segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Anticapitalismo vesus especulação financeira

Editorial do Vermelho

Nesta semana, trabalhadores, jovens e estudantes em várias cidades europeias e nos EUA ocuparam as ruas para demonstrar que não aceitam governos que querem resolver a crise favorecendo o grande capital e jogando os custos sobre os ombros da população.

Na Grécia e na Itália, as classes dominantes, em conluio com a oligarquia que controla a União Europeia e o Banco Central Europeu, adotaram governos de perfil ainda mais à direita do que aqueles dirigidos por George Papandreou (Grécia) e Silvio Berlusconi (Itália), substituídos por Lucas Papademos e Mário Monti.

Se os novos governantes grego e italiano têm a confiança dos banqueiros e especuladores financeiros, eles enfrentam logo no início de seus mandatos o repúdio dos povos de seus países. Se a situação já era ruim, com eles tem tudo vai ficar pior, pois acentuam o caráter conservador e direitista que já era forte nas situações anteriores e acenam com mais e maiores saques contra os direitos dos trabalhadores e do povo, a renda, o emprego e o salário, além de abdicar da soberania e independência nacional e submeter seus países ao comando europeu que tem, à frente, França e Alemanha.

O rumo tomado pelos acontecimentos na Grécia e Itália é um prenúncio da opção draconiana e conservadora que as classes dominantes europeias adotaram frente à crise econômica que se aprofunda. Opção que o povo não aceita e contra a qual acentua e aprofunda sua resistência.

A população vai às ruas manifestar seu inconformismo. Os protestos crescem na Grécia e Itália e também se multiplicam por outros países. Em Portugal, onde a crise atinge com força os trabalhadores e há uma greve geral marcada para o dia 24 de novembro. A disposição dos trabalhadores, demonstrada nas manifestações que se sucedem (no dia 12, o protesto envolveu 180 mil pessoas em Lisboa), indica a intensidade que ela poderá ter.

Nos EUA, o povo enfrenta a truculência da polícia que investe contra os manifestantes, e aumenta os protestos. Poucos dias depois da polícia de Nova York desalojar violentamente os ocupantes da Praça Zuccotti, as ruas voltaram a ser ocupadas por multidões que não recuaram nem mesmo diante do saldo de 300 presos (entre eles vereadores da Câmara de Nova York e dirigentes sindicais) e dezenas de feridos. Na quinta feria, dia 17, foram mais de 32 mil manifestantes.

De lá, os protestos estenderam-se outra vez pelo país, ocupando as ruas de cidades como Los Angeles, Denver, Las Vegas, Saint Louis, Boston, Washington, Dallas, Portland, São Francisco, Seattle, Detroit, Miami.

A intensidade da crise já leva analistas do próprio mercado financeiro a duvidarem do diagnóstico da crise e do dogma que a trata como uma crise fiscal que as cartilhas neoliberais mandam combater com cortes nos gastos públicos. Contra este ponto de vista, surgem na imprensa especialistas como Richard Koo (banco Nomura), John Feffer (Institute for Policy Studies, de Washington, EUA), ou mesmo o renitente Paul Krugman (prêmio Nobel de Economia de 2008), para os quais os remédios adotados só agravam a crise, que deveria ser combatida por mais investimentos do governo para fomentar o desenvolvimento e o emprego, e não com cortes dos gastos públicos. E reconhecem que as soluções adotadas tornaram a Europa – e os EUA, poderiam acrescentar – em um bom lugar para a especulação financeira.

Não se trata, contudo, de um erro de diagnóstico: banqueiros, especuladores financeiros e as elites que comandam o dinheiro adotam, na crise, soluções para aumentar a concentração da riqueza e reduzir (ou eliminar) direitos sociais dos trabalhadores e do povo. A questão não é técnica nem de talento gerencial, mas política.

Para o povo, os trabalhadores, a juventude, as conclusões destes especialistas não são novidade. A população está do outro lado da barricada da luta de classes e sabe, na pele, a natureza e os efeitos das políticas adotadas para “sanear” economicamente suas nações.

O sentimento claramente anticapitalista das manifestações cresce mundo afora. Se na Grécia as palavras de ordem incluem do tradicional "Fora FMI" a um "Fora União Europeia", que revela o desprezo e a oposição a uma integração europeia que destrói a nação, na Itália a percepção clara do que está em luta aparece na caracterização do mandato de Mário Monti como “governo dos banqueiros”, cujo programa “é extremamente capitalista e mantém a ideia desastrosa de que os pobres é que devem pagar a crise”, como disse um manifestante.

Nas ruas, o povo busca uma saída mais avançada e progressista para a crise, contra os privilégios do capital. É um sentimento promissor que precisa, agora, encontrar uma formulação clara capaz de unir os esforços e a disposição de todos os que lutam para iniciar uma nova etapa civilizatória que supere a barbárie e a ganância capitalista. Os manifestantes estão no rumo certo!

Crônica de um debacle anunciada

Por Emir Sader


Os resultados eleitorais confirmam as piores previsões para o PSOE, que perde mais de 50% da sua bancada parlamentar. Como expressão de que o caráter mais importante do voto foi contra o PSOE e, como consequência, a favor do PP, este conseguiu a maioria absoluta de maneira folgada, mas só aumentou em 20 parlamentares sua bancada. A Izquierda Unida voltou a seu nível anterior às ultimas eleições, passando de 2 a 11 deputados, cortando sua tendência eleitoralmente decrescente.

Desde que Zapatero, depois de resistir, acabou impondo o pacote recessivo, sob forte pressão dos governos da União Europeia e de Obama –que constrangeu publicamente a Zapatero, anunciando à imprensa que o havia pressionado por telefone na noite anterior ao pacotaço - o roteiro da tragédia estava traçado: recessão, desemprego, aumento acelerado do risco espanhol e derrota eleitoral acachapante. Não deu outra.

O PSOE cumpriu à risca o roteiro, cujo teor trágico estava escondido atrás de uma armadilha da unificação europeia. A própria consulta sobre a unificação europeia confessava o seu segredo: perguntava se estavam a favor da moeda única. Era uma unificação antes de tudo monetária e não uma unificação politica, que se dava à reboque daquela. Mais importante que o Parlamento Europeu passou a ser o Banco Central Europeu.

Depois da lua-de-mel da unificação e do lançamento do euro, o processo de unificação teria, na crise iniciada em 2008, sua primeira grande prova de fogo e o resultado não poderia ser pior. Ao invés de surgir como moeda alternativa ao dólar na hora da crise do dólar, o euro reproduziu, de forma ainda mais negativa, os mesmos mecanismos da crise norteamericana. O euro se revelou ser uma armadilha tal, que os países do centro do capitalismo que ainda tem moedas nacionais e portanto podem desenvolver suas políticas monetárias – como os EUA, a Inglaterra, o Japão, a Suécia e os demais países escandinavos – se defendem melhor da crise. Enquanto os países do euro estão aprisionados à moeda única e submetidos aos ditames do Banco Central Europeu, sob a égide da Alemanha.

A Espanha viveu um ciclo expansivo da economia similar ao dos EUA, com um boom imobiliário como locomotiva, com os correspondentes afrouxamentos dos créditos bancários. Com a diferença de que, quando a bolha imobiliária implodiu na Espanha, ela não tinha para onde correr, enquanto os EUA mantem o poder de imprimir a moeda ainda universal para empurrar a crise mais para frente.

Quando a crise de 2008 ja tinha sido desatada, Zapatero continuava a negá-la e resistia à aplicação do pacote de ajuste do Banco Europeu. No ano passado, quando o recessão já era clara na Espanha, o desemprego aumentava, os papéis da Espanha perdiam aceleradamente valor, Zapatero não resistiu mais e decretou, em maio de 2010, seu pacote recessivo.

O resto foi o desenrolar que mecanicamente desembocou na derrota estrepitosa dos socialistas, pelo voto popular de rejeição ao pacote que produziu mais de 22% de desempregados, com 48% de desemprego entre os jovens. Rajoy continuou sendo muito mau avaliado pelos eleitores, assim como o PP, mas nada superava o desprestígio de Zapatero. Que poderia ter convocado as eleições para o primeiro semestre de 2012, mas convocou-a para este mês, ate aqui o pior momento da crise, talvez porque acredite que a situação ainda vai piorar mais.

O resultado não poderia ser pior para o PSOE. O partido entra em um processo profundo de crise. Até porque, como acontece com a social democracia em toda a Europa, um diagnóstico da crise leva à critica da forma que assumiu a unificação, processo de que eles foram os mais entusiastas.

A Espanha entra em um período pior ainda, porque além da crise – até porque Rajoy vai simplesmente obedecer os acordos do pacote recessivo acertado com o Banco Central Europeu, que esta semana voltou a liberar recursos para a Espanha, quando os seus papéis chegaram ao mais índice negativo e está cada vez mais endividada, condenada a uma década de recessão. Estará pior, porque à recessão se somarão outros elementos vinculados ao PP: retomada do processo de privatizações, cortes ainda mais duros do orçamento publico, retrocessos na lei do aborto e no casamento dos homossexuais (estas questões que motivaram o apoio entusiasmado da Igreja espanhola).

Será um período de grandes turbulências sociais, não só dos indignados, mas também dos sindicatos e de outros setores sociais, como as universidades, os movimentos de mulhres, de homossexuais, entre outros. Mas o PP gozará da maioria absoluta para promover retrocessos em todos os planos da sociedade espanhola, incluídos os Tribunais de Justiça, brecando ao mesmo tempo avanços de laicização do Estado espanhol e de ataque aos restos do franquismo – como o Valle de los Caidos, que Zapatero não chegou a mudar.

Como em Portugal e na Grecia, a social democracia aplica um duro ajuste fiscal, perde apoio popular e entrega de volta o governo à direita. Sem que apareça ainda o horizonte de superação da dicotomia direita-social democracia, que tem levado a política europeia ao beco sem saída.

Pensamentos e sonhos sobre o Brasil

O Brasil é a maior nação neolatina do mundo. Uma das marcas do povo brasileiro é sua capacidade de se relacionar com todo mundo, de somar, juntar, sincretizar e sintetizar. Temos tudo para sermos a maior civilização dos trópicos, não imperial, mas solidária com todas as nações, porque incorporou em si representantes de 60 povos que para aqui vieram.


Leonardo Boff - Carta Maior


1. O povo brasileiro se habituou a “enfrentar a vida” e a conseguir tudo “na luta”, quer dizer, superando dificuldades e com muito trabalho. Por que não iria “enfrentar” também o derradeiro desafio de fazer as mudanças necessárias, para criar relações mais igualitárias e acabar com a corrupção?

2. O povo brasileiro ainda não acabou de nascer. O que herdamos foi a Empresa-Brasil com uma elite escravagista e uma massa de destituídos. Mas do seio desta massa, nasceram lideranças e movimentos sociais com consciência e organização. Seu sonho? Reinventar o Brasil. O processo começou a partir de baixo e não há mais como detê-lo.

3. Apesar da pobreza e da marginalização, os pobres sabiamente inventaram caminhos de sobrevivência. Para superar esta anti-realidade, o Estado e os políticos precisam escutar e valorizar o que o povo já sabe e inventou. Só então teremos superado a divisão elites-povo e seremos uma nação una e complexa.

4. O brasileiro tem um compromisso com a esperança. É a última que morre. Por isso,tem a certeza de que Deus escreve direito por linhas tortas. A esperança é o segredo de seu otimismo, que lhe permite relativizar os dramas, dançar seu carnaval, torcer por seu time de futebol e manter acesa a utopia de que a vida é bela e que amanhã pode ser melhor.

5. O medo é inerente à vida porque “viver é perigoso” e sempre comporta riscos. Estes nos obrigam a mudar e reforçam a esperança. O que o povo mais quer, não as elites, é mudar para que a felicidade e o amor não sejam tão difíceis.

6. O oposto ao medo não é a coragem. É a fé de que as coisas podem ser diferentes e que, organizados, podemos avançar. O Brasil mostrou que não é apenas bom no carnaval e no futebol. Mas também bom na agricultura, na arquitetura, na música e na sua inesgotável alegria de viver.

7. O povo brasileiro é religioso e místico. Mais que pensar em Deus, ele sente Deus em seu cotidiano que se revela nas expressões: “graças a Deus”, “Deus lhe pague”, “fique com Deus”. Deus para ele não é um problema, mas a solução de seus problemas. Sente-se amparado por santos e santas e por bons espíritos e orixás que ancoram sua vida no meio do sofrimento.

8. Uma das características da cultura brasileira é a alegria e o sentido de humor, que ajudam aliviar as contradições sociais. Essa alegria nasce da convicção de que a vida vale mais do que qualquer coisa. Por isso deve ser celebrada com festa e diante do fracasso, manter o humor. O efeito é a leveza e o entusiasmo que tantos admiram em nós.

9. Há um casamento que ainda não foi feito no Brasil: entre o saber acadêmico e o saber popular. O saber popular nasce da experiência sofrida, dos mil jeitos de sobreviver com poucos recursos. O saber acadêmico nasce do estudo, bebendo de muitas fontes. Quando esses dois saberes se unirem, seremos invencíveis.

10. O cuidado pertence à essência de toda a vida. Sem o cuidado ela adoece e morre. Com cuidado, é protegida e dura mais. O desafio hoje é entender a política como cuidado do Brasil, de sua gente, da natureza, da educação, da saúde, da justiça. Esse cuidado é a prova de que amamos o nosso pais.

11. Uma das marcas do povo brasileiro é sua capacidade de se relacionar com todo mundo, de somar, juntar, sincretizar e sintetizar. Por isso, ele não é intolerante nem dogmático. Gosta e acolhe bem os estrangeiros. Ora, esses valores são fundamentais para uma globalização de rosto humano. Estamos mostrando que ela é possível e a estamos construindo.

12. O Brasil é a maior nação neolatina do mundo. Temos tudo para sermos também a maior civilização dos trópicos, não imperial, mas solidária com todas as nações, porque incorporou em si representantes de 60 povos que para aqui vieram. Nosso desafio é mostrar que o Brasil pode ser, de fato, um pedaço do paraíso que não se perdeu.

Fatos em foco

A pseudodemocracia brasileira está cada dia mais parecida com os regimes ditatoriais, pelo menos no uso da polícia para a repressão aos movimentos reivindicatórios da sociedade

Hamilton Octavio de Souza - Brasil de fato

Nosso petróleo
A disputa pelo petróleo do pré-sal também divide entidades sindicais do Rio de Janeiro: na semana passada a CUT convocou seus filiados para manifestação organizada pelo governo do estado, em defesa do royaltie estadual. Já o Sindicato dos Petroleiros convocou ato público alternativo para defender que o dinheiro do pré-sal seja usado exclusivamente em benefício do povo brasileiro. Onde deve estar a classe trabalhadora?

Abandono total
Em greve há dois meses, estudantes e professores da Universidade Federal de Rondônia tentam romper o silêncio da mídia regional e denunciar a gravidade da situação vivida pela instituição. A UNIR está com a Reitoria ocupada desde o dia 5 de outubro e sob investigação do Gaeco devido a inúmeras denúncias de corrupção. A crise é tamanha que alguns cursos não abrirão vagas no próximo vestibular por falta de salas e laboratórios.

Vale tudo
Depois que o Tribunal Regional Federal, de Brasília, considerou que o andamento da obra da usina de Belo Monte independe de consulta prévia aos povos indígenas, o Ministério Público Federal decidiu recorrer ao Supremo Tribunal Federal, já que a exigência da consulta está prevista na Constituição do Brasil e na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho. A pressão do governo para suprimir direitos continua forte!

Berço esplêndido
Em carta dirigida a todos os deputados federais, a Associação Juízes para a Democracia (AJD) solicita apoio para a inclusão imediata na pauta de votações da proposta de Emenda Constitucional 349/2001, que prevê a abolição do voto secreto nas sessões da Câmara e do Senado. A carta defende a transparência dos parlamentares como condição fundamental do regime democrático. A PEC tramita desde 2001!

Autoritarismo
A pseudodemocracia brasileira está cada dia mais parecida com os regimes ditatoriais, pelo menos no uso da polícia para a repressão aos movimentos reivindicatórios da sociedade. A tropa de choque tem sido usada para atacar sem-terra, sem-teto, índios, estudantes, trabalhadores e pobres em geral. A prisão de estudantes da USP, na semana passada, com humilhações de todo tipo, lembra cenas de Ibiúna e das violências policiais de 1968 e 1977. Até quando?

Retaliação
Depois que a Unesco – órgão da ONU para a educação, ciência e cultura – aprovou o ingresso da Palestina como membro, o governo dos Estados Unidos suspendeu a sua contribuição anual de 65 milhões de dólares para os programas da instituição. Por isso, a Unesco precisou cortar a ajuda que dá para o desenvolvimento dessas áreas, especialmente nos países pobres. É o exemplo democrático dos Estados Unidos!

Mobilização – 1
A Cáritas Brasileira realizou, de 9 a 12 de novembro, em Passo Fundo (RS), o seu 4º Congresso Nacional, com a participação de mais de 350 agentes de todo o país para debate e definição de prioridades para os próximos quatro anos. A Cáritas atua no Brasil desde 1956 e tem contribuído com inúmeros projetos de desenvolvimento social – particularmente junto às populações mais desprotegidas.

Mobilização – 2
Mais de 1.200 mulheres participaram, de 12 a 14 de novembro, no Centro de Convenções, em Salvador (BA), da 3ª Conferência Estadual de Políticas para Mulheres, durante a qual debateram a autonomia econômica, saúde integral, espaço político, equidade salarial e a violência contra as mulheres. As resoluções do encontro serão encaminhadas para a Conferência Nacional. Espera-se que não sejam engavetadas pelos governos!

Processo cruel
Em depoimento na Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, dia 8, o presidente da Fundação Nacional do Índio, Márcio Meira, afirmou que o órgão está fazendo o possível para proteger o território do Santuário dos Pajés, no Distrito Federal, mas que a especulação imobiliária – estimulada por várias empreiteiras – e a morosidade da Justiça impedem uma ação eficiente. Resumo: não pode fazer nada!

Na sopa de Big Brother

CCS
Centro de Colaborações Solidárias
Adital
Por Carlos Miguélez MonroyPeriodista, coordinador del CCS
ccs@solidarios.org.esTwitter: @cmiguelez
Tradução: ADITAL


O Congresso dos Estados Unidos debate a aprovação de um Projeto de Lei que permitiria ao governo obrigar aos provedores de serviços de Internet a bloquear páginas web que pudessem violar direitos de autor. O Stop Online Piracy Act (Sopa) facultaria às empresas privadas a incluir em umas listas sujas páginas de internet "suspeitas” ou que sejam "ofensivas”. A lei também permitiria aos bancos congelar transferências bancárias às contas dos donos dessas páginas.


A plataforma Avaaz lançou uma campanha internacional de assinaturas de petições para pressionar ao Congresso e, dessa maneira, impedir que seja aprovada uma lei que afetaria conteúdos de Internet de todo o mundo. Argumentam que o Projeto de Lei "para desestimular a pirataria” vai longe demais. Cede à empresa privada o poder de desativar domínios e páginas de Internet com seus próprios critérios, sem supervisão prévia do governo e sem garantias para os donos dessas páginas, nem possibilidade de exigir medidas cautelares. Essa lei acabaria com o princípio de presunção de inocência, que caracteriza aos Estados de direito e com uma necessária segurança jurídica para os cidadãos.


Pela violência com que o governo reagiu contra Occupy Wall Street, a plataforma Avaaz suspeita que os movimentos cidadãos estão na mira. A lei permitiria cortar os canais de informação e de mobilização desses grupos, que estendem suas mensagens por meio de Youtube, CE contas no Twitter, no Facebook e de outras redes sociais. Em questão de segundos, o governo poderia ordenar o bloqueio de conteúdos "inadequados”.


Antes, os Estados Unidos condenava a falta de acesso à Internet na China. A comparação com um regime "comunista” tem ajudado a que os cidadãos estadunidenses aceitem a premissa de que seu governo garante seu direito á privacidade e à liberdade de expressão. Porém, dez anos depois do 11 de setembro, começam a questionar as faculdades que o governo tem atribuído a si mesmo em nome da segurança, com a desculpa de proteger as mesmas liberdades que começa a atacar.


No momento de sua aprovação, a Ata Patriótica (Patriot Act) foi objeto de polêmica e de debate público. Porém, muitos meios de comunicação ficam por aí. Apesar de que significa um retrocesso em matéria de liberdades individuais, essa lei não dá carta branca para a espionagem de cidadãos estadunidenses e estrangeiros ao requerer a autorização prévia de um juiz. Não é como um programa secreto da National Security Agency (NSA), aprovado por George W. Bush e silenciado por juízes e políticos em um ambiente de ‘estás conosco ou contra nós'. Assim denunciou o jornalista de The New York Times, James Risen, em seu livro Estado de Guerra, que lhe deu o Prêmio Pulitzer, na categoria de jornalismo de investigação, em 2006.


Conta Risen que as opiniões secretas de alguns juízes do círculo do ex-presidente Bush justificaram a escuta de chamadas telefônicas e a espionagem de correios eletrônicos de milhões de cidadãos estadunidenses e estrangeiros, suspeitos de "terrorismo”.


Atualmente, calcula-se em 9 bilhões o número de correios eletrônicos que são enviados nos Estados Unidos. As chamadas por telefone celular ascendem a 2 bilhões e as pelo telefone fixo a 1 bilhão. Vários defensores das liberdades de outros países preocupam-se com muitas das linhas físicas de telefone internacionais que passam no território estadunidense, o que permite ao governo investigar cidadãos de outros países.


Caberia perguntar-se quantos dos presos de Guantanamo, Baghram e de outras prisões clandestinas, onde se tortura para obter confissões foram capturados por informações obtidas dessa maneira ante o silêncio cúmplice dos cidadãos que aceitam o atropelo de umas liberdades que o governo diz proteger.


Dizem que a ameaça já não está no Afeganistão, nem no Iraque, enquanto o governo anuncia um aumento de tropas na Austrália que inquieta a China. Porém, a cidadania começa a despertar do pesadelo do terrorismo islâmico para compreender a realidade de outro terrorismo: o da especulação financeira. Reagem, porém querem silenciá-los com leis contrárias aos direitos que conquistaram como país livre.

Obama, Sarkozy e a mentira da mídia

Por Luiz Cláudio Cunha, no Observatório da Imprensa:


O fato mais retumbante da fracassada reunião do G-20, dias 3 e 4/11, em Cannes, não saiu em nenhum comunicado oficial, nem nas entrevistas dos líderes das 20 nações mais ricas deste planeta empobrecido. Num descuido técnico capaz de matar de inveja ao inconfidente Julian Assange, vazou no sistema de som da cúpula um diálogo inacreditável dos presidentes da França, Nicolas Sarkozy, e dos Estados Unidos, Barack Obama, desancando um amigo ausente, o premiê de Israel, Benjamin Netanyahu.Os jornalistas receberam seus equipamentos de tradução simultânea, enquanto aguardavam a chegada de Sarkozy e Obama para a entrevista coletiva.


Os dois presidentes, com aquela sinceridade que só habita documento secreto vazado pelo WikiLeaks, falavam em privado, na sala ao lado, o que nunca diriam em público sobre o primeiro-ministro israelense.“Não posso nem vê-lo. É um mentiroso”, bufou Sarkozy, em francês. “Se você está cansado, imagina eu, que tenho de lidar com ele todos os dias”, ecoou Obama, sob o solitário testemunho do intérprete. Um descuido jogou esta conversa franca no sistema de som que os jornalistas haviam recebido, minutos antes da coletiva iminente.Mais espantoso do que o tom cabeludo do papo presidencial entre dois tradicionais aliados de Israel foi o comportamento cúmplice da grande imprensa, que se mostrou uma aliada ainda mais incondicional de Sarkozy e Obama.


Esta conversa aconteceu numa quinta-feira (3/11), numa sala reservada do suntuoso Palais des Festivals de Cannes, e foi ouvida casualmente por seis jornalistas de grandes órgãos internacionais, que ainda testavam seus fones de ouvido. Um deles era da Associated Press (AP), uma gigantesca agência de notícias que abastece 1.700 jornais e 5.000 rádios e TVs em 120 países. Outro era da Reuters, a maior e mais antiga agência do mundo, com 14 mil funcionários falando 20 idiomas em mais de 200 grandes cidades do mundo. Apesar disso, ninguém ficou sabendo da conversa ouvida por acaso pelos jornalistas simplesmente porque os jornalistas ocultaram a notícia.


Cortesões do poder


Uma das anônimas testemunhas dessa gafe histórica explicou à agência estatal France Presse (3.000 funcionários em 110 países, com notícias em seis idiomas) a razão de seu deliberado mutismo: “Nós fomos avisados para sermos prudentes e proteger as pessoas do Palácio Eliseu, com as quais trabalhamos todos os dias, e acima de tudo sobre a natureza da conversa, que poderia ser explosiva”.


Outro jornalista, mais servidor público do que servidor do público, o israelense Gidon Kutz, de uma rádio oficial de Tel-Aviv, explicou que os repórteres acharam melhor esconder o que ouviram por “uma questão de correção” e por uma inesperada cortesia com os anfitriões: “Eles não quiseram embaraçar o serviço de imprensa do Governo Sarkozy”.


A rede britânica BBC acrescentou outra vergonhosa explicação dos jornalistas que decidiram dissimular a notícia: “A divulgação do diálogo poderia constranger Sarkozy”, disseram, ocultos no anonimato e encharcados de constrangimento por seu mau profissionalismo.


Com esse inusitado pacto de silêncio, a conversa sem censura de Sarkozy e Obama acabou sendo vítima de uma inusitada autocensura dos repórteres que testemunharam a derrapada presidencial mas preferiram ser servis ao poder, em vez de servir ao público a que deveriam informar.


Tudo isso ficou sepultado num obsequioso sigilo durante cinco dias. A conversa vazada da quinta-feira (3) só ganhou as manchetes do mundo na terça-feira (8/11), por obra e graça de um site francês especializado nos bastidores da mídia eletrônica, o Arrêt Sur Images(ASI), algo como “Imagem sob Julgamento”. Os jornalões brasileiros só deram a notícia uma semana depois (quinta, 10/11).


Carne com cenoura


Sustentado apenas pelos assinantes e sem espaço para publicidade, o ASI fez o que o resto da imprensa não conseguiu fazer – reconheceu o conteúdo da conversa vazada como de “utilidade pública” e fez dela um “furo” de repercussão mundial, com esta manchete: “Netanyahu ‘mentiroso’ – a conversação secreta de Obama e Sarkozy”. Até as grandes agências de notícias, que tinham afanado a informação, foram obrigadas a reproduzir a gafe mundo afora para não ampliar o vexame.


Ela ganhou destaque até nos sites dos maiores jornais de Israel, com exceção do diário Israel Hayom, conhecido por sua notória intimidade com o premiê Netanyahu desde que foi lançado, em 2007.O site Arrêt Sur Images é dirigido pelo jornalista Daniel Schneidermann, 53 anos, que escreve semanalmente sobre TV nos jornais Le Monde e Libération. O sucesso de seus comentários o levou a criar em 1995 um programa no canal estatal France 5 com um objetivo claro: “A vocação de Arrêt Sur Images é areflexão crítica sobre as mídias”.


Os jornalistas de TV, incomodados com essa espécie de “observatório televisivo”, apelidaram o programa semanal de Schneidermann de boeuf-carottes (carne com cenoura), gíria francesa para uma repartição pública, a IGS, conhecida como “a polícia das polícias”. Tinha uma audiência média de 7%, o que representava mais de 700 mil telespectadores, mas a fricção interna na rede estatal levou à sua exclusão da grade de programação em setembro de 2007.Dias depois de sair do ar na TV, o Arrêt Sur Images voltou pela internet, com o mesmo nome e ousadia. Até o blog ganhar visibilidade mundial com o “furo” inesperado de Cannes.


A questão que fica sem resposta não é o previsível mal-estar que dominará os futuros encontros entre os líderes dos Estados Unidos, França e Israel, agora desnudados pela conversa nua e crua de Sarkozy e Obama.


A grande, desafiadora pergunta que paira no ar sobrevoa a gafe monumental da grande imprensa mundial surpreendida em flagrante delito: o que levou à deliberada ocultação de uma notícia de evidente interesse público, de forte implicação política, de grave repercussão internacional no contexto das relações diplomáticas?


A ferida e o manto


É inacreditável que experientes profissionais de grandes órgãos e de redes de comunicação de alcance planetário se vejam, de repente, enredados em questões menores, mesquinhas, provincianas.


Não cabe aos jornalistas, em nenhuma circunstância, o delito de esconder deliberadamente uma notícia sob o falso argumento de que ela possa “constranger” o poder ou a autoridade pública.Nada constrange mais do que a autocensura ou o servilismo da imprensa às instâncias do poder, público ou privado.


A imprensa e seus profissionais vivem e dependem da fé pública que deriva de sua eterna vigilância e de sua permanente independência em relação aos governos e aos governantes, em todos os tempos, em todos os lugares.Os repórteres enviados a Cannes não estavam lá a passeio, para aproveitar as delícias da Promenade de la Croisette, a charmosa avenida a beira-mar lambida pelo sereno Mediterrâneo. Diante do inesperado vazamento, não cabia a eles “proteger” os descuidados funcionários do Palácio Eliseu ou evitar embaraços aos presidentes distraídos. Uma das virtudes dos bons jornalistas é justamente embaraçar governantes e expor as falhas de suas administrações.Esconder uma notícia não é “uma questão de correção”. É exatamente o contrário. Quando se estabelece um sistema de cumplicidade e uma prática de quadrilha para fazer o que não é correto e para cometer um ato servil que subverte a função essencial do bom jornalismo, abre-se uma ferida de mau comportamento que exige uma discussão aberta e transparente, sem códigos de silêncio ou conluios de sigilo, todos envergonhados, todos vergonhosos.É surpreendente descobrir que, oculto por trás da grande gafe presidencial de Cannes, havia algo ainda maior, ainda pior: um grave vazamento ético de má conduta da imprensa. A única forma de estancá-lo é abrir, já, um amplo debate sobre este monumental erro coletivo, que abafa até o jornalista mais inocente sob o espesso manto do constrangimento.

Diferenças no mercado de trabalho seguem desfavoráveis a negros

Por Vitor Nuzzi - Rede Brasil atual
São Paulo – Estudo divulgado nesta quinta-feira (17) pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) e pela Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade), de São Paulo, confirmam que prosseguem as diferenças históricas desfavoráveis aos negros no mercado de trabalho. Na região metropolitana de São Paulo, universo da pesquisa, a taxa de desemprego dos negros é maior que a dos não negros (brancos e amarelos) e o rendimento é menor.
A inserção dos trabalhadores negros é proporcionalmente maior na construção civil e no emprego doméstico, setores "em que predominam postos de trabalho com menores exigências de qualificação profissional, menores remunerações e relações de trabalho mais precárias e, por tudo isso, menos valorizados socialmente", dizem os técnicos. Os negros representam um terço da população economicamente ativa. O levantamento foi divulgado em referência ao Dia Nacional da Consciência Negra, que se celebra no próximo domingo (20)."No caso específico da construção civil, a retomada de investimentos na infraestrutura e na construção de novas edificações nos últimos anos, permite identificar aumentos da proporção do assalariamento privado com carteira assinada e dos rendimentos médios que, se mantidos, podem alterar em alguma medida as características dos postos de trabalho desse segmento de atividade", afirma o estudo. Em relação ao trabalho doméstico, Dieese e Seade lembram que o serviço é normalmente feito por "mulheres negras, com idade mais avançada e baixo nível de escolaridade".
De acordo com o levantamento, a taxa média de desemprego dos negros em 2010 foi de 14%, ante 10,9% dos não negros. O Dieese e o Seade informam que essa diferença vem diminuindo nos últimos anos. Do total de ocupados, 7,4% eram trabalhadores domésticos, mas essa proporção sobe para 10,8% entre os negros e cai para 5,7% entre os demais grupos. A proporção de negros também é maior na construção civil (8,8% do total de ocupados negros, ante 5% entre os demais).
No grupo "demais posições", que contempla empregadores, profissionais universitários autônomos e donos de negócios familiares, entre outros, a proporção de não negros é bem maior que a de negros: 9% e 3,9%, respectivamente. "Neste último caso, dispor de riqueza acumulada que permita montar um negócio ou possuir nível superior de escolaridade provavelmente são os fatores que explicam a exclusão de grande parte dos negros. Estão, portanto, muito mais associados à persistência de elementos históricos que explicam a desigualdade presente do que a comportamentos discriminatórios. Explicação semelhante pode ser adotada para a sobrerrepresentação", sustenta o estudo.
Mas os números também mostram alguma redução de diferenças na inserção dos assalariados no mercado. Proporcionalmente, os ocupados negros estavam mais representados em relação aos empregos com carteira (50,9%, ante 50% dos não negros). Já a proporção de assalariados negros sem carteira era de 11,7%, ante 11% dos não negros.
Entre os autônomos, a proporção é próxima (16,5% para negros e 15,9% para não negros). Mas a diferença sobe no serviço público: 8,4% dos ocupados não negros estão no serviços público, ante 6,2% dos ocupados negros. "A explicação para essa diferença possivelmente tem origem no fato de mais da metade dos assalariados públicos possuir grau de escolaridade superior. Essas características, associadas ao fato de que atualmente o ingresso no setor público se dá principalmente por meio de concursos, permitem inferir que a sub-representação de negros nesse setor deve-se muito mais a suas históricas dificuldades de acesso aos níveis mais elevados de ensino do que a eventuais ações discriminatórias de que possam ser vítimas."De acordo com o estudo, o rendimento médio por hora (R$ 8,30, na média geral) era de R$ 9,62 para os não negros e R$ 5,81 para os negros. As diferenças se revelam também no corte por gênero: homens não negros recebiam em média R$ 10,8, ante R$ 6,4 dos negros, enquanto mulheres não negras ganhavam R$ 8,1, ante R$ 5,09 das trabalhadoras negras.
"As razões mais evidentes dessa desigualdade, em que o rendimento médio por hora de negros (R$ 5,81) representa 60,4% do rendimento dos não negros (R$ 9,62), residem nas diferentes estruturas ocupacionais em que esses segmentos estão inseridos", diz o texto. "As maiores desigualdades de rendimentos por raça/cor são verificadas nos setores em que a proporção de não negros supera a de negros e os rendimentos médios são mais elevados." Na indústria, por exemplo, os negros recebem 58,9% dos rendimentos dos não negros. Essa proporção vai a 59% nos serviços, 66,4% no comércio, 70,7% na construção civil e 99,3% no trabalho doméstico.