sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Após o 11 de setembro, a guerra era a única opção possível?

Por Noam Chomsky
 
Este é o décimo aniversário das atrocidades horrendas de 11 de setembro de 2011, que, conforme geralmente se diz, mudaram o mundo.
 
Não existe dúvida quanto ao impacto dos ataques. Para falarmos apenas da Ásia Ocidental e Central: o Afeganistão mal está sobrevivendo, o Iraque foi devastado e o Paquistão se aproxima de um desastre que poderá ser catastrófico.

Em 1º de maio de 2011, o suposto mentor intelectual do crime, Osama Bin Laden, foi assassinado no Paquistão. As consequências significativas mais imediatas disso foram presenciadas no Paquistão. Tem se discutido muito a respeito da fúria de Washington devido ao fato de o Paquistão não ter entregado Bin Laden. Mas há menos discussão sobre a fúria dos paquistaneses pelo fato de os Estados Unidos terem invadido o seu território para cometer um assassinato político. O fervor antiamericano já havia se intensificado no Paquistão, e aqueles acontecimentos só fizeram com que esse fervor aumentasse ainda mais.

Um dos principais especialistas no Paquistão, o historiador militar britânico Anatol Lieven, explicou no periódico “ The National Interest”, em fevereiro último, que a guerra no Afeganistão está “desestabilizando e radicalizando o Paquistão, gerando o risco de uma catástrofe geopolítica para os Estados Unidos – e para o mundo – que poderia eclipsar qualquer coisa que pudesse ocorrer no Afeganistão”.

Lieven argumenta que os paquistaneses de todos os níveis sociais manifestam uma simpatia esmagadora pelo Taleban Afegão, não por gostarem do grupo, mas porque “o Taleban é visto como uma força legítima de resistência a uma ocupação estrangeira do país”, da mesma forma que os mujahedeen afegãos eram vistos com simpatia quando resistiram à ocupação russa da década de oitenta.

Esses sentimentos são compartilhados pelos líderes militares paquistaneses, que se ressentem profundamente das pressões exercidas pelos Estados Unidos para que eles se sacrificassem na guerra de Washington contra o Taleban. E um ressentimento ainda maior é provocado pelos ataques terroristas (atos de guerra perpetrados por meio de veículos aéreos não tripulados) dos Estados Unidos dentro do Paquistão, cuja frequência foi drasticamente aumentada pelo presidente Obama; e pela exigência dos Estados Unidos de que o exército paquistanês trave para Washington uma guerra em áreas tribais do Paquistão que tradicionalmente gozavam de bastante autonomia, mesmo durante o reinado britânico.

As forças armadas são a instituição estável no Paquistão, e são elas que mantêm o o país coeso. As ações militares dos Estados Unidos poderiam “provocar um motim de setores das forças armadas”, adverte Lieven, e nesse caso “o Estado paquistanês entraria em colapso muito rapidamente, e isso provocaria vários tipos de desastre”.

Os potenciais desastres são drasticamente exponenciados pelo enorme – e que aumenta ainda mais de tamanho rapidamente – arsenal nuclear do Paquistão, e pelo substancial movimento jihadista existente no país.

Esses dois fatores são legados do governo Reagan. Os assessores de Reagan fingiram não saber que Zia ul-Haq, o mais feroz dos ditadores militares do Paquistão, e um favorito de Washington, estava desenvolvendo armamentos nucleares e implementando um programa de islamização radical do Paquistão com financiamento saudita.

A catástrofe que está à espreita nos bastidores é a possibilidade de que esses dois legados venham a se combinar, de maneira que materiais físseis acabem parando nas mãos de jihadistas. Se isso ocorrer, nós poderemos ver bombas nucleares, provavelmente “bombas sujas”, explodindo em Londres e em Nova York.

Lieven resume a situação: “Soldados dos Estados Unidos e do Reino Unido estão de fato morrendo no Afeganistão para tornar o mundo um lugar mais perigoso para os povos norte-americano e britânico”.

Sem dúvida Washington entende que as operações dos Estados Unidos naquilo que foi batizado de “Afpak” - Afeganistão e Paquistão – poderiam desestabilizar e radicalizar o Paquistão.

Os documentos mais significativos do WikiLeaks que foram divulgados até o momento são mensagens diplomáticas sigilosas da embaixadora dos Estados Unidos Anne Patterson em Islamabad, que apoia as ações norte-americanas no Afpak mas adverte que “elas geram o risco de desestabilização do Estado paquistanês, desagradando tanto o governo civil quanto a liderança militar, e provocando uma ampla crise de governança no Paquistão”.

Patterson faz um alerta nos comunicados para a possibilidade de que “um indivíduo que trabalhe nas instalações do governo paquistanês possa retirar gradualmente material físsil suficiente para que seja possível fazer uma arma”, um perigo que é aumentado pela “vulnerabilidade de armamentos em trânsito”.

Vários analistas observaram que Bin Laden alcançou alguns grandes sucessos na sua guerra contra os Estados Unidos.

Conforme disse Eric S. Margolis no periódico “The American Conservative”, em maio último, “Bin Laden afirmou repetidamente que a única forma de expulsar os Estados Unidos do mundo árabe seria derrotando os seu sátrapas, arrastando os norte-americanos para guerras pequenas, mas caras, que acabariam levando Washington à falência”.

Ficou evidente que Washington parecia disposto a colaborar com os desejos de Bin Laden imediatamente após os ataques do 11 de setembro.

No seu livro de 2004 “Imperial Hubris” (“Autoconfiança Imperialista Exagerada”), Michael Scheuer, um analista veterano da Agência Central de Inteligência (CIA) que rastreava Osama Bin Laden desde 1996, explica: “Bin Laden foi preciso ao informar aos Estados Unidos dos motivos pelos quais ele estava travando uma guerra contra nós. Ele tem como objetivo alterar drasticamente as políticas dos Estados Unidos e do Ocidente em relação o mundo muçulmano”, e conseguiu atingir grande parte desse objetivo.

Schauer continua: “As forças armadas e as polícias dos Estados Unidos estão completando o processo de radicalização do mundo muçulmano, algo que Osama Bin Laden vinha tentando fazer com um sucesso substancial, mas incompleto, desde o início da década de noventa. Como resultado, eu creio que é possível concluir que os Estados Unidos da América continuam sendo o único aliado indispensável de Bin Laden”. E continuam sendo, mesmo após a morte de Bin Laden.

A sucessão de horrores ao longo dos últimos dez anos conduz à seguinte pergunta: Havia uma alternativa para a resposta do Ocidente aos ataques do 11 de setembro?

O movimento jihadista, grande parte dele altamente crítico em relação a Bin Laden, poderia ter sido fragmentado e enfraquecido após o 11 de setembro, caso o “crime contra a humanidade”, conforme os ataques foram apropriadamente chamados, tivessem sido abordados como um crime, com uma operação internacional para apreender os suspeitos. Isso foi reconhecido na época, mas nenhuma ideia desse tipo foi sequer cogitada em meio à pressa para ir à guerra. Vale a pena acrescentar que Bin Laden foi condenado em grande parte do mundo árabe pelo papel que ele desempenhou nos ataques.

Quando morreu, Bin Laden era há muito considerado uma presença que desaparecia de cena, e que nos meses anteriores fora eclipsada pela Primavera Árabe. A significância dele no mundo árabe foi expressa pela manchete de um artigo do “New York Times” escrito pelo especialista em Oriente Médio Gilles Kepel: “Bin Laden Já Estava Morto “.

Essa manchete poderia ter sido publicada em uma data muito anterior, caso os Estados Unidos não tivessem mobilizado o movimento jihadista com os seus ataques retaliatórios contra o Afeganistão e o Iraque. Dentro do movimento jihadista, Bin Laden era sem dúvida um símbolo venerado, mas ele aparentemente não desempenhava mais nenhum papel importante para a Al Qaeda, essa “rede de redes”, conforme a descrevem os analistas, que realiza operações que são em sua maioria independentes entre si.

Até mesmo os fatos mais óbvios e elementares relativos à década conduzem a sombrias reflexões quando nós levamos em consideração o 11 de setembro e as suas consequências, e o que esses fatos prenunciam para o futuro.

___________
Esse artigo foi adaptado do livro “9-11: Was There an Alternative?” (“11 de Setembro: Havia uma Alternativa?”), a edição de décimo aniversário de “9-11”, de Noam Chomsky, que acaba de ser publicada pela editora Seven Stories Press)

O livro mais recente de Noam Chomsky é ''9-11: Was There an Alternative?”, a edição de décimo aniversário do seu “9-11”, publicada em outubro de 2001, baseado principalmente em entrevistas que Chomsky concedeu a organizações de notícia de todo o mundo nos dias e semanas que se seguiram ao 11 de setembro. Chomsky é professor emérito de linguística e filosofia do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), em Cambridge, no Estado de Massachusetts

Fonte: The New York Times, no UOL

A independência nacional e a luta política

Por Renato Rabelo
 
Pela primeira vez na história do Brasil assistimos hoje, na esplanada dos Ministérios, em Brasilia, um desfile comemorativo da Independência dirigido por uma mulher, a presidenta Dilma Rousseff. Dilma, que foi presa política durante o regime militar que se instalou no país a partir do golpe de 1964, é a comandante suprema das Forças Armadas brasileiras na atualidade.
Como está consagrado em nosso Programa Socialista, “a Independência foi fruto de um processo cumulativo resultante de lutas, que possibilitou a ruptura em 1822. Ao contrário do que proclama a historiografia oficial, não foi uma doação da Metrópole portuguesa, e sim das jornadas populares de Rio de Janeiro, Minas Gerais, São Paulo e Pernambuco, e nos campos de batalha em Bahia, Maranhão e Piauí”. E segue este trecho dedicado ao processo político e econômico de nossa independência mostrando que “o rompimento com a opressão colonial tem raízes nas guerras do século XVII contra os holandeses; na Conjuração Mineira de 1789, que projeta o perfil heróico do alferes Tiradentes; na Conjuração Baiana de 1798.

O processo da Independência do Brasil passa pelo episódio do 7 de Setembro de 1822, mas vem de muito antes e vai até muito depois, com destaque para o 2 de Julho de 1823 da Bahia”. Por fim, o documento programático dos comunistas brasileiros esclarece que “a conquista da autonomia política não significou, porém, a derrota dos setores agromercantis – aliados internos da exploração estrangeira, principalmente a inglesa – que permaneceram à frente da política, da economia e da sociedade.

O projeto autonomista e democrático de José Bonifácio foi deixado de lado e substituído pelo programa dos latifundiários, dos traficantes de escravos e da Casa de Bragança. Isso estimulou heroicas rebeliões de natureza republicana e democrática: a Confederação do Equador no Nordeste; a Cabanagem no Pará; a Balaiada no Maranhão; a Farroupilha no Rio Grande do Sul; a Sabinada na Bahia; a Praieira em Pernambuco, massacradas pelo regime monárquico escravista. Ao final do Império, objetivamente, a unidade nacional estava consolidada e o Brasil detentor de um território continental”.

Entretanto, a independência de um país não deve ser vista apenas como um mero fato histórico. Como fato histórico, ela deve ser lembrada, relembrada e ter em seus heróis referências para tocar adiante a vida de um país. E principalmente um projeto para este país. Temos um compromisso de honrar figuras históricas como José Bonifácio, Getúlio Vargas e outros que em seu tempo e de forma contraditória transformaram em realidade o fato objetivo de nossa independência proclamada em 1822. Como comunistas e brasileiros repudiamos a noção da historiografia das classes dominantes para quem o sete de setembro de 1822 foi um mero arranjo político das elites brasileiras e portuguesas.

A grande questão é tirarmos consequências da história à luz do tempo presente. Um novo pacto de político capaz de abrir caminho para um novo salto civilizacional se faz necessário. Não se trata de uma mera tese acadêmica ou abstração isolada. É uma questão de construção política, de exercício de “ampliação e radicalização”. A grande lição do sete de setembro de 1822 reside exatamente nisso: na necessidade de viabilização de saltos quantitativos e qualitativos, capaz de alçar nosso país a um novo patamar, de proscrever o velho, gestar o novo com caracteres claros de "Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento".

Presidente nacional do Partido Comunista do Brasil (PCdoB)

O pronunciamento, as promessas e as dificuldades de Obama

Presidente anuncia pacote de US$ 300 bi, de difícil aprovação...
 
Barack Obama
O presidente Barack Obama (Partido Democrata) anuncia hoje, em pronunciamento no Congresso, um pacote de US$ 300 bi de estímulo à economia e à criação de empregos nos Estados Unidos. O programa prevê muito investimento em obras públicas, o que lembra um pouco o New Deal do presidente Franklin Delano Roosevelt (também Democrata) nos anos 30 e desonerações de impostos, uma estratégia que já vem sendo adotada há meses aqui pela presidenta Dilma Rousseff.

Resta acompanhar e ver se tem efeito lá, principalmente na questão do emprego. Pesquisa divulgada no início desta semana indica que o desemprego lá atingiu 9,1% ( no Brasil está em pouco mais de 6%, de acordo com os dados do IBGE) e que no mês passado, entre contratações e demissões, os EUA não geraram um único emprego.

Os próprios analistas americanos admitem que o presidente Obama terá dificuldades na aprovação de sua proposta no Congresso, onde perdeu a maioria na Câmara dos Representantes na última eleição e onde o Tea Party - a extrema direita do Partido Republicano - tem cada vez maior influência amplia sua presença.

Além disso, o presidente norte-americano enfrentará a dificuldade adicional da proximidade da campanha presidencial do ano que vem. Ele já anunciou que é candidato à reeleição e fez um 1º giro eleitoral, de ônibus, já há duas semanas pelo interior dos EUA.

Fonte: Blog do Zé

O jornalismo murdochiano

Por Emiliano Josè - CartaCapital
 
Às vezes, num olhar rápido, penso que se desaprendeu de fazer jornalismo, especialmente quando olho para a revista Veja. Podíamos fazer uma extensa lista de matérias cheias de condicionais, de especulações, de mentiras, invencionices, muito distantes dos fatos. Matérias pautadas previamente para ser confirmadas, nada para ser verdadeiramente apurado. Mas, esse olhar rápido engana-se. Não se pode dizer que o que Veja faz seja jornalismo. Pelo menos aquele que a boa tradição manda – fidelidade aos fatos, apuração séria dos acontecimentos, cuidado com a diversidade das fontes, não noticiar nada que não esteja devidamente cercado, confirmado.

Aprendi tudo isso na escola, dei aulas dizendo isso, pratiquei sempre isso no jornalismo diário como repórter, pauteiro, editor, chefe de reportagem. Leio Mino Carta, que repete sempre a importância dos fatos como base do jornalismo minimamente honesto. Penso em Cláudio Abramo, a ética do marceneiro. Que se tome posição, não há problema. Mas que se respeite os fatos.

Veja é, tenho insistido, uma usina de ideias da extrema-direita latino-americana, e é claro que não tem vergonha disso. E reitero o que tenho dito: não haveria problemas se ela esposasse suas doutrinas direitistas, desde que deixasse claro editorialmente que essa é a linha dela e que tivesse o mínimo de critério jornalístico na produção de seu material semanal. Não diz que é de extrema-direita, como é óbvio, e não tem qualquer critério jornalístico, aquele mínimo, na elaboração de seu material – um material permanentemente editorializado, propagandístico, mentiroso, calunioso, ao menos quando o assunto é política. Sua produção é profundamente partidarizada, no pior sentido da palavra, sem quaisquer observâncias técnicas, aquelas mais modernas, nascidas lá pelo final do século XIX. Ela não é capaz sequer de observar seu manual de redação, se é que ainda considera a existência dele.

Não é preciso uma pesquisa cuidadosa para perceber tudo o que estou dizendo. Um sobrevoo ligeiro, apenas utilizando-se da memória, indica uma multidão de matérias sem nenhuma consistência, cheias de poderia, seria, teria, sem o alicerce de fontes confiáveis, cheias de fontes mortas, pessoas mortas, que não podem testemunhar se o que a revista diz é verdade ou não. Ela vai aos cemitérios para tentar emprestar credibilidade ao seu material – parece incrível, mas é verdade, e não fez isso apenas uma vez.

Lembro-me, e pode ser que a memória falhe, de matéria que falava numa fantasiosa ajuda de Cuba ao PT em que usou um morto, e agora, mais recentemente, quando usou Orestes Quércia, que também já havia partido. Parece mentira, mas não é, que uma publicação jornalística valha-se desse  expediente para sustentar suas hipóteses, sua estranha mania de testar hipóteses independentemente do alicerce dos fatos. O jornalismo aqui anda a quilômetros de distância. A quilômetros de distância da revista Veja.

E agora ela extrapolou todos os limites na matéria que enseja a capa com o ex-ministro José Dirceu. Enseja? Não sei. Creio que a capa foi pensada antes, editada. E depois o editor pediu aos repórteres que saíssem para a cena do crime. E não tem exagero em chamar cena do crime. Foram ao hotel onde o ex-ministro se hospeda e cometeram uma série de crimes. Contra as leis do País, como se estivessem acima disso. Como se não tivessem que respeitar o Estado de Direito. Como se pudessem invadir a privacidade das pessoas sem a observância dos direitos constitucionais.

E não se trata aqui, registro, de apenas defender o ex-ministro, que merece a defesa porque ninguém merece ser agredido em seus direitos. Mas, sobretudo, defender os direitos de todos os cidadãos e cidadãs do País, que não podem estar submetidos aos caprichos de foras-da-lei, que se acreditam acima de tudo e de todos, tal que qual um Murdoch tupiniquim.

A matéria, em si, é um espetáculo de mediocridade jornalística, de inobservância daqueles critérios técnicos mínimos que a profissão reclama, cheia de especulações, sem a base factual indispensável, plena de pré-julgamentos, recheada de ilações que são feitas a partir das posições da revista e, como sempre, cheia de mentiras. Imaginar José Dirceu conspirando contra a presidenta Dilma só cabe na cabeça da revista Veja.
Os crimes vão da tentativa de invasão do quarto do ex-ministro e dirigente do PT até a instalação de câmeras para filmar os que entravam e saíam em visitas a José Dirceu. Curioso é a revista dizer que o José Dirceu vive num apartamento, que ela chama de bunker, que só sobe quem é autorizado. Ué, e onde é diferente? Será que as casas dos distintos editores e repórteres de Veja estão permanentemente abertas ao público, a quem quer que seja? Ou no mínimo, as pessoas têm que ser anunciadas? Não há a premissa legal de inviolabilidade de domicílio? Para a revista Veja, parece que não. Chega a parecer brincadeira, e não é. É coisa séria, própria do banditismo jornalístico à Murdoch, praticado por Veja. Não, a sociedade brasileira não pode cruzar os braços. Os jornalistas sérios não podem ficar indiferentes a isso. Os que prezam a democracia não podem aceitar esse tipo de prática. Isso pode ser tudo, menos jornalismo.

A atitude criminosa, ilegal de Veja foi tão escandalosa que acabou sendo, para ela, um tiro no pé. Tentava, com o panfleto mal costurado que produziu, provocar a quase sempre natural repercussão nos demais veículos, inclusive televisivos. Não houve quase nenhuma. Os demais órgãos de imprensa certamente ficaram temerosos, reticentes de se envolver em matéria tão criminosa e tão sem sustentação. A revista Veja, na tentativa de influenciar, quem sabe, no próximo, e nem sei se tão próximo, julgamento do processo em que o ex-ministro está incluído, resolveu escrever a arenga. Julgou-se esperta demais, apressou-se, e na linha de que os meios justificam os fins.

O povo costuma dizer que esperteza quando é demais vira bicho e come o dono. Tal e qual ocorreu com Veja, neste caso. Resta que não nos calemos, que não aceitemos esse tipo de prática, que repudiemos o crime, que lutemos por um jornalismo ético, fundado nos fatos. A história não se repete. Numa circunstância histórica, é tragédia: Murdoch. Noutra, farsa: Veja.
 

Força-tarefa investiga fraudes em 1,6 mil cidades

Ação conjunta do Ministério Público Federal e da CGU investiga fraudes em 1,6 mil cidades. Nos últimos seis meses, 253 administrações foram processadas por desvio de dinheiro público

Uma força-tarefa do Ministério Público Federal vem provocando uma enxurrada de processos contra prefeitos por suspeita de desvio de verba pública. Nos últimos seis meses, são 253 ações contra as autoridades municipais de todas as cinco regiões do país.

Procuradores vasculham ainda as prestações de contas de mais de 1,6 mil cidades, a maior parte considerada irregular pela Controladoria-Geral da União (CGU). O número de processos abertos é visto como uma vitória pelos investigadores, uma vez que há casos em que os convênios com a União foram assinados há 10 anos.

A investigação começou como um teste feito pelo Ministério Público para dar andamento à apuração de fraudes em municípios fiscalizados pela CGU.

“Como era uma fase experimental, escolhemos apenas os convênios firmados na áreas de saúde, educação e transportes e somente de prestações de contas”, comenta a procuradora regional da República em São Paulo Janice Ascari, que coordena o grupo de trabalho.

Os 253 processos abertos são correspondentes a casos analisados pela CGU entre 2008 e 2011 – entre as prefeituras mineiras processadas estão as de Botumirim, Carneirinho, Icaraí de Minas, Montes Claros, Periquito e Conceição dos Ouros.

“A outra fase será investigar outros ministérios e ampliar o foco também nas prestações de contas rejeitadas, insuficientes e em torno dos relatórios especiais de fiscalização”, acrescenta.

A intenção do grupo de trabalho é evitar que os 1.641 casos de irregularidades analisados pela CGU fiquem sem punição, por causa da demora do processo. “O prazo da prescrição é curto e nunca conseguimos responsabilizar as pessoas”, explica Janice. “As fraudes eram descobertas muito tempo depois de ter ocorrido”, observa a procuradora, ressaltando que um dos problemas eram as fiscalizações ineficientes por falta de investimentos.

Além disso, os processos estão acumulando na Justiça por causa do número de irregularidades que surgem a cada dia. No Tocantins, por exemplo, só no ano passado foram feitas 81 denúncias e instaurados 66 inquéritos da Polícia Federal relacionados a fraudes na aplicação de verbas da União.

Mas há casos em que a punição demora a chegar, como o ocorrido em Santo Antônio do Descoberto (GO). Em 2001, o município firmou um convênio para a aquisição de uma ambulância no valor de R$ 74 mil, mas a licitação acabou fraudada. Desde 2002 o Ministério Público tenta punir os culpados, mas somente em maio deste ano conseguiu denunciar os envolvidas nas irregularidades.

Na época, o procurador da República em Anápolis constatou que o ex-prefeito, o então secretário de Saúde do município e integrantes da comissão de licitação simularam todo o processo que visava comprar o veículo, que seria usado como unidade de terapia intensiva móvel (UTI móvel).

O caso fazia parte do esquema dos sanguessugas, desmontado em 2006 pela Polícia Federal. Passados 10 anos de impunidade, ninguém foi condenado e a ambulância que ainda deveria estar funcionando, virou sucata no depósito da prefeitura.

“Ela chegou aqui funcionando, mas está parada há seis anos, que é o tempo em que trabalho aqui”, comenta Marcos Paulo Machado da Silva, responsável pelo local. A cidade hoje conta com duas unidades para atender os pacientes, mas ambas não estão em boas condições de uso, segundo constatou a reportagem, durante a visita feita ao hospital na última terça-feira.

Programas sociais

O presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), Paulo Ziulkoski, ressalta que a maior parte dos desvios ocorrem em convênios ligados aos 393 programas sociais da União. Ele explica que no repasse direto de recursos de fundos institucionais dificilmente ocorrem irregularidades.

“Quando a verba recolhida (em forma de impostos) volta, você não vê denúncias de fraudes”, observa Ziulkoski, ressaltando que o problema em relação aos outros tipos de liberação de verbas é por causa do modo em que isso é feito. “Falta estrutura pública, já que a que está aí não foi modernizada”, diz o presidente da CNM, se referindo à forma de arrecadação existente no Brasil, que é centralizada no governo federal.

Como ficou? - Máfia dos Sanguessugas

O primeiro condenado

O vice-prefeito de São José da Varginha, na Grande Belo Horizonte, Edir Raimundo Nogueira (PSDB), foi o primeiro acusado de envolvimento no escândalo nacional conhecido como máfia dos sanguessugas a ser condenado pela Justiça.

A sentença, que diz respeito ao período em que Edir governou a cidade, de 2001 a 2004, saiu no mês passado. O vice-prefeito terá que pagar multa e teve os direitos políticos suspensos por três anos. Cabe recurso.

A decisão prevê ainda que Edir perca qualquer cargo público que esteja ocupando quando não houver mais instâncias a recorrer. A denúncia foi feita pelo Ministério Público. O empresário Aristóteles Gomes Leal Neto, dono da Lealmaq, de Contagem, também foi condenado.

Fonte: Estado de Minas

Projeto permite prorrogação da licença-paternidade por 30 dias

Segundo a autora, a proposta vai permitir que o pai tenha acesso à remuneração integral referente aos 30 dias da ampliação da licença-paternidade para que ele possa contribuir diretamente na criação e no desenvolvimento de seu filho...

Projeto permite prorrogação da licença-paternidade por 30 dias
A Câmara analisa o Projeto de Lei 901/11, da deputada Erika Kokay (PT-DF), que altera o Programa Empresa Cidadã (Lei 11.770/08) para facultar ao pai, desde que trabalhe em empresa participante do programa, requerer a prorrogação da licença-paternidade por 30 dias.

Segundo a autora, a proposta vai permitir que o pai tenha acesso à remuneração integral referente aos 30 dias da ampliação da licença-paternidade para que ele possa contribuir diretamente na criação e no desenvolvimento de seu filho. Atualmente, pela Constituição Federal, os pais dispõem de apenas cinco dias sem trabalhar, cumpridos imediatamente após o nascimento da criança.

Conforme o texto, a ampliação poderá ser concedida no prazo de até seis meses, a contar do dia do nascimento do bebê, desde que o empregado a requeira até o final do primeiro mês após o parto. Passados os 180 dias, o pai não poderá mais exercer o direito.

Pais ajudando mães

“A medida permitirá aos pais dar continuidade aos cuidados necessários ao bem estar do bebê, incluindo o aleitamento materno com o uso de mamadeiras, no período imediatamente após o término da licença-maternidade da mãe, quando essa não tiver direto à extensão do benefício por exercer sua função em empresa que não participa do Empresa Cidadã”, argumenta a deputada.

Conforme a proposta, no período de prorrogação da licença o empregado não poderá exercer qualquer atividade remunerada e a criança não poderá ser mantida em creche ou organização similar. No caso de descumprimento do disposto, o empregado perderá o direito à prorrogação.

Isenções

Como medida compensatória, o texto determina que durante o período de prorrogação da licença o empregador pessoa jurídica tributado com base no lucro real poderá deduzir do imposto renda devido, em cada período de apuração, o total da remuneração do empregado pago a título de prorrogação da licença-paternidade.

O projeto prevê ainda que as pessoas jurídicas tributadas com base no regime de lucro presumido e as optantes pelo Simples Nacional que aderirem ao Programa Empresa Cidadã, terão direito a crédito tributário no valor total da remuneração do empregado pago durante a ampliação da licença-paternidade.

Este crédito será utilizado exclusivamente para dedução da parcela de tributos recolhidos a título do Imposto de Renda Pessoa Jurídica e da Cofins. Segundo a autora, as isenções fiscais previstas tem o objetivo de estimular mais empresas a participarem do Programa Empresa Cidadã.

Fonte: Agência Câmara

A aventura dos que lutam contra o terrorismo nos EUA


Mesmo se fosse ficção, a história desses personagens já seria sensacional. Mas se são reais e se dão no epicentro da guerra fria – entre Cuba e os EUA, entre Havana e Miami -, com personagens reais, que têm sua trajetória verdadeira reconstruída com maestria por um dos melhores escritores que temos - só poderia dar um livro extraordinário.

Fernando Morais diz que quer, com suas obras, de Olga a Paulo Coelho, passando por Chatô, entre tantas outras – ajudar a entender o Brasil. Com "A Ilha" nos ajudou a entender a Cuba, com "Os últimos soldados da guerra fria", nos permite entender melhor a América Latina, sua relação com os EUA e, portanto, um dos eixos que articulam o mundo contemporâneo.

O cenário é uma das duas esquinas da guerra fria – a outra era Berlim dividida -, que quase levaram a um enfrentamento bélico entre as duas superpotências. A trama tem a ver diretamente com isso. Daí a intensidade que ganham as situações de tensão, entre países, refletida em personagens concretos, reconstruídos com maestria por Fernando.

Cuba era, literalmente, o “pátio traseiro” dos EUA. Toda a economia cubana dependia da venda da safra de açúcar ao mercado norteamericano. Cuba era o destino principal do turismo norteameriano, que dispunha de uma enorme estrutura de cassinos, cabarés, rinhas de briga de galos, prostíbulos. Nem precisavam passar pela alfândega, saíam diretamente com seus iates da Florida e chegavam aos hotéis de Havana.

Os carros norteamericanos eram primeiro testados em Cuba, antes de serem lancados nos EUA. A primeira linha aérea internacional da Pan American foi para Cuba, cenário típico dos filmes de Hollywood.

A ditadura de Batista, derrubada pelo movimento liderado por Fidel, tinha o apoio total dos EUA. Desde o começo Washington tramou contra a Revolução Cubana. Quando foram realizadas a reforma agrária, a reforma urbana, a nacioanalização da indústria açucareira, os EUA passaram a enfrentar abertamente o novo governo cubano, decretando o bloqueio do país – ha meio século -, tentando uma invasão com mercenários e passando a financiar a oposição a Cuba, localizada basicamente em Miami.

As ações terroristas foram uma constante ao longo das 5 décadas de poder revolucionário, da mesma forma que o trabalho de infiltração por Cuba dos grupos opositores, buscando informações que permitissem evitar essas ações. Os 5 últimos soldados fazem parte dessas escaramuças.

Já sob os duros efeitos do fim da URSS e do planejamento econômico internacional do campo socialista - quando Cuba perdeu todo seu mercado para a produção de açúcar em troca do petróleo -, o turismo ganhou mais destaque na resistência cubana para sobreviver à pior crise que tinha enfrentado desde 1959. As ações terroristas se concentraram então em locais de turismo, tentando passar a ideia do risco dessa atividade em Cuba.

Foi nesse marco que Cuba resolveu montar uma operação que conseguisse penetrar nas organizações que mais diretamente realizavam as ações terroristas, diante da passividade, da conivência, quando não do incentivo e do apoio direto do próprio governo dos EUA. A historia magistralmente relatada por Fernando Morais é a de cinco deles, que foram presos e ate’ hoje cumprem penas nos EUA, por terem tratado de fazer o serviço que os EUA não fazem: o de recolher informações junto aos grupos terroristas no exílio cubano, para tratar de evitar a proliferação de sua ações criminosas.

O livro começa já com a descrição da dramática situação de um cubano sempre identificado com a revolução, que de repente aparece como um “traidor”, que chega a Miami a bordo de um avião da Força Aerea cubana, que ele mesmo tinha pilotado na guerra de Angola. Ninguém da sua família sabia, nem mesmo sua mulher, até ali confidente de tudo, que não podia acreditar que o seu marido e companheiro de vida está falando para uma rádio de Miami, criticando a revolução e justificando sua deserção.

Fernando retoma, fio a fio, a saída de cada um deles, suas inserções no
meio de organizações terroristas cubanas na Florida, o clima dessa colônia, até, finalmente, a prisão de todos e as condições absurdas dos processos que se armam contra eles, como se estivessem espionando instituições norte-americanas e não apenas entidades terroristas da oposição cubana, tarefa que deveria ser feita pelo próprio governo dos EUA.

A mídia brasileira se sente incomodada diante de um livro com esse teor e trata de calar sobre ele. Uma que outra nota apenas não impede que o livro salte para os primeiros lugares nas listas do mais vendidos. Uma leitura obrigatória para entender como os EUA tratam de manter a guerra fria nas suas relações com Cuba, porque até hoje nao conseguiram tragar o fato de que não conseguiram derrubar, por nenhum meio possível, o regime que mais oposição lhe faz, há mais de meio século. Uma leitura deliciosa para qume gosta de livros de aventura, de espionagem, de temas políticos vinculados à ação. E um grande trabalho a favor da libertação dos cinco cubanos que, lutando contra o terrorismo em território noteamericano, foram presos e condenados, enquanto terroristas confessos continuam andando livremente pelas ruas da principal potência imperial da história.

Por Emir Sader

"EUA têm mais inimigos hoje do que tinham em 2001"


Em entrevista à Carta Maior, François Bernard Huyghe, professor de Ciências Políticas e pesquisador no Instituto de Relações Internacionais e Estratégicas (IRIS), analisa os dez anos transcorridos desde os atentados de 11 de setembro de 2001. Autor de vários ensaios sobre o terrorismo, o especialista francês destaca a relação entre mídia e terror, a permanência da ideologia conservadora nos EUA e o erro estratégico que Washington cometeu ao responder ao terror com um terrorismo de Estado.

Uma década depois das imagens das Torres Gêmeas de Nova York caindo como castelos de areia as análises dos especialistas são contrastadas: Bin Laden não ganhou, mas tampouco os Estados Unidos. Em meio a isso, eclodiram as revoluções árabes e estas, em um mesmo movimento, desacreditaram tanto as teses do radicalismo islâmico como a vergonhosa posição dos países ocidentais que apoiaram, em nome de seus interesses, os piores déspotas da história. Professor de Ciências Políticas, pesquisador no Instituto de Relações Internacionais e Estratégicas (IRIS), autor de vários ensaios brilhantes sobre o terrorismo, François Bernard Huyghe analisa nesta entrevista os dez anos transcorridos.

Em seu último livro publicado na França, “Terrorismes, violences et propagande”, François Bernard Huyghe faz uma análise histórica do terrorismo. O autor destaca nesta entrevista o papel dos meios de comunicação, a permanência da ideologia conservadora norteamericana e a forma pela qual, por meio da “guerra ao terror”, a primeira potência mundial recorreu ao terrorismo de Estado ao melhor estilo de Pinochet, no Chile.

Dez anos depois do 11 de setembro fica no ar algo como um balanço nefasto, tanto para os seguidores da Al-Qaeda quanto para os Estados Unidos. As revoltas árabes que estouraram em 2011 são uma poderosa negação das teses da Al Qaeda e, ao mesmo tempo, desmascaram o cinismo ocidental.
A primavera árabe se inscreve em uma lógica oposta às ideias da rede de Bin Laden. Para a Al Qaeda, os muçulmanos tinham só duas opções: submeter-se ao Ocidente ou a ditaduras pró-ocidentais como a de Mubarak no Egito; ou se comprometer com a Jihad, a guerra santa, e combater. Mas nos damos conta de que existia ao menos uma terceira alternativa, a saber, a das revoluções democráticas. Hoje estamos então em uma nova fase na qual a Al Qaeda e a nebulosa jihadista esperam aproveitar-se da primavera árabe segundo um esquema clássico. Contam com que a revolução popular e pacífica gere decepções, que haja desordens e tentativas reacionárias. A partir daí, os elementos mais duros jogarão a carta da radicalização da situação com a ideia de passar daí para a luta armada. Esse é o esquema que se depreende das ideias de Al-Zawahiri.

Por outro lado, Hosni Mubarak no Egito e Ben Ali na Tunísia agitaram o fantasma da Al Qaeda e com isso reprimiram a população ao mesmo tempo em que diziam ao Ocidente: “estamos do seu lado, lutamos contra os islamistas”. Chegamos assim ao assombroso paradoxo de ver os EUA felicitarem-se ante a maravilhosa revolução democrática no Egito quando, na verdade, até apenas alguns meses atrás Washington despejava bilhões de dólares no Egito de Mubarak.

Outro dos grandes paradoxos do 11 de setembro reside em que os atentados serviram mais aos interesses da ideologia neoconservadora norteamericana do que aos interesses do mundo árabe.
Para os neoconservadores dos EUA, os atentados do 11 de setembro foram uma surpresa divina. Os atentados deram aos conservadores o argumento ideológico para justificar os planos que já tinham prontos, como a invasão do Iraque por exemplo. Esse argumento consistia em dizer que os EUA não eram um tigre de papel, que podiam utilizar a força e inclusive impor a democracia pela força no mundo árabe. Eles aproveitaram a ocasião para vivificar o país preconizando valores militares, de disciplina, de ofensiva.

Os neoconservadores se apegaram à locomotiva do 11 de setembro e conseguiram com isso uma influência ideológica incrível. Aproveitaram-se da situação, da personalidade do presidente Bush. Para eles, o 11 de setembro foi um pão abençoado. E creio que, ainda hoje, não estão fora do jogo. Podem voltar nas próximas eleições presidenciais e, contrariamente ao que pensam muitos analistas, os neoconservadores não estão descontentes com Obama. Eles aprovaram a decisão de enviar 20 mil soldados adicionais ao Afeganistão. Para a Al Qaeda, o fato de a primeira potência do mundo, os EUA, ter declarado guerra e apontado a rede como seu principal inimigo foi um tipo de felicidade paradoxal.

De alguma maneira continuamos mergulhados nas duas ideologias, a que Bush colocou em prática como resposta a Bin Laden.
Sim, essa corrente ideológica persiste. Por exemplo, um mês depois do assassinato de Bin Laden, Barack Obama firmou uma enésima doutrina contra o terrorismo na qual o enunciado principal segue sendo “estamos em guerra contra a Al Qaeda”. A obsessão de um segundo 11 de setembro, a prioridade que se deu à ação para eliminar os terroristas e suas redes assim como os regimes que os apoiam não desapareceu. O discurso de Obama, obviamente, é diferente. O presidente diz que é preciso agir respeitando certos valores e Obama não adotou um regime jurídico excepcional como o Patriot Act.

O terrorismo ao estilo Bin Laden também inaugurou uma indústria mundial dos meios de comunicação, uma espécie de frenesi comercial de comentaristas, analistas e canais de televisão que se ocuparam de propagar a legitimidade da chamada “guerra contra o terror”.
Sim, é certo, mas essa é também uma das regras do terrorismo: o terrorismo é também um meio de comunicação. Se os meios de comunicação não existissem, se os meios não afetassem o imaginário das pessoas, o terrorismo não existiria. O atentado contra as torres gêmeas foi o acontecimento mais filmado da história da humanidade. O terrorismo vive graças ao impacto que tem nos meios de comunicação. Antes, nos anos 70, os terroristas eram obrigados a ser apoiar nos meios de comunicação inimigos, nos meios do capitalismo digamos, para que suas ações fossem difundidas. O que mudou hoje é a aparição da internet. Hoje há redes sociais islâmicas, portais islâmicos, revistas virtuais islâmicas e produtoras islâmicas. Os terroristas têm também seus próprios meios de comunicação.

De um 11 de setembro a outro, o do golpe de estado de Pinochet no Chile e o dos atentados de 2001, encontramos uma constante: o Estado chileno recuperado por Pinochet levou a cabo no Chile uma repressão semelhante a que Bush implementou em escala mundial na chamada guerra contra o terror. As violações de direitos humanos que vimos no Chile, Argentina, Uruguai e Brasil se reencarnaram mais tarde nas práticas da primeira potência mundial.
É certo que como resposta às guerrilhas houve um terrorismo de Estado na América do Sul. Trata-se de uma lógica clássica na qual grupos minoritários obrigam o inimigo a mostrar seu verdadeiro rosto, desmascarando-o para mostrar que é sanguinário. Quando os Estados se veem confrontados ao terrorismo, aplicam suas próprias leis, adotam medidas, proclamam um estado de exceção e, assim, entram em uma fase repressiva que, às vezes, os leva a eliminar poucos adversários e a ter mais inimigos do que antes.

Os Estados se vêm tentados a recorrer a práticas condenáveis: prisões secretas, torturas, repressão, interrogatórios. Todos os Estados caem na tentação de responder à provocação terrorista com um terrorismo de Estado. É isso o que vemos com a reação dos EUA depois dos atentados de 11 de setembro: imagens de guerra terríveis, a prisão de Guantánamo e todo o dispositivo que foi posto em marcha com o Patriot Act. Com esse esquema, os EUA fizeram mais inimigos do que os que tinham no dia 10 de setembro à tarde. É um erro enorme do ponto de vista estratégico.

Tradução: Katarina Peixoto

11 depois de 10

Ao atingir os símbolos do poder, atingiram o coração do povo americano. Ruiu o mito da segurança absoluta, do super homem, da nação indestrutível

Roberto Malvezzi (Gogó)* - Brasil de Fato

O que sobrou do 11 de Setembro dez anos depois?

O mundo ficou pior, sem dúvida. Quem pagou particularmente a ousadia do terror foram iraquianos e afegãos. O ataque deu o pretexto explícito – não o único possível – para que os americanos e seus aliados fossem ao Oriente Médio para garantir o petróleo. As mortes civis somente no Iraque são calculadas em até um milhão de pessoas.

Mas, se o objetivo do terror era pôr o império abaixo, então vamos precisar de mais tempo para que a história faça seu veredicto final.

O fato concreto é que aqueles aviões americanos, lotados de civis americanos, em território americano, habilmente pilotados pelo terror, atingiram em cheio seus objetivos. Derrubaram as torres gêmeas, o Pentágono e somente o último, que se dirigia a Casa Branca, foi abatido antes de chegar ao seu destino. A morte de milhares de inocentes é a prova dos nove que o terror é tão cruel quanto a crueldade que deseja combater.

Ao atingir os símbolos do poder, atingiram o coração do povo americano. Ruiu o mito da segurança absoluta, do super homem, da nação indestrutível. Dessa forma, o terror se alojou na alma americana, embora poucos considerem que a repetição de algo semelhante seja provável.

A eliminação de Bin Laden dez anos depois foi vitória de Pirro. A destruição da auto-imagem dos americanos, a quantidade de mortes no Iraque e Afeganistão, é um preço absolutamente desigual se comparado com a morte do provável mentor e articulador do ataque.

Poucos dias depois da morte de Bin Laden, a inteligência do terror armou uma cilada para seus assassinos. Pasmem, cerca de 22 Seals – a elite da elite da tropa – foram apanhados em um único helicóptero no Afeganistão quando julgavam que abateriam grande parte das lideranças da Al Qaeda. Mais uma vez a inteligência americana foi humilhada.

Ainda mais, há analistas que atribuem às guerras subseqüentes, que consumiram cerca de quatro trilhões de dólares, a causa fundamental dos problemas econômicos dos Estados Unidos.

Outro império se levanta no Oriente e tem os olhos puxados. Porém, nenhum império é melhor que o outro. É só perguntar aos latino americanos o que pensam do imperialismo brasileiro.

*Roberto Malvezzi (Gogó) é assessor da Comissão Pastoral da Terra.

Os dilemas da política econômica do governo Dilma

Editorial do Brasil de Fato

Na semana passada a imprensa se pautou pela diminuição da taxa de juros Selic, determinada pelo Banco Central, que caiu de 12,5 para 12% ao ano. Essa taxa de juros tem pouca influência no mercado real e apenas determina o valor pago de juros pelo governo sobre os títulos da dívida pública interna, que já estão nas mãos dos capitalistas brasileiros. Segundo levantamento do professor Marcio Pochmann, a maior parte dos títulos estariam nas mãos de apenas 10 mil credores - brasileiros e estrangeiros - que os compram nas corretoras de valores e bancos.

A diminuição da taxa orientada pelo governo federal através da presidenta Dilma foi muito positiva. Quanto menor a taxa, menores serão os gastos do Tesouro em juros transferidos para aqueles poucos credores. Basta lembrar que nos últimos anos o governo tem gasto, em média, R$ 200 bilhões por ano, apenas em juros e amortização dessa dívida. Mesmo assim ela continua crescendo, ultrapassando R$ 1,5 trilhão. Por outro lado, cada meio percentual na taxa de juros representa um gasto anual de 7,5 bilhões de reais.

Mas, à parte da taxa Selic, o governo Dilma tem pela frente enormes desafios relacionados com sua política econômica e que podem se agravar, no caso de aprofundamento da crise capitalista internacional e suas consequências sobre a economia brasileira. Trata-se da necessidade do governo enfrentar a taxa de juros praticada no mercado e a taxa de câmbio.

Taxa de juros

Os bancos estão cobrando do comércio e da indústria uma taxa média de 40% ao ano. No caso de cheque especial e cartão de crédito, a taxa de juros paga pelos consumidores pode chegar a 130% ao ano. Isso é impraticável e inexiste experiência semelhante no mundo.
Do lado dos capitalistas, comerciantes e empresários da indústria que precisam tomar empréstimos e pagar 40% de juros por ano, é uma extorsão vergonhosa dos bancos, pois pela teoria econômica sabemos que para o funcionamento da economia capitalista, as taxas de juros praticadas pelo mercado devem ser sempre inferiores da taxa média de lucro. Ora, um capitalista para poder dividir sua taxa de lucro com o banco e lhe transferir os 40% ao ano, teria que auferir uma taxa média de lucro ao redor de 50 a 60% ao ano, o que é impraticável.

No caso dos consumidores individuais, a ampla maioria dos trabalhadores brasileiros estão endividados com o consumismo que se estabeleceu para compra de automóveis, eletrodomésticos etc. A população está endividada, iludida pela baixa inflação. Mas com essa taxa de juros, logo pode acontecer por aqui o que aconteceu nos Estados Unidos: as pessoas não conseguirão ter renda suficiente para saldar seus compromissos. O governo federal não pode dar uma de avestruz e fazer de conta que isso é problema do mercado. Será necessário intervir para que as taxas de juros praticadas na indústria e comércio sejam drasticamente reduzidas aos padrões internacionais. Caso contrário, estaremos assistindo ao balão crescer. E, algum dia, vai estourar. A situação começa a se tornar tão grave que até a poderosa Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) realiza campanha nacional contra as atuais taxas de juros.

Câmbio

Pela teoria econômica, a taxa de câmbio é a equivalência entre moedas de dois países, e tem o objetivo de medir e equiparar a média dos preços das mercadorias praticadas em determinado país (exemplo Estados Unidos, que usa o dólar) com a média de preços das mercadorias praticadas no Brasil (que usa o real). Então, a equivalência entre essas médias é que vai gerar a taxa de câmbio necessária entre as duas moedas, para que não haja distorções e a conversão entre as moedas não afete o valor real das mercadorias.

Vários analistas e pesquisadores têm revelado que a taxa de câmbio mais próxima da realidade entre essas duas economias - estadunidense e brasileira - deveria ser entre 3 e 3,5 reais por 1 dólar. No entanto, o mercado está pressionando e a taxa praticada nas últimas semanas é ao redor de 1,5 real por dólar. Por que está acontecendo esta distorção? Porque está entrando muito dinheiro na forma de capital especulativo, em moeda dólar, que vai ao mercado transformar-se em real, para então comprarem ações, terras, usinas etc. Essa pressão pela entrada do capital financeiro em dólar pressiona a taxa de câmbio para baixo. E gera essa distorção. A consequência imediata que nossas mercadorias se tornam muito caras em dólar e diminuem as vendas no exterior. Por isso, em 1980 60% de nossa pauta de exportações eram manufaturados. Atualmente, caiu para 18%. Ou seja, há uma perda de competitividade internacional da indústria brasileira, e consequentemente, diminuição da produção e do emprego.

De novo, o governo precisa criar coragem e mexer na taxa de câmbio. Em todas as grandes economias do mundo, as taxas de câmbio de suas moedas em relação ao dólar são administradas pelo governo. Em alguns casos, como na China, o governo criou inclusive uma taxa de câmbio de maior desvalorização da moeda chinesa (1 dólar vale 8 yuans) para baratear as exportações de suas mercadorias. Ou seja, eles praticam uma política contrária da brasileira, e de ofensiva no mercado internacional.

Se o governo brasileiro não atuar e resolver esses dilemas - taxas de juros e de câmbio - as consequências da crise capitalista mundial sobre a economia brasileira, e sobretudo sobre os trabalhadores brasileiros, serão catastróficas.

Trevas nos EUA: Perry vem aí!

Por Rodrigo Vianna, no blog Escrevinhador:

A eleição de Obama – como todos sabem – foi uma reação aos terríveis anos Bush. Reação tênue. No dia mesmo que ele foi eleito, escrevi aqui que a direita nos Estados Unidos tinha sofrido uma derrota política, mas que numericamente seguia fortíssima. Depois da catástrofe dos anos Bush, os republicanos conseguiram mais de 45% dos votos totais em 2008:

“O conservadorismo republicano está mais vivo que nunca. Vai se reagrupar. A direita religiosa, os intervencionistas, os imperialistas, os racistas, a horda de bárbaros que levou Bush ao poder segue firme. Despreza o que o mundo possa pensar, desconfia dos negros, dos latinos, e vai partir pra cima de Obama assim que se passarem os cem dias tradicionais de trégua no início de governo.” (foi o que escrevi em 2008).

Passada a eleição, Obama consumiu capital político para aprovar a reforma de Saúde, e nas outras áreas avançou muito pouco. Na verdade, o aparelho de Estado nos EUA parece dominado por uma sinistra aliança de interesses militares/financeiros/petroleiros (aqui no Brasil, acontece algo parecido – tal o consenso financista que domina o país; só agora, Dilma parece chacoalhar esse consenso, com a estratégia para baixar juros e reduzir o poderio dos rentistas que vivem dos títulos públicos).

No poder, Obama foi acuado pela direita, que cresce sob patrocínio do Tea Party – movimento que no Brasil Serra tentou mimetizar na eleição do ano passado, com o debate sinistro e falso (até porque - sejamos honestos – Serra não é de extrema direita, e nem é um homem religioso) que envolveu aborto e Igrejas de todos os tipos.

No debate da economia, Obama também capitulou: para evitar a moratória e conseguir no Congresso novo teto para a dívida pública, cedeu aos conservadores e evitou aumentar impostos dos mais ricos. A ideologia anti-impostos é dominante no país do Tea Party. Obama – que já foi acusado de “socialista” por aprovar um sistema público de saúde – corria o risco de ser comparado a Lênin ou Trotsky se subisse imposto, ou se aumentasse os gastos do Estado (como fez Lula diante da crise).

Parece piada. Mas a situação é dramática. Com a economia patinando, Obama corre riscos de perder a reeleição para um republicano. Que tipo de republicano? Vejam bem a situação: o homem que hoje lidera a corrida no partido adversário de Obama é um tal de Rick Perry. Ele é governador do Texas – Estado que legou ao mundo o inefável Bush Jr.

Perry aos poucos vai desbancando o até agora favorito Mitt Romney – considerado muito “moderado”. Romney é mórmon, religioso, mas não é suficientemente direitista para o gosto atual dos republicanos. E sabem por que? Porque aprovou, quando foi governador de Massachusetts, uma reforma no sistema de saúde semelhante à reforma de Obama. Ou seja: Romney é suspeito de “socialismo”.

Por isso, cresce o favoritismo de Perry. O governador do Texas é adepto de teses estranhas… No começo do ano, pediu “vigília religiosa” para que voltasse a chover no Estado. Poderia ter contratado o Cacique Cobra Coral aqui no Brasil! Depois, reuniu 30 mil pessoas para uma corrente de orações: “Orem por nossa economia! Orem por nossa economia, nossos negócios, nossos empregos!”

Esse é o homem que pode comandar a maior potência militar do planeta. Ele é visceralmente contra o aborto, contra a união gay. E acha que a economia pode reagir na base da fé. Pra completar, num debate pela TV essa semana, disse que aquecimento global é “bobagem”.

O resultado de tudo isso, eu comentava há pouco com um amigo blogueiro que viveu nos EUA: o mundo ainda terá saudade da época em que a direita norte- americana era comandada por Bush Jr. Ele era cínico, obtuso, parceiro das petroleiras, implantou a doutrina do “ataque preventivo” e ajudou a quebrar o país. Mas, ao que se saiba, nunca disse que era preciso rezar para combater seca e recessão.

Os tempos, ao que parece, não são mais de ”conservadores ilustrados” – como Churchill, De Gaulle… Mas de conservadores fundamentalistas, histriônicos, abobalhados.

Obama é o mal menor a essa altura. Mas a turma que ajudou a elegê-lo está insatisfeita com as hesitações do presidente. Obama não terá o povo na rua para a reeleição. A esperança dos democratas é que o perfil extremado dos republicanos espante o eleitor centrista, que não quer o país entregue nas mãos de loucos religiosos.

Mas isso tudo é teoria. Porque no meio do caminho há a pior crise econômica desde o crash de 29. O mundo sabe o que pode resultar dessa mistura de crise econômica, desemprego e orgulho nacional ferido. Esse coquetel, na Alemanha dos anos 30, deu no que sabemos.

Tempos de trevas estão a caminho. Pior: trevas num país que tem força militar para fazer muito estrago pelo mundo. Em nome da fé e da “civilização cristã”.

Tucanos de MG espionam grevistas

Por Altamiro Borges

Aécio Neves está em plena campanha para a eleição presidencial de 2014. José Serra, o defenestrado, que o diga! Mas é bom ficar esperto. Entre os dois tucanos, não se sabe qual é o mais reacionário. Que o digam os professores de Minas Gerais. Em greve há 92 dias, eles sofrem as piores barbaridades do governador Antonio Anastasia, filhote de Aécio.

A intransigência é a marca do governo de Minas Gerais. Além de bloquear qualquer negociação, Anastasia acionou a polícia para espionar os líderes grevistas. Nesta quinta-feira, dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores na Educação (Sind-UTE) denunciaram à Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa que estão sendo monitorados por policiais militares à paisana.

“Tentativa de intimidação”

Segundo Beatriz Alvarenga, coordenadora da entidade, a espionagem policial é uma "tentativa de intimidação dos grevistas”. O caso é gravíssimo e revela o caráter autoritário dos tucanos mineiros. Tanto que o presidente da Comissão de Direitos Humanos, deputado Durval Ângelo (PT), solicitou proteção para os dirigentes do Sind-UTE, temendo qualquer ato de violência.

Esta solicitação ganhou força depois que deputados descobriram que os carros usados no monitoramento da greve são oficiais. As placas aparecem como de consulta restrita. O deputado Rogério Correia, também do PT, conseguiu filmar um dos arapongas nas proximidades da sede do sindicato. Ele fugiu no seu carro Fiat Siena quando foi abordado.

PSDB não cumpre a lei

A repressão tucana à greve dos professores da rede estadual é totalmente descabida. A categoria reivindica o piso salarial nacional, que foi fixado em lei em R$ 1.187 para 40 horas semanais. Após mais de três de paralisação, o governador Anastasia ofereceu na semana passada um mísero salário de R$ 712. Os professores rejeitaram a proposta e decidiram manter a greve.

Em nota pública, o Sind-UTE criticou o governo tucano, “que não cumpre a lei federal e acaba com a carreira dos profissionais em educação”.

Crise e luta de classes no interior das potências capitalistas

Editorial do Vermelho

A Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), que reúne 33 países capitalistas considerados mais desenvolvidos, foi forçada a reavaliar para baixo suas perspectivas para a economia mundial. O pessimismo está associado ao comportamento das economias das potências capitalistas agrupadas no G7 (EUA, Japão, Alemanha, França, Reino Unido, Itália e Canadá), onde crescem os sinais de paralisia e a possibilidade de recaída na recessão.

A esta altura, os otimistas apostam numa recuperação mais lenta. A ideia de uma forte retomada, que caracteriza as saídas das crises cíclicas convencionais, foi cogitada a partir do segundo semestre de 2009, mas hoje parece definitivamente descartada. Não restam dúvidas de que estamos diante da mais grave crise do capitalismo pelo menos desde a Grande Depressão deflagrada pelo crash da bolsa de Nova York em 1929, que se arrastou pelos anos 1930 e desembocou na 2ª Guerra Mundial.

Mas é fundamental notar a convergência da crise econômica com o processo histórico mais amplo de desenvolvimento desigual das nações, pois embora global (a mais global de todas as épocas) a turbulência não afeta a todos com igual intensidade. É também desigual em suas manifestações concretas e as diferenças, ao contrário do que ocorreu na Grande Depressão, reforçam o sentido geral do desenvolvimento desigual, conferido pela decadência dos Estados Unidos e ascensão da China e pelo deslocamento do poderio econômico do chamado Ocidente para o Oriente e as potências emergentes.

O economista chefe da OCDE, Pier Carlo Padoan, reconhece esta particularidade quando salienta que a tendência à estagnação é visível no G7, que já foi o grupo dos mais ricos (não é mais), ao passo que nos chamados emergentes a tendência é oposta (de crescimento intenso), sendo ofuscada, porém, pelos impactos da crise mundial.

De acordo com a “Avaliação econômica” da OCDE, divulgada quinta-feira (8), as taxas de investimentos nas potências capitalistas estão abaixo das médias históricas. Daí a paralisia. Estima-se para o G7, com a exceção do Japão, um crescimento médio inferior a 1% no segundo semestre de 2011. Em contrapartida, a China deve encerrar o ano com uma expansão superior a 9%, a Índia em torno de 8%, Brasil e Rússia entre 3,5% a 4%.

Não é demais recordar que a atual crise começou com a recessão nos EUA, iniciada no final de 2007. Os governos capitalistas reagiram com uma intervenção inédita sobre as economias de mercado. O recurso à mão forte do Estado foi interpretado apressada e erroneamente como o fim do neoliberalismo.

Governos e bancos centrais derramaram trilhões de dólares e euros na economia mundial, buscando em primeiro lugar o resgate do sistema financeiro, numa ação desesperada que se revelou impotente diante da crise. E o que é pior: os limites dos déficits e dívidas públicas explodiram e as potências capitalistas, bem como algumas nações mais débeis e dependentes (como Grécia e Portugal, entre outros), estão hoje às voltas com alarmantes crises fiscais.

Sob a pressão das dívidas e da concorrência asiática, os governos europeus, a soldo do capital, ressuscitaram as receitas neoliberais e velhos fantasmas de Bretton Woods (como o FMI) para empreender uma ofensiva contra a classe trabalhadora provavelmente sem paralelo histórico. Cortam empregos, cortam salários, cortam direitos, a pretexto de exorcizar desequilíbrios e alcançar a estabilidade fiscal, mas com o real propósito de salvaguardar os lucros escandalosos e indecentes dos bancos, cortar custos trabalhistas e aumentar a competitividade de suas empresas num ambiente de mercados deprimidos e acirrada concorrência internacional.

A crise, desde suas remotas origens (no final dos anos 1970), está diretamente associada à luta de classes, conforme notou o economista Gonzaga Belluzzo em recente debate na sede nacional do PCdoB. Não se deve esperar uma solução progressista para os infortúnios que acompanham os impasses do capitalismo por parte dos Estados burgueses. Esta só poderá provir da luta de classes e, nesta, pelas mãos da classe trabalhadora. A saída da oligarquia financeira, conforme se vê, significa mais crise para os povos e nações e ameaças crescentes de protecionismo e guerra.

No curso deste processo crítico, subordinado à lei do desenvolvimento desigual das nações, vai se firmando igualmente a necessidade objetiva de uma nova ordem internacional, incluindo novas instituições e uma nova moeda. Diante da crise do capital, é preciso que se diga em alto e bom som que a solução passa por mais valorização do trabalho, fortalecimento do mercado interno e novos projetos de desenvolvimento que apontem na direção de um sistema social mais avançado: o socialismo é a solução definitiva para as crises.

Financiamento público vai baratear as campanhas, garante Fontana

O deputado Henrique Fontana (PT-RS) acredita que o momento político atual é favorável a que se aprove a Reforma Política. Ele é o relator do projeto da reforma na Comissão Especial da Câmara e propõe entre outras mudanças o financiamento público de campanha e o sistema misto proporcional para as eleições em todos os níveis.


O deputado já concluiu o seu relatório, que no momento está aberto para receber sugestões dos parlamentares e dos mais diversos setores da sociedade. A votação do relatório na Comissão Especial está marcada para o próximo dia 21. Em entrevista, ele garantiu que o gasto do contribuinte com as eleições vai diminuir com o financiamento público.

O tema da reforma política é debatido há muitos anos no Congresso. Por que o senhor acredita que ela vai andar dessa vez?Henrique Fontana: Sempre que falamos no assunto, há uma maioria bastante ampla da sociedade que deseja a reforma política. Ela quer porque sente que o sistema atual não é um bom sistema e que há sinais de exaustão claros. Sinto que existe maioria na Câmara a favor do financiamento público e o grande passo que estamos tentando dar agora é permitir que essa maioria se manifeste por meio do voto aprovando a reforma.

Quais são os principais problemas do atual sistema político do Brasil?
HF: Quando analiso a política brasileira hoje, quais sãos aos principais problemas que detecto? O primeiro deles é a força descomunal que tem o poder econômico para decidir o rumo que o país tomará. Segundo, uma política em que os partidos, programa, projetos, estão cada vez mais fracos e que as personalidades tomam conta da política.

E como resolver esses problemas?
HF: Os dois alicerces de mudanças que proponho: uma nova forma para votar, de escolher o parlamento e uma nova forma de financiar a política. Tenho a ideia de que a política é cada vez mais marcada pela potência econômica das candidaturas que vão substituindo o programa, projeto, a história de vida dos candidatos por uma eleição mais baseada na força do dinheiro. Ou seja, quem tem mais dinheiro tem mais condições de eleger e quem tem menos dinheiro, independentemente de quais sejam suas ideias e seus compromissos, fica fora de poder exercer um cargo político. Temos, no fundo, uma democracia, que não oferece as mesmas oportunidades a todos e é essencial que um pobre ou um representante de setores empobrecidos chegue a uma prefeitura, um parlamento. Por isso acredito que o financiamento público é a melhor alternativa.

Por que o financiamento público?
HF: Por três ou quatro motivos essenciais. O primeiro porque ele estabelece mais equidade entre os candidatos; segundo: ele oxigena a democracia porque permite que milhares de pessoas, que hoje não são candidatos por medo de não conseguir financiar sua campanha, consigam ser candidatos porque não terão mais o limitador do financiamento; terceiro: porque só é possível imaginar uma melhora se todos aqueles setores que têm interesses a tratar com a gestão pública fiquem de fora do financiamento de campanha. Do meu ponto de vista, perfeito não será. A influência do poder econômico pode eventualmente continuar por outros mecanismos, mas só mudando a forma de financiamento das eleições, o mecanismo tende a fortalecer a democracia. Quando tivermos no processo eleitoral a mesma impessoalidade que deve ter o gestor público no trato dos negócios públicos, vamos tirar dessas campanhas um governo que tenha mais independência, mais impessoalidade e mais legitimidade.

Hoje as campanhas estão cada vez mais caras. Como mostrar para o eleitor, para o contribuinte que é interessante o financiamento público?
HF:  As campanhas passarão a ser mais baratas. Hoje, há uma lógica perversa. Como não há teto, quanto mais um partido ou um candidato arrecadar maior a chance de se eleger. Há uma espécie de incentivo para encarecer as campanhas e agregar um volume enorme de materiais na rua, técnicas de marketing sofisticadíssimas que vão substituindo a análise do programa, história de vida, do projeto. Isso tudo vai sendo substituído pela potência econômica. O financiamento público estabelece um teto de gastos e corta essa perversidade. Hoje, se um candidato coloca 10 mil placas na rua, o outro candidato tem que correr atrás para colocar o mesmo número. É uma perversidade esse sistema, porque tende a um crescimento exponencial dos custos de campanha. Analisando os próximos 10 anos no Brasil, tem gente que diz que uma campanha de deputado federal vai custar mais do que a de um governador no estado de São Paulo há tempos atrás. Se essa escalada continuar assim, daqui a pouco a campanha para deputado federal vai custar R$ 5 milhões.

E quanto vai custar a campanha financiada com recursos públicos?

HF: Muitos setores, para derrubar o financiamento público, dizem que as campanhas são muito caras e, por isso, não poderiam retirar esses recursos do orçamento porque faria falta para um hospital, escola, para as estradas. Costumo responder a essa pergunta de duas formas: primeiro, hoje o povo brasileiro paga campanhas caríssimas sem saber que está pagando. Ou paga pela via legal, em que o financiador embute no preço do seu produto, legalmente, o que vai gastar com campanha. Ou o povo paga pela via da ilegalidade, por meio de um conjunto de mecanismos de superfaturamento, redes de corrupção, tráfico de influência que busca de volta o recurso que foi colocado na campanha com ações de governo que beneficie esse doador no futuro. Já pagamos pelas campanhas e podemos pagar de maneira transparente, sabendo quanto vamos pagar, com muito menos dinheiro e com governantes muito melhores.

Como o financiamento público contribuirá para acabar com as fraudes eleitorais, como o caixa dois de campanha?
HF: Dentre as vantagens, ela vai colocar um candidato fiscalizando o outro. Hoje isso é quase impossível. Com o financiamento público, se vejo que um candidato concorrente está inundando o estado de material de campanha, vou pressupor que algo pode estar errado.

Como vai funcionar o fundo que financiará as campanhas?

HF: Primeiramente, nenhuma empresa ou uma pessoa física poderá fazer doações diretamente para um candidato que defenda os seus interesses, essa linha é cortada definitivamente. Se uma empresa quiser fazer uma doação, o que espero que ocorra muito e que as empresas que doaram em 2010 doem em 2014, ela vai depositar o valor em um fundo que permitirá que se use menos verbas orçamentárias.

Qual será o valor para financiar as campanhas?
HF: No projeto não será estipulado nenhum valor. Quem vai propor o valor absoluto será a Justiça Eleitoral em 2013. Não há essa previsão de propósito porque primeiro vamos discutir qual é o melhor sistema: público ou privado. Porque acredito que não tem meio termo e o povo brasileiro tem que decidir por um dos dois sistemas. O financiamento privado gera mais ou menos corrupção? Respondo, com segurança, que o financiamento privado gera mais corrupção. Seria errado dizer que com o financiamento público não existirá mais corrupção, mas, com certeza, posso dizer que no financiamento privado tem mais corrupção.

A sua proposta beneficia os grandes partidos?
HF: Não. Infelizmente, todos os partidos já enfrentaram problemas ao longo da história recente com o financiamento privado de campanha. Com isso, os partidos se desgastam e a sociedade passa a confiar menos na política. Quanto menos a sociedade confia na política mais fraca é a democracia e isso não é bom para o Brasil. Digo que a nossa proposta não beneficia os grandes partidos. Um partido que está no poder, como o PT, tem mais facilidade de conseguir arrecadar do que o que não está. Estou propondo porque quero uma política melhor e os partidos que se organizem para disputar o tamanho que eles vão ter conforme a vontade do eleitor.

O senhor também propõe mudar o modo do eleitor escolher seus representantes?
HF: Optei pelo sistema proporcional misto porque é um sistema em que o eleitor vai ter o direito a dois votos. A minha frase é de que estamos qualificando e ampliando o direito de voto do eleitor. Além de o eleitor continuar escolhendo o seu deputado, estamos proporcionando que ele escolha um partido, um projeto político e uma lista de candidatos.

Qual é a vantagem do voto proporcional misto?
HF: O eleitor vai poder qualificar o voto. Se tiver um nome na lista que ele ache ruim, ele descarta toda a lista. A vantagem do voto na lista, é que é um voto mais completo. No sistema atual, do voto nominal, o eleitor vota em João, que faz parte de uma mesma chapa de Maria. Maria é uma pessoa que ele não gosta, e o eleitor, indiretamente, está votando em Maria porque ela faz parte de uma mesma chapa. No sistema de lista o partido vai ter que analisar a qualidade de toda a sua lista sob pena de perder o voto todo do eleitor. Porque se colocar alguém que o eleitor não suporta naquela lista, ele poderá descartar a lista inteira.

O eleitor terá que votar duas vezes?
HF: O voto será dado no mesmo dia. O eleitor vai entrar na cabine de votação e ela vai oferecer a primeira pergunta: presidente da República, governador. Já para deputado federal vai haver a pergunta de qual partido ou lista é de sua preferência. Ele vota no número do partido. A seguir, a urna vai oferecer qual deputado da preferência dele. Ele pode votar em qualquer deputado que queira, com toda liberdade, mesmo que eventualmente seja de um partido diferente do que tenha escolhido apoiar na lista. A soma desses dois blocos de voto que vai dar o tamanho proporcional desse partido.

O senhor também propõe o fim das coligações nas eleições proporcionais, para deputados federais, estaduais e vereadores.
HF: Por meio de uma emenda constitucional estamos propondo o fim das coligações nas eleições proporcionais porque hoje existe o voto em lista e o eleitor não sabe. Hoje ele vota em um ambientalista e pode eleger um ruralista porque os dois podem compor a mesma aliança de partidos nos estados. O eleitor está votando com o desejo de reforçar a visão ambiental no parlamento, o candidato dele não se elege, mas o voto ajuda a eleger um ruralista. O eleitor vota em um evangélico e elege um ateu. A vontade do eleitor é fraudada com esse tipo de eleição que existe hoje.

Como o senhor pretende estimular a participação popular com a sua proposta?
HF: Queremos ampliar as iniciativas populares, a exemplo do que foi o Ficha Limpa. Na nossa proposta, com 500 mil apoios a sociedade vai poder colocar um projeto de lei em tramitação no Congresso Nacional e com 1,5 milhão de assinaturas vai poder propor uma emenda constitucional, o que hoje é proibido. Hoje não há possibilidade de PEC originária de iniciativa popular. Também estamos propondo que as redes sociais possam ser usadas para coletar assinatura para essas propostas. Pode ser fraudado? Pode, mas no sistema de hoje, em que as assinaturas são colhidas na esquina, não se confere a legitimidade das assinaturas. Quando a identificação biométrica estiver implantada ele dará mais confiabilidade ao sistema.

A proposta do Sr. prevê mudanças para a suplência no Senado?
HF: Entendemos que o suplente de senador deve ser alguém que passou pelo crivo do voto popular. Dessa forma, estamos propondo que quando houver a necessidade de um suplente assumir, porque o titular passou a ocupar algum cargo no governo do estado ou no federal, ou ainda, por motivo de saúde, que esse suplente seja o deputado mais votado do partido do senador e do mesmo estado. Ou seja, acaba com a figura do suplente. Em caso de morte, o procedimento será semelhante. Quando um senador falecer, assumirá o deputado do mesmo partido e do mesmo estado e permanecerá no posto até a realização das próximas eleições.

Fonte: Assessoria do Dep. Henrique Fontana