bem a situação.

Quando a latinha passou, os chineses olharam para cima, para baixo, para os lados, fizeram que não era com eles. Claro: os chineses jamais negociariam na moldura de um fórum multilateral como o G-20. Com todos os seus problemas, eles estão com a faca (a moeda controlada) e o queijo (as reservas trilionárias) na mão. Obama manifestou “simpatia”. Caramba! Menos que isso, só se pedisse que os pedintes se afastassem porque estavam atrapalhando a paisagem.

Acho que de todos, só a presidenta Dilma foi meridianamente clara. Disse que pingaria sim, mas... Somente através do FMI! Quem diria, o agora companheiro FMI! Por quê? Porque, disse Dilma, o FMI dá garantias sobre como o dinheiro vai ser utilizado. Não foi um tapa com luva de pelica. Foi sem luva nenhuma. Claro: pode ter sido um mero tapa nas costas, daqueles que procura fazer o pobre diabo que tosse desengasgar. Quem sabe... mas duvido. A pílula rece(depre)ssiva como terapia está demasiadamente entranhada no DNA do Consenso de Bruxelas.

Dilma tem razão. A Zona do Euro foi com sede ao pote do G-20, munida da euforia despertada pelo acordo em torno do montante e da função do Fundo de Estabilidade, da redução da dívida grega e da re-capitalização dos bancos europeus. Bastou o primeiro ministro grego, Georges Papandreou, acenar com uma superdose de democracia, um referendo para aceitar ou não o programa de austeridade e a permanência na Zona do Euro, para a euforia revelar-se uma bolha efêmera e tudo voltar não à estaca zero, mas à menos um: a Itália entrou na dança também, e esperemos que dessa vez, pelo menos, Berlusconi dance de fato.

Mas toda a correria até agora despertada, se refere mais a socorrer os bancos do que a população e a economia. O programa europeu é claramente recessivo, e isso não interessa nem a China nem ao Brasil nem a ninguém mais. O dinheiro, que sai do “bolso do contribuinte” (essa imagem a direita gosta), apenas passa pela contabilidade dos países em insolvência e vai parar – em torno de 80 a 90 % - na dos bancos credores, que se tornaram devedores em relação a seus créditos (!) porque se os devedores não pagarem eles não terão cash para honrar os saques que virão aos montes. Essa é a situação real.

Por que a presidente Dilma foi tão clara onde outros tergiversaram? Devido a seu temperamento? Pode ser. Mas também devido ao fato de que o Brasil age de modo diametralmente oposto ao da China, embora possa ter interesses em comum. O Brasil, que não é potência militar (graças a Deus!) nem monetária, se interessa em negociar na moldura de fóruns multilaterais. Essa é a aposta brasileira, e está certa.

Alerta! O poder militar prevalece

A tutela do poder militar é revelada pelo fato de a Comissão da Verdade, aprovada na Câmara, não passar de uma Comissão “para inglês ver”

Por Anita Leocadia Prestes - Brasil de Fato

Durante toda a década de 1980 e, em particular por ocasião dos trabalhos da Constituinte e, posteriormente, com a promulgação da Constituição de 1988, Luiz Carlos Prestes denunciou à Nação a tutela exercida pelas Forças Armadas – um verdadeiro poder militar– sobre os três poderes da República (Executivo, Legislativo e Judiciário).  

Às vésperas da promulgação da Constituição, Prestes assinalava que no Artigo 142 da Constituição é concedida às Forças Armadas, (quer dizer, aos generais) a atribuição constitucional de “garantirem... a lei e a ordem”. A seguir, afirmava: “Atribuição constitucional que nem ao presidente da República ou aos outros dois poderes do Estado é tão expressamente concedida”. Ressaltava, contudo, que a inclusão da afirmação de que “aquela atribuição dependerá da ‘iniciativa’ de um dos poderes de Estado” não passava de uma “reserva evidentemente apenas formal, já que será sempre fácil aos donos dos tanques e metralhadoras imporem a ‘um dos poderes do Estado’ que tome a referida iniciativa”. Prestes escrevia que o Artigo 142 contraria “conhecido preceito da tradição constitucional de nosso país, que sempre afirmou serem os três Poderes do Estado autônomos, mas harmônicos entre si, não podendo, portanto, nenhum deles tomar qualquer iniciativa isoladamente”.  

A seguir Prestes tratava de não deixar dúvidas quanto à essência do Artigo 142 da Constituição de 1988: 
“Em nome da salvaguarda da lei e da ordem pública, ou de sua ‘garantia’, estarão as Forças Armadas colocadas acima dos três Poderes do Estado. Com a nova Constituição, prosseguirá, assim, o predomínio das Forças Armadas na direção política da Nação, podendo, constitucionalmente, tanto depor o presidente da República, como os três Poderes do Estado, como também intervir no movimento sindical, destituindo seus dirigentes, ou intervindo abertamente em qualquer movimento grevista, como vem se fazendo desde os decretos de Getúlio Vargas, de 1931, ou mesmo, voltando aos tempos anteriores, em que a questão social era considerada uma questão de polícia, segundo o senhor Washington Luís.(grifos meus).  

Concluindo, Prestes escrevia: “Muito ainda precisaremos lutar (...) para nos livrarmos dessa interferência indébita e nefasta dos generais, para conquistarmos um regime efetivamente democrático.” Na realidade, o Artigo 142 da Constituição de 1988 continua vigente. Confirma-se a tese defendida por Prestes do poder militar e de sua tutela sobre a Nação. É lembrado pelo diretor do Instituto de Estudos sobre a Violência do Estado (IEVE), professor Edson Teles, “na Constituição de 1988, seu artigo 142 aponta a ingerência militar nos assuntos civis”, questionando a seguir: “Como podem os militares se submeterem aos ‘poderes constitucionais’ (Executivo, Legislativo e Judiciário) e ao mesmo tempo garanti-los?” Edson Teles assinala que, na Constituição atual, “a relação entre militares e civis ficaram quase idênticos (sic) à Constituição outorgada de 1967”, concluindo: 

Na realidade, o Artigo 142 da Constituição de 1988 continua vigente. Confirma-se a tese defendida por Prestes do poder militar e de sua tutela sobre a Nação. É lembrado pelo diretor do Instituto de Estudos sobre a Violência do Estado (IEVE), professor Edson Teles, “na Constituição de 1988, seu artigo 142 aponta a ingerência militar nos assuntos civis”, questionando a seguir: “Como podem os militares se submeterem aos ‘poderes constitucionais’ (Executivo, Legislativo e Judiciário) e ao mesmo tempo garanti-los?” Edson Teles assinala que, na Constituição atual, “a relação entre militares e civis ficaram quase idênticos (sic) à Constituição outorgada de 1967”, concluindo:

“Em uma democracia plena o poder não pode ser garantido por quem empunha armas, mas pelo conjunto da sociedade, por meio de eleições, da participação das entidades representativas da sociedade e dos partidos políticos. Ao instituir as Forças Armadas como garantidoras da lei e da ordem, acaba-se por estabelecê-las como um dos poderes políticos da sociedade.”  

A tutela do poder militar sobre a Nação evidencia-se hoje com a existência de documento produzido pelo Estado Maior do Exército, intitulado Manual de Campanha – Contra-Inteligência, do qual nem o atual ministro da Defesa tinha conhecimento. Segundo a revista Carta Capital, trata-se de um conjunto de normas e orientações que reúne “todas as paranoias de segurança herdadas da Guerra Fria”, a começar pela prática dos generais de “espionar a vida dos cidadãos comuns”. O manual lista “como potenciais inimigos” praticamente “toda a população não fardada do País e os estrangeiros”, incluindo “movimentos sociais, ONGs e os demais órgãos governamentais”, de “cunho ideológico ou não”.  

Da mesma maneira a tutela do poder militar é revelada pelo fato de a Comissão da Verdade, aprovada na Câmara, não passar de uma Comissão “para inglês ver”, ou seja, para dar uma satisfação à opinião pública mundial, expressa através das exigências apresentadas pela Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA. Como diz a deputada Luiza Erundina, “o objetivo expresso do texto do projeto é resgatar a memória para ver a verdade histórica e fazer a reconciliação nacional. Sem tocar em justiça. É incrível, pois todos os países que sofreram ditaduras tiveram comissões da verdade com perspectiva de fazer justiça: Argentina, Uruguai, África do Sul, Alemanha”. Na realidade, o poder militar continua impedindo a apuração dos crimes cometidos pelo Estado durante a ditadura e a punição dos torturadores.  

Como era sempre lembrado por L.C. Prestes, tal situação só poderá ser modificada com a mobilização dos setores populares. É necessário, pois, alertar esses setores para o perigo a que todos continuamos submetidos sob a tutela do poder militar!

* Anita Leocadia Prestes é professora do Programa de Pós-graduação em História Comparada da UFRJ e presidente do Instituto Luiz Carlos Prestes

A chantagem cotidiana

Lúcio Flávio Pinto
Jornalista paraense. Publica o Jornal Pessoal (JP)
Adital
 
Uma turma da limpeza municipal atuava na minha rua quando saí de casa, apressado, no início da noite do dia 21. Um dos trabalhadores, em tom impositivo, me pediu dinheiro. Pela pressão e pelo tom, não dei. Pressenti na hora o que encontraria na minha volta: o lixo foi deixado à porta de casa. E retirado da frente das residências que compareceram à coleta.

É essa a regra da relação do cidadão com prestadores de serviço das mais diversas (e até esdrúxulas) condições. O flanelinha aborda os motoristas deixando implícito que, se não pagarem, seus carros sofrerão as consequências. Alguns deles se preocupam em suavizar a chantagem com um tratamento cordial e a simpatia que torna atraentes até os canalhas (ou principalmente eles). Outros se tornaram tão cínicos que provocam a reação daqueles que ainda não se sujeitaram por completo ao império do medo (sazonalmente conclamado a decidir em ocasiões mais solenes e importantes, como as eleições).

O vendedor varejista dentro de ônibus, com sua liturgia religiosa e seus modos aparentemente humildes, começa sua oração advertindo a todos que poderia estar roubando ou fazendo pior. Prefere, no entanto, tirar do suor do trabalho sua sobrevivência e a dos seus dependentes. É justo esperar desse altruísmo que os passageiros comprem chicletes, balas, bombons, livros de palavras cruzadas e quetais.

Acho necessária a misericórdia e a solidariedade, justamente quando elas se demonstram necessárias. Dou o dinheiro pedido quando o pedinte se me apresenta com uma narrativa coerente e é convincente o tom da sua voz. Podemos nos enganar na nossa avaliação e a tendência é de que nos enganemos cada vez mais diante do aprimoramento desses personagens, multiplicados pelas ruas. O erro faz parte do aprendizado.

O grave se revela quando o pedido de ajuda ou mesmo a cobrança de um adicional pelo serviço prestado tem amparo mais forte – ou na própria força, em crescente evolução para a violência, ou em alguma instituição. O "por fora”, que podia até ser admitido como eventualidade da exceção, se tornou regra. Praticada de cima a baixo na pirâmide desse monstro chamado Estado. Do burocrata-mor, com ou sem mandato, ao lixeiro.

Não podemos nos tornar insensíveis aos variados e multifacetados dramas humanos. Mas, não podemos ser coniventes com o abuso. A omissão, a par da intervenção ativíssima, aduba o terreno do abuso, da impunidade, da violência. A renúncia à cidadania, a uma relação civilizada entre as partes que compõem o todo da vida social gera diferentes camadas de vilanias. Daquela que dói individualmente, como a de ser vítima de lixeiros, sem a mais remota ideia do que seja o servidor público (e sem ter reconhecido o direito ao tratamento que a administração superior lhe devia dar), até àquelas que vão se tornando chagas sociais, num grau tão avançado de deterioração moral que já parecem incuráveis.

O mais remoto vislumbre de esperança, contudo, nos deve estimular a não ceder à ameaça, à chantagem. Parta de quem partir. O lixeiro, sem exemplos dignos a seguir e; no topo, o gestor, que cria condições para que o lixeiro, ao invés de prestar o serviço público devido ao cidadão recolhedor de impostos para pagá-lo, coaja para obter uma fração microscópica do "por fora” que vê circular no topo da estrutura do poder público.

Veja ataca novamente. Ninguém reage!

Por Altamiro Borges

Em meados deste ano, a sociedade britânica descobriu que Rupert Murdoch, o mafioso imperador da mídia, comandava o país. Seu grupo de comunicação não fazia apenas escutas ilegais e distribuía propinas. Ele pautava a política nacional, “nomeava” e derrubava ministros, mandava e desmandava no Reino Unido. Até o primeiro-ministro conservador, David Cameron, foi apontado como seu fiel capacho!

Parece que Roberto Civita, dono do Grupo Abril, sonha em ter o mesmo poder no Brasil. Nos três últimos meses, a revista Veja, o principal veículo da famiglia mafiosa, conseguiu agendar a política interna. Ela produz escândalos e logo é seguida pelas TVs e jornalões, que amplificam suas denúncias. Embalada, ela até se jacta de ter derrubado ministros e de acuar a presidenta Dilma Rousseff!

Jagunços midiáticos e denuncismo fascista

Nesta ofensiva frenética, Veja não vacila em usar os métodos mais criminosos, que causariam inveja ao próprio Murdoch. Os seus colunistas mais se parecem com jagunços midiáticos, que caluniam a sangue frio – sem medo de processos ou cadeia. Suas capas e reportagens são carregadas de denúncias vazias, num processo tipicamente fascista de escandalização da política.

Um de seus “repórteres”, um fedelho ambicioso, tentou invadir o apartamento do ex-ministro José Dirceu num hotel de Brasília. Depois de uma capa mercenária sobre um remédio, que rendeu protestos formais da Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa), a Veja usou como fonte de suas calúnias um policial acusado e preso por corrupção para derrubar o ministro Orlando Silva.

Carlos Lupi, a próxima vítima

Agora, a revista promove o linchamento do ministro Carlos Lupi. Mira no presidente licenciado do PDT com o nítido objetivo de atingir a base de apoio da presidenta Dilma. Ela seria a maior culpada pela “corrupção sistêmica”, como esbraveja o “ético” FHC, o queridinho da famiglia Civita. Só os ingênuos e os míopes pela disputa política amesquinhada não enxergam a tramóia da Veja.

O objetivo não é corrigir as distorções denunciadas nos milhares de convênios firmados pelo Ministério do Trabalho. Durante o reinado de FHC, por exemplo, vários casos de desvio dos recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) foram apontados pelo próprio movimento sindical, sem que a mídia demotucana tenha feito qualquer escarcéu. Nada foi apurado, para a alegria dos demotucanos!

Chega de chorar o leite derramado!

O triste nesta história toda é que a Veja está ganhando! Ela denuncia, mesmo sem apresentar provas concretas, o governo cede e a esquerda política e social chora o leite derramado. A cada queda de ministro – e Carlos Lupi parece ser a próxima vítima – fica a sensação de que o governo Dilma é o mais corrupto da história do Brasil e de que a revista Veja é o baluarte de ética no país.

A esquerda social/política não consegue se unir para dar uma resposta contundente ao “tribunal de exceção”, fascista, da famiglia Civita. Ela manda e desmanda - “investiga”, julga e fuzila -, a exemplo do mafioso Rupert Murdoch. A cada semana, ela promove o linchamento de um partido ou movimento social. Fragmentado, atordoado e acovardado, ninguém dá resposta. Até quando?

O desafio está lançado

Diante da ofensiva fascistóide da Veja, é urgente dar uma resposta unitária e incisiva. Que tal um “tribunal” para julgar os crimes da revista? Seria interessante analisar as origens alienígenas do Grupo Abril, os subsídios milionários do regime militar à famiglia Civita, os empréstimos do BNDES que duram até hoje, os anúncios publicitários sem licitação dos governos demotucanos, os seus vínculos com grupos racistas da África do Sul e com as corporações financeiras do EUA.

Todos os que sofreram o linchamento midiático da Veja poderiam se pronunciar. Os sem-terra do MST que são demonizados em suas lutas; os sindicalistas que são estigmatizados em suas greves e protestos; os jornalistas que conhecem as manipulações e as negociatas do Grupo Abril; os partidos de esquerda que são alvos de suas calúnias e difamações. O "tribunal" poderia até resultar num protesto de rua diante do bunker da famiglia Civita, em São Paulo, que já serviu de quartel-general de candidatos tucanos.

Chega de ouvir passivamente os ataques desta mafiosa famiglia, fascista e golpistas! A proposta está lançada. Quem topa?