quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

A Grécia de joelhos

(*) Osvaldo Ventura


Ironicamente, o chamado “berço da democracia”, a Grécia, foi o primeiro país no mundo a sofrer um explícito golpe de estado financeiro, desmoralizando ainda mais o secular conceito de democracia representativa. Neste novo ciclo do capitalismo mundial, o clássico golpe de estado executado a manu militari, com seu corolário de destruição, terror, sangue e morte, vem dando lugar ao golpe branco perpetrado pelo capital financeiro da doutrina neoliberal, mas não menos funesto que a tomada do poder pelas armas.
Sem qualquer respeito à soberania dos helênicos, a “banca mundial” (que dizem representada pelo grupo norte-americano Goldman Sachs) humilhou aquele país e impôs, à revelia de seu povo, um primeiro-ministro tecnocrata, um executivo de luxo, completamente desvinculado dos interesses políticos nacionais e lídimo testa-de-ferro do capital apátrida. Quando ainda indicado para assumir o cargo, causou perplexidade e revolta a seus mentores, porquanto, inexplicavelmente, foi acometido de um acesso de democracia e sugeriu submeter a um referendo popular as propostas de arrocho fiscal para a nação grega. Uma verdadeira heresia para os ditames da nova ordem econômica dominante. Foi rechaçado imediatamente pela “banca” e recolheu-se a seu papel de marionete movida pelos cordões de seda das grandes corporações financeiras, em cujo receituário, nem como mero detalhe o povo existe. A “audácia” quase lhe custou o cargo!
Com efeito, o Estado do Bem-Estar Social (Welfare State), que surgiu na Europa Ocidental com o intuito de contrapor-se ao comunismo da então União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), não resolveu o problema do povo europeu. Mas, não se podem negar as várias conquistas sociais resultantes da interação entre povos e governos daquela região. Entretanto, essas conquistas estão agora ameaçadas, na medida em que a besta-fera do neoliberalismo, montada no capital financeiro, faz pouco caso da pobreza no mundo, invadindo as nações e lhes confiscando o futuro e a soberania, a título de pagamento de dívidas espúrias. Lamentavelmente, com o conceito neoliberal do “estado mínimo”, da “supremacia da mão invisível do mercado,” da falácia de que “o estado não existe para distribuir renda,” os menos favorecidos de todos os quadrantes ficaram entregues à própria sorte, ou melhor, aos desígnios do deus-mercado. Em verdade, o mercado é o melhor ente para produzir renda, porém, é tarefa essencial do Estado distribuí-la, no seu incessante desiderato em busca da justiça social.
Lastimavelmente, o que se constata hoje é a volta do laissez-faire, turbinado pelos “rentistas” do capital estéril e selvagem, protagonista da maior concentração de renda jamais vista na denominada civilização moderna. E salve-se quem puder!


(*) Escritor, Membro da Academia Feirense de Letras

Entrevista de Carlos Mariguella (1967)

Em 1967, de Cuba, Marighella convocou o povo brasileiro para pegar em armas e lutar contra a ditadura militar


Se estivesse vivo, o fundador da Ação Libertadora Nacional (ALN), Carlos Marighella, completaria 100 anos nesta segunda-feira. Um dos principais arregimentadores da luta armada no Brasil, o revolucionário defendia a guerrilha como única forma de superação da ditadura e da influência Norte-Americana no país.
Suas posições políticas e seu conflito com o Partido Comunista Brasileiro foram expostas numa entrevista veiculada pela rádio Havana (Cuba) em 1967, logo após a realização da primeira Conferência da OLAS (Organização Latino-Americana de Solidariedade), onde métodos para a revolução em países latinos foram debatidos.
A entrevista foi ouvida no Brasil por alguns militantes de organizações de esquerda que sintonizavam a rádio Havana em ondas curtas. Ela serviu como fonte de mobilização para jovens que estavam dispostos a pegar em armas na luta contra a ditadura.
Trechos dessa entrevista foram publicados em trabalhos acadêmicos e livros sobre a ditadura. O áudio com a íntegra, contudo, ficou perdido por anos. O material foi recuperado recentemente, durante pesquisas feitas por uma das militantes que trabalhou na construção da ALN, Iara Xavier. Ela é irmã de Iuri Xavier - que foi um dos líderes da ALN assassinado pela ditadura em 1972.


Asseguir trechos da entrevista:


Pergunta: Um telegrama da agência de notícia francesa France Press, fechado hoje no Rio de Janeiro, disse assim: Carlos Marighella será expulso por indisciplina do comitê central do Partido Comunista Brasileiro, informa hoje a imprensa de Brasil. Os diários locais, que se baseiam em informações de recorridas em organismos de segurança brasileiros, indicam que essa decisão do PCB foi motivada pelo fato de Marighella ter ido à Havana para assistir à Conferência da OLAS, Organização Latino-Americana de Solidariedade. Precisamente nos encontramos sentado à frente de Marighella, no seu quarto no hotel Habana Libre, para que nos dê sua resposta a este telegrama e ao tempo nos fale a respeito da situação atual do seu País.


Carlos Marighella: O que tenho a explicar ao povo Cubano é que estes telegramas indicam apenas que os periódicos brasileiros procuram utilizar-se do episódio da minha vinda a Cuba para fazer provocações contra os revolucionários. A notícia de que eu serei expulso do Comitê Central do Partido Comunista Brasileiro ou do Partido Comunista Brasileiro por indisciplina é baseada no fato de que foram obtidas informações nos organismos de segurança brasileira, quer dizer, dos organismos policiais, que não podem realmente saber de nada. De qualquer maneira, como tenho uma posição divergente em relação à direção do Partido Comunista Brasileiro, pois sou partidário da luta de guerrilhas como caminho para solução dos problemas do nosso povo, creio que seria ridículo expulsar um revolucionários somente porque veio a Cuba trazer a solidariedade do povo brasileiro à revolução cubana e à Primeira Conferência de Solidariedade Latino-Americana.
Quanto à questão levantada nestes telegramas, que noticiam as posições dos jornais brasileiros que pertenço a uma fração do partido Comunista juntamente com outros camaradas, no sentido de desrespeitar as decisões do Partido Comunista Brasileiro, porque somos favoráveis à luta armada, devo esclarecer ao povo cubano que não pertenço a nenhuma fração.
Sou o primeiro-secretário do Partido Comunista em São Paulo, do Comitê Estadual do Partido Comunista em São Paulo, e não tenho nenhuma necessidade de organizar grupo, fração, nem mesmo de organizar um novo partido comunista, porque já temos em nosso país muitas organizações.
Há grande confusão ideológica, muita gente que pretende atribui-se a condição de líder, de dirigente, mas tudo isto baseado em declarações, na elaboração de informes, na realização de reuniões, quando o fundamental para nós no Brasil é passar para a ação, desencadear a luta armada.
É organizar a luta de guerrilhas. Somente em torno da luta de guerrilhas, somente em torno de um caminho revolucionário como esse é que se pode realizar a unidade dos revolucionários, a unidade do povo brasileiro.
Assim, seria perder tempo participar de frações, tentar organizar novos partidos e tentar percorrer o caminho tradicional que não nos ajudará em coisa nenhuma e só nos levará a passar ainda mais anos na pasmaceira em que nos encontramos atualmente.
Minha posição e a dos camaradas que estão com a mesma disposição que tem a mesma convicção é exatamente a da preparação da luta armada, do desencadeamento da luta de guerrilhas e da concentração de todos os esforços nessa atividade. Era isso que tinha a esclarecer.


Pergunta: Marighella, existem no Brasil forças revolucionárias capazes de resistir à ditadura de ir à luta armada contra o regime?


Marighella: Sim. Existem essas forças. As forças revolucionárias capazes de resistir à ditadura e ir a uma luta armada contra o regime encontram-se dentro do Partido Comunista Brasileiro e fora do mesmo partido. Há várias organizações, agrupamentos, correntes e forças outras que defendem posição revolucionária que estão dispostas de ir à luta armada, que têm convicção que o caminho brasileiro para a salvação de nosso povo é a luta armada, e que podem realiza-la. Quando existem condições tais como as que se apresentam em nosso país essas forças revolucionárias são criadas praticamente dia-a-dia e hora-a-hora. O que é preciso é passar para a ação. Fazer com que essas forças se coordenem no mesmo sentido e que passem no desencadeamento da luta e se prepararem. Que vão, portanto, à área rural, que é onde nós podemos, no Brasil, desenvolver a luta que pode ser apoiada pelos trabalhadores, por todo o povo dentro das áreas urbanas e, nesse sentido, marchar para conseguir a vitória que no Brasil só poderemos conseguir se juntarmos esse nosso esforço ao esforço de todos os outros povos Latino-Americanos.


Pergunta: Agora a gostaríamos de perguntar a cerca da responsabilidade que corresponde ao PCB ante ao golpe militar de 1964?

Marighella: Não há propriamente responsabilidade do Partido Comunista Brasileiro em relação ao golpe militar de 1964. A responsabilidade, se quiséssemos falar assim, maior, realmente cabe à direção do Partido Comunista Brasileiro. Por que a direção do Partido Comunista Brasileiro cabe orientar as bases, traçar os planos e orientar todo o povo, dar as diretivas necessárias para que a luta seja enfrentada.
Ora, a direção do PCB seguiu caminho de submissão à liderança da burguesia. Confiava que os generais brasileiros pudessem vir a resolver a situação do povo. Confiavam num dispositivo militar. Realizava, na verdade, ou propunha a realização, de um trabalho de cúpula nos altos níveis das organizações.
Não era trabalho realizado pela base, em que o povo participasse diretamente de baixo para cima e, por tanto, um trabalho que tivesse estrutura firme em que o proletariado, o campesinato, as forças de massa do Brasil estivessem mesmo atentas para a situação. Então, a direção do nosso partido era direção que estava se conduzindo com base de ilusões de classe, de ilusões com a burguesia.
Evidente que com essa posição deixou o povo brasileiro inteiramente despreparado e, quando sobreveio o golpe militar de 1965, evidente que não havia condições para a resistência. O povo se encontrava na rua. Não tinha armas, entretanto.
E não havia ação daquelas forças do governo e da burguesia que o partido, ou melhor, a direção do partido, sustentava que iriam reagir. O resultado é que inteiramente desprevenidos e despreparados com todas as ilusões que haviam sido defendidas pela direção do partido, ficou todo o povo brasileiro impossibilitado de impedir que o golpe se concretizasse, como acabou se concretizando.
Esse é o caso típico de uma lição, de um ensinamento que se pode obter exatamente pelo fato de que a liderança comunista deixa de acreditar no proletariado como força dirigente da revolução, deixa de acreditar no aliado fundamental do proletariado, que é o campesinato, para lançar-se de mãos e pés amarrados diante da burguesia.
Sem condições, portanto, de impedir o golpe que fatalmente virá em quaisquer circunstâncias sempre que o Partido Comunista não se preparar para a luta armada e não se preparar para organizar as forças armadas do povo, que é a única coisa que pode deter a posição, a ação dos imperialistas Norte-Americanos contra a liberdade do povo brasileiro ou dos povos da América-Latina.


Pergunta: Que forças revolucionárias e que tipo de organização crê o senhor lograria a aliança armada entre trabalhadores e campesinos que se faz necessária para chegar a criar o núcleo do exército de liberação brasileiro?


Marighella: O que nós revolucionários comunistas estamos empenhados na luta armada e temos a forte convicção que só a luta armada resolverá a questão brasileira, o que nós revolucionários, o que nós comunistas estamos pensando, é que em face da situação brasileira e das organizações que ali existem, o que deveríamos fazer é procurar lançar a luta de guerrilhas na área rural do País sem nos preocuparmos em que qualquer das organizações existentes tomasse a inciativa.
Não se trata que esta luta armada, que essa guerrilha no Brasil tenha que ser organizada somente pelo Partido Comunista Brasileiro ou por qualquer outra organização existente dentre as que atuam no Brasil, sejam as organizações dos partidários de (Leonel) Brizola, de (Miguel) Arraes, do (Francisco) Julião, da Ação Popular, da POLOP, da Política Operária e mesmo das organizações da esquerda católica.
O problema não se situaria, portanto, na situação agora de uma organização que fosse dar a diretiva de luta armada, mas começar a luta armada com os revolucionários de dentro e de fora do partido, e de todas as organizações que estejam dispostas dentro de um plano estratégico político global, a iniciar a luta.
Fazer com que esta luta armada, que no caso brasileiro, como no caso Latino-Americano, penso, tem que ser a luta guerrilheira. Fazer com que essa luta tenha um caráter duradouro, que dure, que tenha continuidade, ainda que a principio seja luta que mobilize um grande número de homens, mas que possa obter êxito iniciais e manter-se e implantar-se na área rural do país. Isso dará confiança ao povo brasileiro e essa luta progredirá.
E nessas condições, então, no processo, será possível criar-se a verdadeira organização revolucionária capaz de levar a vitória ao povo brasileiro através da luta de guerrilha.


Pergunta: É possível lutar pelas reformas de base de forma pacífica em um Brasil governador por gorilas?


Marighella: Não. Não é possível lutar por essas reforma através do caminho pacífico num Brasil com a ditadura que tem no presente momento. Já anteriormente, quando havia o governo de João Goulart, nós seguimos, ou melhor, nosso partido, sua direção, enfim, os revolucionários no Brasil seguiram esse caminho, de lutar pela reforma de base pelo caminho pacífico e sob a liderança da burguesia. Isso nos levou a um fracasso completo e total pois, nas condições atuais, a burguesia no Brasil e em outros países não tem condição de dirigir a revolução.
E não há condições também, no momento em que o imperialismo lança mão de sua estratégia global, não há condições para se obter a vitória pacífica através dessas lutas pela reforma. As reforma de estrutura, de base, que necessitamos no Brasil, e de que necessitamos em muitos países da América-Latina, só se pode conseguir através da luta revolucionária.
Ou melhor, através da tomada do poder pela via revolucionária. Quando somente então, e com forças armadas do povo em ação, podemos dominar a ação das forças reacionárias, a ação do imperialismo e realizar essas reformas e levar o País até o socialismo. Fora disso não é possível. E a lição que recebemos no Brasil e uma lição que pode servir para os demais povos da América-Latina.


Pergunta: Marighella, por último, gostaríamos perguntar o seguinte: que espera o movimento revolucionário brasileiro desta primeira conferência da OLAS?

Marighella: Para o povo brasileiro a primeira Conferência de Organização Latino-Americana de Solidariedade, Olas, significa muito, significa mesmo o passo mais avançado que foi dado na América-Latina, para que reunamos todas as nossas forças num plano estratégico global visando obter a liberação de nossos países do julgo do imperialismo Norte-Americano. Somente agora, e depois que a revolução cubana conseguiu sua grande vitória, e se encaminhou pelo terreno da construção do socialismo no primeiro país da América-Latina, tornou-se possível congregar todos esses esforços, dos revolucionários de toda a América-Latina, como acontece agora nessa primeira Conferencia da Organização Latino-Americana de Solidariedade para enfrentar a estratégia global do imperialismo Norte-Americano.
Espero que o movimento revolucionário brasileiro saberá compreender a importância dessa primeira Conferência Latino-Americana de Solidariedade e que se junte aos esforços que todos fazemos no sentido que, como disse o comandante Che Guevara, criar um, dois três, muitos Vietnãs


Fonte: IG Noticias

O fascismo de mercado

Por Gilson Caroni


A crise econômica capitalista, em especial nos Estados Unidos e na zona do euro, começa a dar lugar a golpes e contra-golpes entre os seus principais atores. Entre eles o receituário apresentado liturgicamente desde os anos 1990. As reuniões de cúpula que os chefes de governo ocidentais realizam não se caracterizam pelos seus aspectos resolutivos, mas pelo vazio de suas proposições.


Ao propor que os orçamentos dos países sejam aprovados primeiro pela UE, antes de ir para seus Parlamentos - com punição a quem não cumprir metas de redução de dívida e déficit - a chanceler alemã Ângela Merkel deixa claro que soberania nacional é um conceito em desuso, uma velharia a ser removida. Frente à crise imposta pelos princípios liberais globalizantes, notadamente o "salve-se quem puder" e o "que sobreviva o mais capaz”, que apareciam como mantras nos melhores manuais de desregulamentação, a única saída é a "fuga para frente" proposta pelos neoliberais radicais. Deixando governos de pés e mãos amarrados, a falsa solução passará pela perda de prerrogativas governamentais de conceber e executar políticas econômicas que atendam aos legítimos interesses dos países e dos povos.


Na verdade, chegou-se a fórmulas gerais que podem ser interpretadas de várias maneiras e que, de qualquer forma, não envolvem compromisso algum com qualquer esfera que não seja a do mercado. Insistir nas privatizações do que resta de estatal (quase nada), em ajustes fiscais, e no maior enfraquecimento do Estado, é consolidar o poder do FMI, do Banco Mundial, das instituições financeiras internacionais e a chantagem das agências de classificação de risco.


Todo cuidado é pouco para não tropeçar nas palavras e escorregar nos conceitos. Mas essas transformações e essas metamorfoses significam um "retorno" ao império das leis do funcionamento da economia mercantil- capitalista, temporariamente represadas por obra e graça da rebelião democrática do imediato pós-guerra, que ensejou a Grande Transformação.
Como recordou o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, "em sua essência, as práticas do Estado intervencionista e do Bem-Estar buscaram, por meio da aplicação política de critérios diretamente sociais, encontrar soluções para os problemas de satisfação das necessidades humanas e da vida decente para a maioria, negando, assim, as condições de existência impostas ao cidadão pela "ratio" do capital, cujo único propósito é acrescentar o seu valor".


A vitória do reformismo liberal fez recuar as tentativas de domesticar a mercantilização universal e a concorrência sem quartel. Na Europa, a social-democracia passa a ocupar uma posição de centro-direita rasgando a máscara da "terceira via", que fez grande sucesso e gerou expectativas em toda a esquerda do continente. Antes mesmo da crise do euro, os serviços públicos, como saúde, educação e transporte, conheceram uma considerável piora. Ainda no final do século passado, críticos de esquerda acusavam o então primeiro-ministro britânico Tony Blair de impor ao Reino Unido um “thatcherismo” com rosto humano.


Quando o capital financeiro estabelece sua supremacia, a cidadania é suprimida. Os sistemas de crédito e os dispositivos do mercado passam a se encarregar dos desígnios despóticos do capital sobre a massa de trabalhadores e os países mais fracos. É isso ao que estamos assistindo no sul da Europa. Algo que, guardadas as devidas proporções, vivemos na América Latina durante duas décadas. Por meio de disciplinas e sanções, sempre legitimadas na grande mídia, o fascismo de mercado se instala.
Fora da política não há salvação. Como bem sabemos por aqui.


Fonte: Vermelho

Jornal Nacional da Tv Globo mudou?

Por Marco Aurélio de Mello - Fund. Maurício Grabóis


Seria de uma ingenuidade tremenda achar que, porque mudou uma das apresentadoras do telejornal, ele ficaria diferente no conteúdo, no dia seguinte. Para fazer o Jornal Nacional são, por baixo, 150 jornalistas em todo o país envolvidos diretamente com ele.


O Jornal nasce no dia anterior, quando a rede (conjunto de produtores baseados no Rio de Janeiro) reúne as ofertas das praças numa previsão. São matérias produzidas, ou a continuação das matérias factuais (suítes). Claro que muitas delas cairão no dia seguinte, conforme a necessidade de "virar" a pauta. Mas existe uma espinha dorsal, chamada no jargão de pré-espelho do jornal.


Numa reunião por volta de meio-dia, começa a nascer o telejornal daquela noite. Ali serão lançadas as ofertas na grade, por ordem de importância. Cabe ao editor-chefe balancear a participação de todos e a fatia de tempo que cada um terá.


Há que se ter um certo jogo de cintura para acomodar tantas pressões: do patrão que recebeu um prêmio, do diretor de praça que não está participando muito do telejornal e se sente desprestigiado, do governador que pediu espaço, do erro cometido no dia anterior, que carece de reparo, do repórter especial, cuja matéria foi engavetada no dia anterior e fez biquinho. Editorias de internacional, esportes, chamadas de outros programas... E por aí vai.


Mudar um produto com esse grau de organização e complexidade exige - antes de tudo - uma mudança de cultura. Algo que não nasce da noite para o dia. A maioria dos profissionais que estão nestas funções têm, pelo menos, 10 anos de casa. Portanto, já estão com a cabeça "formatada" e, não raro, reproduzem mecanicamente as certezas e recomendações da casa em relação aos temas.


Dou um exemplo. A casa gosta de impostômetro, combate à pirataria, ecologia, economia, política, defesa do consumidor. A casa não gosta de minorias, de Enem, de cotas, de índio, de falar mal de cerveja, de denúncias contra laboratórios médicos, e assim por diante...


Para resumir, Patrícia Poeta será a nova apresentadora do Jornal Nacional e ponto. Nada que vier a acontecer com a qualidade da cobertura jornalística daqui para frente vai depender da sua presença na bancada, ainda que tenha papel de editora-executiva. Pelos menos por enquanto, tudo fica como sempre foi. Até quando? Só Deus sabe...


Fonte: Blog DoLaDoDeLá

Voltar a crescer, urgente!

Por Renato Rabelo


Não tardou para o aperto monetário e fiscal iniciado no começo do ano fazer seu efeito. Neste trimestre, o consumo familiar caiu 0,1%, o PIB industrial negativou em 0,9% e nos serviços a queda foi de 0,3%. O crescimento econômico neste trimestre foi 0% e a estimativa para o ano que já foi de 4,5% no início do ano, despencou para 3,2%.


As causas são mais internas que externas. Tudo indica que a dose do aperto foi excessiva. Se a crise externa causa fechamento de mercados, a alternativa interna – dado o tamanho de nosso mercado interno – era a plausível e recomendada. Esta alternativa (mercado interno) foi reativada com quedas contínuas das taxas de juros e isenções fiscais anunciadas, para a chamada “linha branca”, na semana passada.


Certamente o governo já tinha posse destes dados há mais tempo. Tanto é verdade que uma série de medidas para destravar o investimento público já começou a ser tomada, entre elas o empenho de verbas federais vinculadas ao investimento de forma que as ações sejam iniciadas ainda este ano. Para termos ideia da centralidade desta medida, entre janeiro e outubro deste ano somente R$ 10,3 bilhões foram executados de um montante previsto de R$ 69 bilhões.

Neste sentido as perspectivas de crescimento para o ano que vem não são sombrias. Além do alavancamento do gasto púbico previsto, existe a grande possibilidade, ainda, da queda da taxa de juros -- que deve ser acelerada -- e o aumento do salário mínimo para R$ 625,00.


O dado em si é péssimo para o país. Mas as perspectivas não são ruins. A luta pelo desenvolvimento é claramente política. O momento é de acumular forças. A realidade vai demonstrando que o desenvolvimento demanda um pacto político sólido e de largo alcance. O país precisa voltar a crescer urgentemente.


Fonte: Blog do Renato

Mercado de trabalho no Brasil

Nivaldo Santana*


Um tema importante e pouco debatido é o estudo do mercado de trabalho no Brasil. Recente estudo do Dieese aponta que o mercado de trabalho no país é bastante heterogêneo, com grandes variações de remuneração, condição de trabalho e proteção social.


Esse estudo indica alguns tipos precários de relações de trabalho: 1) empregos com carteira mal remunerados; 2) empregos sem carteira; 3) desemprego; 4) pequeno comércio de rua; 5) cooperativas; 6) empregos temporários; 7) terceirizados e 8) clandestinos ou ilícitos.


A gravidade desse amplo e diferenciado espectro de relações de trabalho é que a legislação brasileira que trata dos direitos sociais se estrutura principalmente sobre os trabalhadores assalariados. E o país tinha, em 2005, um total de 90,9 milhões de ocupações, das quais 58,8% de trabalhadores informais.


Ocorre que mesmo no mercado formal de trabalho a situação não é boa. O Ministério do Trabalho produz mensalmente estatística sobre os empregos com carteira assinada e desemprego (Caged - Cadastro Geral de Emprego e Desemprego).


Pelo Caged fica-se sabendo que a grande maioria dos empregos criados com carteira assinada se concentra na faixa até dois salários mínimo (saldo de 1,92 milhões de janeiro a setembro deste ano). Empregos criados acima de dois mínimos, no mesmo período, teve saldo negativo de 140 mil empregos.


Tudo isso mostra que o país tem um longo caminho a percorrer para ter um mercado de trabalho robusto, qualificado e bem remunerado. Apesar de ter gerado 17.626.016 empregos formais de janeiro de 2003 a outubro de 2011 e manter baixas taxas de desemprego, há um preocupante nivelamento por baixo nos salários praticados no Brasil.


A política de valorização permanente do salário mínimo aprovada no governo Dilma dá sequência a uma das mais importantes vitórias dos trabalhadores brasileiros de recuperação salarial. No entanto, mediante a gigantesca rotatividade em curso no país, o patronato procurar driblar essa conquista.


O professor de Economia da Unicamp, Cláudio Dedecca, afirma, com razão, que as empresas demitem quem ganha mais e contrata trabalhadores com salários menores para não arcar com os custos da elevação do salário mínimo (e também para fugir dos aumentos reais alcançados nas convenções e acordos coletivos).


Essa discussão é central quando se discute os rumos do desenvolvimento do país. O Brasil reclama por um pacto desenvolvimentista entre o trabalho e o setor produtivo contra os ganhos exacerbados do setor financeiro. Mas é necessário dar principalidade à questão do trabalho de qualidade.


O movimento sindical brasileiro precisa descortinar novas estratégias para enfrentar um mercado de trabalho complexo, onde coexistem relações formais e informais com fronteiras não muito nítidas. Além disso, deve colocar no topo da agenda a luta por trabalho de qualidade e bem remunerado.


* Nivaldo Santana é vice-presidente da CTB e secretário sindical do PCdoB

Manning, Tiradentes. Traidor? Herói?

por Mauro Santayana - Pátria Latina


Os Estados Unidos se preparam para o julgamento do soldado Bradley Manning, que entregou ao WikiLeaks a correspondência diplomática secreta de seu país. A discussão transcende as leis penais, para situar-se na definição ética do que é lealdade e do que é traição.


É difícil estabelecer o ato de traição, sem que se identifique profundamente as razões do traidor e do traído, associadas aos sentimentos de um e de outro. Quando o traído é uma pessoa, é mais fácil entender as razões ou desrazões morais do ato. As traições amorosas se situam nesse campo. Até faz pouco tempo, em muitos países e no Brasil, o adultério era punido pela lei, mas a realidade superou o Código Penal. Só as sociedades teocráticas, como as islamitas, mantêm o rigor da lei, mas, no caso, só contra as mulheres.


Quando se trata da traição às comunidades nacionais, a situação é mais difícil
As traições pessoais, menos aquelas que envolvam dinheiro, e podem ser levadas aos tribunais, são resolvidas no mesmo plano. Os traídos perdoam ou não os traidores; os que se sentem mais feridos alimentam o ódio ou se refugiam no desprezo ao traidor. Mas quando se trata da traição às comunidades nacionais, a situação é de análise muito mais difícil.


O que separa o herói do traidor? Borges tem um conto muito interessante sobre o tema, com hipotética situação na Irlanda do século 19, que Bertolucci aproveitou, atualizando-o para os tempos de Mussolini, com o filme A estratégia da aranha. O escritor não toma partido, e deixa a dúvida se Fergus Kilpatrick fora herói ou traidor, mas deixa entender que na face do herói podem estar as marcas do traidor — ou o contrário.


Será traidor aquele que se orienta por sua consciência, e considera necessário sacrificar os planos de ação a fim de evitar o sacrifício inútil de vidas? Como estabelecer essa diferença dramática entre o traidor e o herói?


Tomemos dois casos conhecidos, o de Calabar, que ficou ao lado dos holandeses, e o de Tiradentes. Os defensores da memória de Calabar afirmam que, para o Brasil, melhor teria sido a colonização holandesa. A história lhes retira a razão: se os holandeses houvessem expandido sua presença a todo o país, o nosso destino teria sido, provavelmente, o da Indonésia. E outros seriam os habitantes de nosso país, não exatamente nós mesmos.


Tiradentes era suboficial da Cavalaria da Tropa Paga das Minas. Servia, assim, às forças armadas da Coroa Portuguesa. Para os julgadores de seu tempo, ele traíra a rainha de Portugal e os seus companheiros de farda, ao participar da Conjuração que tinha como objetivo final a independência das Minas e do Brasil, e, como objetivo imediato, a prisão e a possível execução do governador da Capitania, o visconde de Barbacena.


Poucos foram os habitantes da Capitania que, naquele momento, o viram como herói. Além dos intelectuais, sacerdotes e comerciantes que participaram da Conspiração, só lamentaram, no momento dos fatos, sua prisão e sua morte, com os requintes de crueldade física e moral conhecidos, homens do povo, que dele se lembravam em sua pregação nacionalista em suas viagens pelos sertões. O reconhecimento público do heroísmo de Tiradentes e de sua profunda razão ética na busca da independência, como realização da solidariedade nacional, só viria muitos anos depois.


O primeiro ato de reabilitação se deve a José Benedito Ottoni, pai dos irmãos Ottoni que, logo depois da Independência, e como vereador em Vila Rica, sugeriu e obteve a retirada do padrão de ignomínia que havia sido erguido na cidade, como repúdio à “traição” de Tiradentes. Recorde-se que a cabeça do Alferes, que deveria permanecer no alto desse poste, “até que a consumisse o tempo”, foi retirada de lá, poucos dias depois de colocada, por mãos até hoje desconhecidas e corajosas, e enterrada em algum lugar de Ouro Preto, não se sabe onde.


No raciocínio dos partidários de Portugal, o herói fora Joaquim Silvério dos Reis, que mantivera (pouco importa conhecer as suas razões) fidelidade à rainha, em carta manuscrita de denúncia da conspiração, enviada ao governador da Capitania. A reabilitação oficial da memória de Tiradentes viria, com a iniciativa de Mário Soares, que, presidente de Portugal — e em cerimônia no Palácio da Liberdade, em Belo Horizonte — decretou o fim do labéu de ignomínia que, imposto pelo Estado monárquico português, ainda pesava sobre o Alferes e seus descendentes.


Uma visão pragmática da História mostra que os heróis estão sempre no campo vitorioso, ainda que a vitória, como a liberdade que Tiradentes pretendia, tardasse no tempo. Os americanos têm um traidor exemplar, na figura de Benedict Arnold, que desertou das tropas revolucionárias, passando ao inimigo britânico. Os norte-americanos não conseguiram prendê-lo e enforcá-lo, mas os próprios britânicos, passada a sua utilidade, deixaram-no morrer quase à míngua em Londres. É certo que, se os britânicos houvessem sido vitoriosos, o busto de Arnold estaria em algum lugar de Londres, como se encontram as estátuas de Nelson e Wellington.


Bradley traiu quem? O governo belicista dos Estados Unidos, servidor do famoso Complexo Industrial-Militar, denunciado pelo presidente Eisenhower, herói da 2ª Guerra Mundial, ou a nação americana que, em tese, o julgará? Traiu os seus companheiros de farda, ou um sistema de poder mundial responsável pela morte de centenas de milhares de pessoas inocentes, nos países mais pobres do mundo, mediante as guerras de conquista, os golpes de Estado, como os que sofremos na América Latina?


Quem trai, trai sempre em troca de algum benefício. Bradley não agiu em benefício de si mesmo, desde que não recebeu qualquer compensação pelos seus atos, nem se pode dizer que tenha passado as informações de que dispunha, diretamente, para os “inimigos” escolhidos pelo governo de seu país.


Um juízo rápido, provavelmente superficial mas indicado pelas informações disponíveis, pode identificar Bradley como um jovem inquieto, preocupado com as crueldades da guerra de que participava, com a segurança real e a felicidade de seu povo. Em favor da nação — essa é a ideia que se impõe no exame de seu caso — ele se colocou contra o Pentágono e contra a diplomacia cínica, hipócrita e prepotente de seu governo.De acordo com os observadores, ele poderá ser condenado à prisão perpétua, mas, provavelmente, um dia, seus atos serão vistos como heróicos.

O crescimento zero tem a marca da especulação financeira

Editorial de Vemelho


As luzes amarelas acesas com a divulgação da estagnação do crescimento econômico no terceiro trimestre iluminam também a convicção sobre a escassez científica das previsões feitas pelo “mercado”, além de ressaltar a torcida da turma do acordo especulativo pelo fracasso econômico do governo. Inclusive já quem, nos jornais, preveja o esgotamento do ciclo de crescimento baseado na inclusão de massas de consumidores ao mercado – um exagero evidente que disfarça mal a torcida pelo fracasso do governo e pela volta dos dogmas da especulação financeira ao comando da economia.

O crescimento zero do PIB no último trimestre é um sintoma das graves contradições da política econômica brasileira; elas foram analisadas neste portal por Umberto Martins, que enfatizou a dimensão “interna” dos problemas, relativizando com razão a influência da crise econômica que corrói a Europa e a economia mundial.

Mais do que técnico, a economia é um campo de disputa política, como tem ficado claro desde a retomada do papel do Estado para fomentar o crescimento econômico, sob Lula. Este contencioso se acentuou desde a posse de Dilma Rousseff, quando os porta-vozes da especulação financeira passaram a alardear o perigo da inflação e o governo rendeu-se à pregação estagnacionista adotando medidas de contenção do crescimento. E, logo de cara, anunciou o corte orçamentário, de R$ 50 bilhões; o primeiro semestre assistiu a cinco rodadas consecutivas de aumento nos juros, o Banco Central tomou as chamadas medidas macroprudenciais para segurar o crédito, e o superávit primário foi fortalecido para garantir o pagamento dos juros da dívida interna.

A deterioração da economia mundial tem seu papel no mau desempenho da economia, mas o crescimento zero é uma consequência direta daquelas medidas, como reconhecem o próprio ministro Guido Mantega, a Fiesp e inclusive analistas que fizeram parte daquele coro alarmista. Um dos diretores da RC Consultores, Fabio Silveira, disse aos jornais ter havido um “excesso de preocupação com relação à inflação e agora mergulharemos num crescimento negativo desnecessário no quarto trimestre por conta disso".

A disputa em torno da orientação da política econômica brasileira opõe, de um lado, os inimigos do crescimento econômico e do fortalecimento da nação e do mercado interno, que exigem o cumprimento dos dogmas neoliberais do “mercado mínimo”, do corte dos gastos sociais e dos investimentos do governo, dos juros estratosféricos e da intocabilidade do superávit primário como garantia para o pagamento dos extorsivos rendimentos da especulação financeira. Esta é a turma do pacto da especulação, que domina a economia nacional há muito tempo e, nos últimos vinte anos, infelicitou o país com a paralisia das décadas perdidas de 1980 e 1990.

Contra eles vai se fortalecendo o reconhecimento da formação de uma nova aliança, o pacto pelo desenvolvimento, unindo trabalhadores, governo e empresários produtivos. Ela exige a superação dos últimos traços da política econômica neoliberal para destravar os recursos para o crescimento econômico, fortalecer o mercado interno e manter e aprofundar o país no rumo do desenvolvimento baseado em suas próprias forças.

A política econômica desta nova aliança implica no desmantelamento do tripé que favorece a especulação financeira e quer baixar radicalmente os juros, abandonar o câmbio flutuante que desfavorece o comércio externo brasileiro, e reduzir ou eliminar o superávit primário destinado ao pagamento dos juros da especulação.

O Brasil, dizia o economista Antônio Barros de Castro, tem a vocação do crescimento. Mas ele só acontece se houver uma política econômica que o favoreça, como foi novamente demostrado nos últimos anos quando o governo federal, mesmo ainda convivendo com traços neoliberais na política macroeconômica, adotou medidas pela volta do crescimento. Foram elas que permitiram a defesa da economia nacional na primeira fase da crise mundial, em 2008/2009.

Hoje, quando o vendaval se anuncia com muito maior intensidade, a política macroeconômica exigirá medidas de fortalecimento nacional ainda mais profundas e consistentes para combater uma crise cujas consequências poderão ser danosas para o país.

A repetição da vacilação das autoridades econômicas no primeiro trimestre poderá ser desastrosa, como indica o resultado negativo do PIB no terceiro trimestre. A dinâmica da economia brasileira – e reconhecer isto é um truísmo – está fortemente ligada ao desempenho da economia mundial. Mas o país tem massa crítica e reservas internas de recursos produtivos (particularmente um mercado interno que ainda precisa, e pode, crescer muito), que acentuam o lado interno, e relativamente autônomo, desse desempenho.

Nesta disputa entre a especulação financeira e o desenvolvimento nacional, o governo precisa, é certo, demonstrar coragem política para enfrentar a oligarquia financeira, brasileira e internacional.

Mas a coragem não é um atributo abstrato. Ela depende da existência de circunstâncias que permitam a tomada das medidas necessárias. Mais do que isto, depende do apoio político dos setores da sociedade interessados na manutenção e aprofundamento da retomada do desenvolvimento: os trabalhadores e os empresários da produção que, reunidos numa nova aliança pelo crescimento econômico, poderão se constituir na força política e social necessária para derrotar a oligarquia financeira que trava o desenvolvimento do país.

Sócrates e a democracia

Por Zilah Abramo - Fundação Perseu Abramo


Para mim a trajetória que percorremos na luta pelas “diretas-já” está fortemente ligada à figura de Sócrates. Como corintiana daquelas teimosas, que não abandonam o time nem nos momentos mais desanimadores, agüentei o período triste, de mais de vinte anos, em que o meu time sofreu um jejum de vitórias. Nunca passou pela minha cabeça a idéia de mudar de opção. Mas foi difícil atravessar esse período, em que o clube do meu coração era menosprezado, alvo de brincadeiras perversas.


E aí apareceu Sócrates, que se dedicou a reerguer o Corinthians, da maneira que mais poderia entusiasmar uma pessoa como eu, que estava engajada na luta pela democratização do país e isto era implantar a ”democracia corintiana”. Segui todos os passos percorridos por Sócrates para chegar ao seu objetivo, que foi alcançado. O Corinthians se reergueu, voltou a ser um grande clube, provando que o os processos democráticos são a melhor maneira de conseguir resultados favoráveis, mesmo no futebol.


Conseguindo essa vitória, Sócrates não parou por aí. Passou a engrossar as fileiras dos que lutavam por eleições livres participando das manifestações que clamavam por liberdades democráticas. Aí nos encontramos muitas vezes.


Quando a nossa Fundação resolveu editar o livro “Pela democracia, contra o arbítrio: A oposição democrática, do golpe de 1964 à campanha das Diretas Já”, que tem um capítulo sobre a campanha das diretas, pedimos ao nosso amigo Sócrates que desse o seu depoimento. Ele atendeu ao nosso pedido e escreveu para nós o texto, que vocês podem ler abaixo:

ESPERANÇA E ENTUSIASMO:


[...] Caminhando com dificuldade naquele mar de gente pude, como raras vezes na vida, me sentir mais brasileiro. Os rostos eram plenos de esperança e de entusiasmo. A euforia ultrapassava qualquer expectativa que tivesse tido. O grito “Diretas já” já havia tanto tempo engasgado nas nossas gargantas era a bandeira que representava os que sofreram nas mãos da ditadura e a busca por um caminho mais justo e nosso. Como, aliás, era a democracia corintiana , que de há muito provocava intensas discussões sobre a redemocratização do país. Aquele movimento provocou profundas transformações na sociedade brasileira. Quem poderia imaginar que 20 anos depois tivéssemos um legítimo representante do povo portando a função presidencial.


Nada será mais belo do que aquilo que vivemos naquele período.


*Zilah Abramo é presidente do Conselho Curador da Fundação Perseu Abramo e co-organizadora do livro “Pela democracia, contra o arbítrio: A oposição democrática, do golpe de 1964 à campanha das Diretas Já”.

Homens e mulheres num caminho de paz


Por Iriny Lopes
Fonte: Jornal Folha de S.Paulo, seção "Tendências/Debates"


Infelizmente, o cenário no Brasil ainda é assustador, e os números falam por si só: a cada dois minutos, cinco mulheres sofrem agressões
Masculino ou feminino não é só uma definição de gênero. É uma espécie de alegoria do poder em países como o Brasil, onde a ligação entre violência e gênero, historicamente, estabelece quem são os autores e quem são as vítimas, para firmar o que se poderia chamar de identidade dominante.
Como se a natureza, após séculos e séculos, ainda fosse representada pelo mito da dominação masculina, o que pressupõe força bruta para subjugar a outra espécie: feminina. Neste Dia Nacional de Mobilização dos Homens pelo Fim da Violência contra as Mulheres, nos interessa abrir um caminho de paz entre todos os gêneros, com base na consciência de justiça e igualdade.
Porque foi no dia 6 de dezembro, em 1989, que um jovem, Marc Lepine, de 25 anos, invadiu uma escola de Montreal, retirou os homens do local e, em seguida, atirou e matou 14 mulheres e depois se matou.
Numa carta, ele justificava seu ato dizendo que não suportava a ideia de ver mulheres estudando engenharia, curso tradicionalmente voltado para os homens.
Massacre é o que não queremos ver mais. Nenhum tipo de violência, seja física ou emocional, face mais cruel dessa desigualdade na sociedade. Por isso, marcamos este dia 6 com uma mensagem: as mulheres brasileiras têm, sim, quem as proteja. São muitas as ações e as alianças firmadas no sentido de que sua integridade seja respeitada.
Nesta terça-feira, em parceria com o Supremo Tribunal Federal e com o Conselho Nacional de Justiça, estamos lançando a campanha Compromisso e Atitude no Enfrentamento à Impunidade e à Violência contra a Mulher, justamente para fechar o cerco contra agressores e criminosos.
Cada instituição formulará ações para enfrentar a violência contra as mulheres no âmbito de suas competências, visando dar prioridade a casos de homicídios de cidadãs.
Infelizmente, o cenário é assustador, e os números falam por si só: a cada duas horas, uma mulher é assassinada no país. A cada dois minutos, cinco mulheres são violentamente agredidas.
Graças à Lei Maria da Penha, o Estado reconhece que a violência doméstica deve ser erradicada. Graças à Central de Atendimento à Mulher - Ligue 80, salvamos muitas vidas. O serviço realizou, de 2006 até outubro deste ano, mais de 2 milhões de ligações -são 58.512 relatos de violência de janeiro até outubro de 2011.
Nós avançamos muito em termos de políticas públicas, mas os desafios ainda são grandes até conseguir a pacificação do Brasil. Por enquanto, é campo de guerra, campo minado de instintos selvagens.
A Secretaria de Políticas para as Mulheres e órgãos parceiros têm incentivado o diálogo de paz entre homens e mulheres, participando de campanhas como Homens Unidos pelo Fim da Violência contra as Mulheres, liderada pela ONU.
Em junho deste ano, entregamos ao secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, um abaixo-assinado com 56 mil assinaturas de homens brasileiros se comprometendo publicamente a contribuir para o fim da violência contra as mulheres.
Vamos acabar com isso, é preciso, em nome de uma sociedade democrática, de fato e de direito. Até porque há avanços significativos.
Avançamos na repactuação das políticas para as mulheres, com Estados e municípios, para aumentar a escala dessas ações de enfrentamento à violência, em todas as áreas e instâncias de governo.
Não vamos fazer o papel dos municípios nem dos Estados, mas precisamos construir as interfaces e estabelecer a transversalidade das políticas públicas para que elas transformem positivamente a vida das mulheres. É como se fôssemos alinhavando um grande mutirão em prol das mulheres do Brasil. O caminho é longo, e a chegada, um sonho de todas.
*Iriny Lopes é ministra da Secretaria de Política para as Mulheres.

A culpa da (des) ordem capitalista

Editorial de Carta Maior


A cúpula do euro que acontece nesta sexta-feira, em Genebra, tem sido apresentada pela mídia como a derradeira chance de salvar a moeda única que articula a economia de 17 países, muitos deles vivendo um estágio de decomposição fiscal.

Na realidade, o que está em jogo é uma resposta mais geral à crise das finanças desreguladas que teve a sua espoleta nos EUA, na bolha imobiliária de 2008, mas vive seu epicentro na virulenta desordem financeira instalada no coração do capitalismo europeu. Referendar aparências para ocultar a essência tem sido um recurso do poder em todos os tempos.

A agenda de Genebra não se resume a um confronto entre a austeridade bovina de Ângela Merkel e governantes perdulários, às vezes cafajestes, como se tenta vender em manchetes e perorações mercadistas; tampouco se restringe a um ritual de consagração da direita medíocre, personificada pelo novo premiê espanhol, Mariano Rajoy, que ascende no vácuo da rendição socialista para enterrar os ossos do Estado do Bem-Estar Social.

O que se decide nesta 6ª feira é o quanto será preciso amputar da democracia e da soberania das nações para salvar os interesses rentistas abrigados na hegemonia do capital a juros, que modelou o sistema econômico mundial com maior intensidade nas últimas décadas.

Em troca da ‘ajuda' a Estados e instituições em rota falimentar, Genebra entoará o réquiem da velha Europa, substituindo-a por um protetorado teleguiado por diretórios com poder consentido para indeferir e modificar orçamentos, leis e políticas votados em parlamentos ornamentais.

Versalhes fez isso no passado contra a Alemanha, impondo-lhe reparações de guerra que levaram ao segundo conflito mundial. Uma Europa sob estado de exceção permanente está em teste nos pilotos grego e italiano, manejados por tecnocratas de confiança do dinheiro. Quem dirá se os protótipos tem fôlego para refundar a (des) ordem capitalista em bases ainda mais regressivas, não serão os protagonistas passivos de Genebra.

Mais que nunca a partir desta sexta-feira esse apanágio caberá às ruas.

João Dias, fonte da VEJA, é preso no DF

Por Altamiro Borges


O policial João Dias, o bandido usado como principal fonte da revista Veja para derrubar o ministro Orlando Silva, dos Esportes, foi preso na tarde de hoje (7) em Brasília. Ele tentou invadir a sala do secretário do Governo do Distrito Federal, Paulo Tadeu, no Palácio Buriti. Carregando uma mala com cerca de R$ 200 mil, o “maluco” berrou palavrões e agrediu três pessoas.


Bem que a revista Veja, que deu tanta acolhida ao sinistro policial – acusado de desvio de recursos de convênios na área do esporte, de enriquecimento ilícito (uma mansão, três carrões importados e duas academias de ginástica) e até de homicídio –, poderia contratá-lo. O sujeito parece transtornado com o fim dos holofotes. Ele poderia ser instalado ao lado de outro “doente”, o blogueiro pitbull da Veja.


Abaixo, as matérias publicadas no blog de Lilian Tahan, do Correio Braziliense, a primeira a noticiar o inusitado acontecimento; as duas notas da Secretaria de Comunicação do Governo do Distrito Federal e a nota da Polícia Civil.


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João Dias é preso por segurança do Palácio do Buriti


Pivô do escândalo que derrubou o ministro Orlando Silva, João Dias invadiu nesta tarde a Secretaria de Governo comandada por Paulo Tadeu.


O policial militar, segundo testemunhas, agrediu duas funcionárias do secretário Paulo Tadeu. Uma delas é conhecida por Paulinha e a outra chama-se Niedja.


João Dias carregava um pacote de dinheiro vivo que também, segundo testemunhas, ele teria jogado em cima da mesa. João Dias pretendia ser recebido por Paulo Tadeu, mas acabou preso pela segurança interna do Palácio do Buriti.


João Dias presta depoimento na delegacia


João Dias presta depoimento na 5ª Delegacia de Polícia, no Setor Bancário Norte.


O policial militar tentou invadir nesta tarde o gabinete do secretário de Governo, Paulo Tadeu. João Dias entrou pelo anexo do Palácio do Buriti sem ter sido notado.


Segundo testemunhas, ele teria pichado com um monte de palavrões a lataria de um carro que seria de Paulo Tadeu. A assessoria do governo, no entanto, não confirma a informação.


Já na ante-sala do gabinete de Paulo Tadeu, o policial militar disse que precisava ser atendido pelo secretário. Mas Paulo Tadeu estava em reunião na Residência Oficial de Águas Claras. Muito exaltado, com um saco de dinheiro vivo na mão e sem conseguir o que queria, ele agrediu duas servidoras (Niedja e Paulinha) do Palácio do Buriti.


Segundo testemunhas, Niedja teria levado um soco no rosto.


A polícia do Palácio foi acionada e um dos seguranças teria também se machucado (quebrado um dedo) ao tentar conter João Dias.


Assessores de Paulo Tadeu estão reunidos neste momento no gabinete do secretário. Em breve vão divulgar uma nota oficial sobre o episódio.


João Dias foi o delator de um suposto esquema de corrupção envolvendo o programa Segundo Tempo do governo federal e ONGs ligadas ao PCdoB. O escândalo derrubou Orlando Silva do Ministério dos Esportes e acabou respingando no governador Agnelo Queiroz que, quando era do PCdoB e ocupava o cargo de ministro dos Esportes, criou o programa Segundo Tempo.


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Notas da Secretaria de Comunicação do GDF


A equipe de segurança do Palácio do Buriti teve que retirar do prédio na tarde de hoje o policial militar João Dias após ele agredir duas servidoras da Secretaria de Estado de Governo.


João Dias teve que ser contido pelos seguranças já que apresentava comportamento agressivo e foi encaminhado à Polícia Civil, que tomará as medidas legais pertinentes ao caso.


Quanto ao secretário de Governo, Paulo Tadeu, ele não se encontrava no Palácio durante o episódio. O secretário e outras autoridades do GDF participavam de reunião com os governadores do Centro-Oeste na Residência Oficial de Águas Claras.


A segurança do Palácio do Buriti abriu procedimento para apurar como se deu o acesso de João Dias ao Préio. O Governo do Distrito Federal também vai apurar com que objetivos escusos o policial apareceu nesta tarde de forma despropositada no Palácio do Buriti.


Complemento


A Polícia Civil do Distrito Federal informou que, após ser preso no Palácio do Buriti e conduzido à 5ª Delegacia de Polícia, João Dias foi autuado pelos crimes de injúria, por insultar de forma racista uma das servidoras, e pelo menos duas lesões corporais, contra a outra funcionária e um policial militar em serviço da equipe de segurança do Palácio.


Ao término da autuação na delegacia, João Dias será encaminhado à Corregedoria da Polícia Militar.


A Polícia Civil informou ainda que foram recolhidas na Secretaria de Governo cédulas de dinheiro que João Dias teria jogado sobre a mesa das servidoras, que reagiram contra a agressão e absurda situação. As notas serão periciadas pelo Instituto de Criminalística da Polícia Civil, que vai apurar a origem do dinheiro.


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Nota da Polícia Civil do DF


A Polícia Civil do DF informa que nesta data foi lavrado, na 5ª DP, auto de prisão em flagrante em razão da prisão do policial militar João Dias, o qual cometeu os crimes de injúria de cunho racial, lesão corporal e vias de fato, no interior do Palácio do Buriti.


No local, foi arrecadada pelo Instituto de Criminalística da PCDF a quantia de R$ 159 mil reais, em espécie, a qual será encaminhada à Divisão Especial de Repressão ao Crime Organizado (DECO), visando apurar a sua origem.


Após as oitivas de todos os envolvidos, encaminhamento das vítimas ao IML e demais providências legais cabíveis, todos serão liberados.O autuado, após o pagamento de fiança arbitrada, será liberado e conduzido pela Polícia Militar para a adoção das providências administrativas cabíveis, em razão da sua condição de militar.