Caso Palocci muda postura de Dilma e prenuncia novos rumos
Agravamento da situação do chefe da Casa Civil, Antonio Palocci, obriga Dilma Rousseff a assumir relação com aliados, para reconstruí-la, aumentar exposição e liberar equipe para produzir notícias. Interlocutor amistoso dos meios de comunicação, ministro surpreendeu-se com tamanho do noticiário sobre suspeita de enriquecimento ilícito. Presidenta manda blindá-lo, mas permanência de Palocci é incerta.
BRASÍLIA – Os partidos adversários do governo começaram, nesta segunda-feira (23/05), a colher assinaturas de deputados e senadores com o objetivo de criar uma CPI para investigar o chefe da Casa Civil, Antonio Palocci, cuja evolução patrimonial nos últimos quatro anos levanta suspeitas de enriquecimento ilícito. Nesta terça-feira (24/05), depois de ter fracassado na Câmara, a oposição tentará obrigar Palocci a comparecer ao Senado para explicar a fortuna.
A ordem da presidenta Dilma Rousseff aos aliados continua sendo “barrar toda e qualquer investida contra o ministro”. Mas o caso agravou-se de maneira inesperada por Dilma e Palocci, e jogar as fichas na permanência do chefe da Casa Civil é hoje uma aposta de alto risco. A troca dele pode ser o desfecho de um processo que já impõe mudanças à rotina do governo, expõe falhas em estratégias adotadas pelo Palácio do Planalto e força uma repactuação da relação presidencial com partidos a parlamentares aliados que terá impacto nos rumos da gestão Dilma.
Um sinal da alteração de hábitos do governo foi a publicação, nesta segunda-feira (23/05), de medida provisória (MP) que corta impostos para quem fabricar tablets (uma espécie de laptop em formato de livro) no Brasil. O governo negocia desde o início do ano a instalação de uma empresa chinesa (Foxxconn) no país, para fabricar o equipamento, mas a benesse fiscal foi apressada para que a imprensa tenha uma notícia positiva.
A viagem de Dilma a Salvador na véspera, um domingo, mesmo sem estar 100% recuperada de uma pneumonia, para assistir a uma beatificação, também foi um movimento planejado para virar notícia pelo menos simpática à presidenta.
Pouco afeita a aparições públicas e com antipatia por entrevistas de ministros e auxiliares deles, a presidenta reconhece, hoje, que o enfrentamento político do constrangimento causado por Palocci depende, em boa medida, de o governo produzir notícias com mais frequência.
“Não existe uma agenda clara do governo, e a Dilma e o Palocci são culpados por isso. O espaço político acaba sendo ocupado por fatos como esse”, diz Fabiano Guilherme Santos, presidente da Associação Brasileira de Ciência Política e professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ).
Jogo duro
A ordem da presidenta Dilma Rousseff aos aliados continua sendo “barrar toda e qualquer investida contra o ministro”. Mas o caso agravou-se de maneira inesperada por Dilma e Palocci, e jogar as fichas na permanência do chefe da Casa Civil é hoje uma aposta de alto risco. A troca dele pode ser o desfecho de um processo que já impõe mudanças à rotina do governo, expõe falhas em estratégias adotadas pelo Palácio do Planalto e força uma repactuação da relação presidencial com partidos a parlamentares aliados que terá impacto nos rumos da gestão Dilma.
Um sinal da alteração de hábitos do governo foi a publicação, nesta segunda-feira (23/05), de medida provisória (MP) que corta impostos para quem fabricar tablets (uma espécie de laptop em formato de livro) no Brasil. O governo negocia desde o início do ano a instalação de uma empresa chinesa (Foxxconn) no país, para fabricar o equipamento, mas a benesse fiscal foi apressada para que a imprensa tenha uma notícia positiva.
A viagem de Dilma a Salvador na véspera, um domingo, mesmo sem estar 100% recuperada de uma pneumonia, para assistir a uma beatificação, também foi um movimento planejado para virar notícia pelo menos simpática à presidenta.
Pouco afeita a aparições públicas e com antipatia por entrevistas de ministros e auxiliares deles, a presidenta reconhece, hoje, que o enfrentamento político do constrangimento causado por Palocci depende, em boa medida, de o governo produzir notícias com mais frequência.
“Não existe uma agenda clara do governo, e a Dilma e o Palocci são culpados por isso. O espaço político acaba sendo ocupado por fatos como esse”, diz Fabiano Guilherme Santos, presidente da Associação Brasileira de Ciência Política e professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ).
Jogo duro
A discrição natural de Dilma foi aproveitada pelo chefe da Casa Civil para se fortalecer, tomando à frente das relações com o Congresso e os partidos. Com aval da presidenta, Palocci vinha adotando uma estratégia de “jogo duro” com aliados que ele mesmo acredita estar na origem da notícia de que comprou apartamento de R$ 6,6 milhões, multiplicando seu patrimônio por vinte.
O ministro evitava abrir o gabinete a políticos em busca de nomeações de apadrinhados para cargos públicos, inclusive do seu partido, o PT. Para impedir a reação dos ignorados, decidiu que o governo tentaria só precisar do Congresso em votações de grandes temas estruturais, como a reforma política.
“A Dilma tem um deficiência importante, que é a pouca penetração junto ao PT e ao Congresso. Ela é um milagre do Lula. O Palocci supria essa deficiência. Mas, com ele enfraquecido, alguma repactuação [da presidenta] com os aliados vai ser necessária”, afirma o cientista político Fabio Wanderley Reis, professor emérito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Fogo amigo e novas relações
Nos bastidores, Dilma e Palocci acham que o episódio nasceu exatamente para que haja repactuação com aliados, mesmo que depois tenha adquirido uma dinâmica própria alimentada pelo interesse natural dos adversários de desgastar o governo e por jornalistas atrás de notícias. O ministro, aliás, surpreendeu-se com o tamanho do noticiário a seu respeito, pois achava que sua convivência amistosa com os veículos de comunicação desestimularia-os de dar tanto espaço ao caso.
Três dias depois de ter sido publicada a primeira reportagem contra Palocci, a presidenta recebeu, para um almoço no Palácio da Alvorada, o presidente nacional do PT, Rui Falcão. Nem bem havia assumido o comando do partido, no início de maio, Falcão já declarava que sua primeira tarefa seria negociar 104 indicações petistas para cargos no governo. A lista dos apadrinhados fora enviada a Palocci, que a deixara engavetada.
Maior partido governista ao lado do PT, o PMDB tinha insatisfação semelhante. O líder do partido na Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN), só conseguiu falar uma vez com Dilma até agora, ao pegar carona numa audiência da governadora do seu estado, Rosalba Ciarlini, com a presidenta, em fevereiro. Sem conseguir ser atendido por Palocci, o PMDB vinha recorrendo ao vice-presidente, Michel Temer, que é peemedebista, para tentar emplacar seus pleitos.
“A Dilma vai ter que se dedicar muito mais à política propriamente dita, em vez de delegar isso. Sendo ou não do seu perfil, ela não pode ficar eternamente dependente do Palocci e do Temer”, afirma o cientista político João Paulo Peixoto, da Universidade de Brasília (UnB). Para ele, mesmo que não tenha começado como “fogo amigo”, o caso já permite que “amigos” tirem proveito. “O poder é extremamente atraente, não existe vácuo. Com o Palocci fraco, os adversários dele dentro e fora do governo tentarão ocupar esse espaço.”
A luta para ocupar o espaço decorrente do enfraquecimento do chefe da Casa Civil - com ou sem ele no cargo - será determinante para os rumos que o governo Dilma Rousseff terá daqui para frente. (André Barrocal – CM)
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O caso dos bebês enjeitados
O que a imprensa pode fazer – além de noticiar – para ajudar a diminuir o número de crianças recém-nascidas abandonas pelas mães? Essa é a pergunta que fica depois da leitura de um longo artigo publicado pelo jornal O Estado de S. Paulo no domingo (15/5):
"Foi mais uma semana de crianças abandonadas, inclusive por grande parte da mídia. Na quarta-feira, um catador de lixo encontrou um bebê morto perto de um hipermercado em São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo. Ele procurava latinhas de alumínio quando se deparou com um embrulho de pano inerte entre uma dezena de sacolas não recicláveis. Já na quinta-feira, um homem que cochilava numa igreja evangélica de Manaus foi acordado por outro que ouvira um choro de criança vindo do palco. Os dois acharam uma menina com menos de 12 horas de vida e mais de 3 quilos de peso, também envolta em manta de algodão, que, uma vez na Maternidade Ana Braga, referência em gestações de alto risco, foi batizada de Felícia. Felícia Ana Braga" (O Estado de S. Paulo, 15/5/2011).
Ao dedicar uma página inteira para que a demógrafa Elza Berquó discutisse o abandono de crianças recém-nascidas, o Estadão ainda não tinha recebido mais uma notícia de abandono, registrada pelo UOL no mesmo domingo (15):
"Um bebê foi abandonado na noite de ontem (14/5) dentro de uma sacola plástica, na rua Diadema, em Rio Grande da Serra, na Grande São Paulo. A mãe da criança não foi encontrada. O bebê foi encontrado por uma moradora, por volta das 22h40. Segundo a Polícia Militar, a mulher afirmou que ouviu o choro da criança quando chegou em sua residência e passava pelo quintal. Ela então seguiu o som e encontrou o bebê – do sexo masculino – dentro de uma sacola. A moradora chamou a PM, que encaminhou o menino para o Hospital São Lucas, em Ribeirão Pires, também na Grande São Paulo. A criança, que ainda estava com o cordão umbilical, foi medicada. O Conselho Tutelar também foi acionado."
"Mulher desalmada"
A verdade é que o abandono de crianças recém-nascidas sempre cria comoção, especialmente quando explorado pelos programas policiais vespertinos na televisão. Apresentadores sensacionalistas tentam comover o público com sua indignação, condenam as mães e esquecem o assunto até acontecer de novo. E, como se viu na abertura do artigo publicado pelo Estado de S. Paulo, tiveram muito que falar na semana passada.
Poucas emissoras de TV e jornais, no entanto, reservam espaço para discutir o assunto com seriedade, buscando causas e tentando descobrir soluções para evitar que as mulheres – as grandes culpadas (por engravidar e depois por abandonar o bebê) voltem a agir de forma tão bárbara. Claro que a imprensa não está aí para resolver problemas de saúde pública, educação sexual e assistência materna. Mas poderia, sem dúvida, cobrar soluções do poder público, começando por abrir um sério debate sobre o tema.
Foi isso que fez o Estadão ao dar espaço para a demógrafa Elza Berquó:
"O abandono de crianças no Brasil tem um nome: desespero. Seguido de uma extensa gama de sobrenomes, entre eles falta de escolaridade, falta de informação, falta de acesso aos métodos contraceptivos, falta de apoio e falta de humanidade... Não tenho informação sobre a idade dessas mães que abandonaram os filhos nem sobre o número de crianças que já possuem. Certamente são pessoas mais desfavorecidas socialmente, mas não é só a questão financeira. É uma constelação de fatores. Considero este um momento de total desespero, de não saber o que fazer. É com grande sofrimento que as mulheres praticam esse abandono. Claro que, na hora, a gente se liga àquela criança. Mas onde essa mãe vai deixar o filho? No Conselho Tutelar? Não é assim. Esbravejam: é uma mulher desalmada. Isso é uma forma muito pouco humana de olhar para a situação dela."
Funções da imprensa
Uma coisa é certa: a imprensa sensacionalista não tem direito de explorar esse tipo de situação – condenando sem perguntar antes – em nome do ibope. Se não há espaço para debate, para tentar ajudar, não deveria haver espaço para a exploração da miséria alheia. Essas mães desesperadas deveriam merecer da mídia o mesmo tratamento dado ao casal de Curitiba – o dos trigêmeos – que não queria levar os três filhos para casa e acabou, até onde foi divulgado, ficando sem nenhum. Com dinheiro para contratar um advogado, o casal virou notícia, mas conseguiu manter sua identidade protegida. Bem mais do que acontece com as mulheres pobres que acabam detidas ou obrigadas prestar depoimento em delegacias – vistas e condenadas pelo público espectador de programas sensacionalistas.
Se os programas sensacionalistas – que têm boa aceitação entre o público mais carente – dedicassem mais espaço ao esclarecimento sobre os serviços à disposição de todos (como o fornecimento de pílulas do dia seguinte pelo SUS, ou acompanhamento de futuras mães) poderiam até perder ibope com casos de bebês abandonados, mas estariam cumprindo pelo menos uma das funções da imprensa, que é a de informar. (Por Ligia Martins de Almeida - OI)
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Cultura: mercadoria ou bem comum?
Todo o programa neoliberal, assim como o diagnóstico que levou a ele, pode ser sintetizado em um ponto: desregulamentar. O diagnóstico de por que a economia tinha parado de crescer, depois do ciclo mais longo de expansão capitalista no segundo pos-guerra, se centrou no suposto excesso de regulamentação. O capital se sentiria inibido para investir, por estar cerceado por excesso de normas, leis, políticas, que bloqueariam a “livre circulação do capital”.
Chegado ao governo, o neoliberalismo se pôs a privatizar patrimônio público, a diminuir o tamanho do Estado, a abrir as economias nacionais ao mercado internacional, a “flexibilizar” as relações de trabalho, entre tantas outras medidas padrão codificadas no chamado Consenso de Washington e colocadas em prática por governos às vezes com origens ideológicas distintas, mas todos rendidos ao “pensamento único”. Todas elas são formas de desregulamentação, de retiradas de supostos obstáculos à circulação do capital.
Quando se privatizam empresas, se está levantando obstáculos para que o capital privado se aproprie delas, se está desregulamentando o mercado de propriedade de empresas. Quando se aceita a não obediência a normas básicas da legislação do trabalho para contratar trabalhadores, se está desregulamentando o mercado de trabalho. Assim para todas as medidas do receituário neoliberal.
Promoveu-se assim, rapidamente, o maior processo de concentração de riqueza que tínhamos conhecido, tanto a nível nacional, quanto mundial. Sem proteções dos Estados, os mais frágeis, os mais pobres – a grande maioria de cada sociedade, em especial as periféricas, - se viram indefesos diante das ofensivas do capital e dos Estados centrais do capitalismo.
Direitos, como aqueles à educação e à saúde, foram deixando de ser direitos para se transformar em mercadorias, compráveis no mercado. Quem tem mais recursos, compra mais e melhor, em detrimento de quem não tem. Riquezas naturais, como a água passaram a ser mercadoras, compradas e vendidas.
O Estado, principalmente nas suas funções reguladoras – de afirmação dos direitos contra a voracidade do capital – passou a ser vítima privilegiada dos ataques neoliberais, pregando-se o “Estado mínimo” e a primazia do mercado, isto é, da concorrência feroz, em que os mais fortes e mais ricos ganham sempre.
Até a cultura foi vítima de um grande embate, para definir se se trata de uma mercadoria mais ou de um bem comum. Do ponto de vista institucional o debate se deu para definir se a cultura deveria ser objeto da Organização Mundial do Comércio (OMC) e, portanto, uma mercadoria a mais, ou no âmbito da Unesco, considerada como patrimônio da humanidade, como bem comum, com as devidas proteções. Terminou triunfando esta segunda versão – apesar da brutal oposição e pressão dos EUA, que chegaram a se retirar da Unesco.
Foi um momento muito importante de resistência ao neoliberalismo, que queria reduzir também a capacidade de cada povo, de cada nação, de cada setor da sociedade, de afirmar suas identidades específicas, dissolvidas pela globalização. Queriam desregulamentar também a cultura, deixá-la ao sabor das relações de mercado, sem proteção de regulações estatais.
Mas o embate não terminou por aí, porque o poder avassalador dos capitais privados, nacionais e internacionais, é um fluxo permanente, cotidiano, buscando expandir seu poder de mercantilização. As TVs públicas, por exemplo, se debilitam no seu papel diferenciado dos mecanismos de mercado que regem as TVs privadas, enfraquecidas pela falta de financiamento, apelam ao mercado e induzem seus mecanismos – como aconteceu tristemente com a TV Cultura de São Paulo.
Programas como o de Pontos de Cultura, do MINC, surgiram na contramão dessa lógica homogeneizadora da globalização na esfera cultural, buscando incentivar e proteger todas as formas de diversidade de cultural, de afirmação da heterogeneidade das identidades de setores sociais, étnicos, regionais, diferenciados.
Muitos outros debates atuais hoje no Brasil – o dos Commons, da propriedade intelectual, dos direitos de autor – são também objeto de duas concepções diferenciadas, uma regulamentadora – anti-neoiberal – outra desregulamentadora, neoliberal, mercantilizadora. No marco mais geral do embate entre neoliberalismo e posneoliberalismo, é que a natureza das posições fica mais clara. Por um lado, as normas protetoras que consideram a cultura como um bem comum, de outro, a desregulamentação, que a consideram uma mercadoria como outra qualquer. Do seu desenlace depende a natureza da cultura no Brasil na segunda metade do século XXI. (Emir Sader)
Chegado ao governo, o neoliberalismo se pôs a privatizar patrimônio público, a diminuir o tamanho do Estado, a abrir as economias nacionais ao mercado internacional, a “flexibilizar” as relações de trabalho, entre tantas outras medidas padrão codificadas no chamado Consenso de Washington e colocadas em prática por governos às vezes com origens ideológicas distintas, mas todos rendidos ao “pensamento único”. Todas elas são formas de desregulamentação, de retiradas de supostos obstáculos à circulação do capital.
Quando se privatizam empresas, se está levantando obstáculos para que o capital privado se aproprie delas, se está desregulamentando o mercado de propriedade de empresas. Quando se aceita a não obediência a normas básicas da legislação do trabalho para contratar trabalhadores, se está desregulamentando o mercado de trabalho. Assim para todas as medidas do receituário neoliberal.
Promoveu-se assim, rapidamente, o maior processo de concentração de riqueza que tínhamos conhecido, tanto a nível nacional, quanto mundial. Sem proteções dos Estados, os mais frágeis, os mais pobres – a grande maioria de cada sociedade, em especial as periféricas, - se viram indefesos diante das ofensivas do capital e dos Estados centrais do capitalismo.
Direitos, como aqueles à educação e à saúde, foram deixando de ser direitos para se transformar em mercadorias, compráveis no mercado. Quem tem mais recursos, compra mais e melhor, em detrimento de quem não tem. Riquezas naturais, como a água passaram a ser mercadoras, compradas e vendidas.
O Estado, principalmente nas suas funções reguladoras – de afirmação dos direitos contra a voracidade do capital – passou a ser vítima privilegiada dos ataques neoliberais, pregando-se o “Estado mínimo” e a primazia do mercado, isto é, da concorrência feroz, em que os mais fortes e mais ricos ganham sempre.
Até a cultura foi vítima de um grande embate, para definir se se trata de uma mercadoria mais ou de um bem comum. Do ponto de vista institucional o debate se deu para definir se a cultura deveria ser objeto da Organização Mundial do Comércio (OMC) e, portanto, uma mercadoria a mais, ou no âmbito da Unesco, considerada como patrimônio da humanidade, como bem comum, com as devidas proteções. Terminou triunfando esta segunda versão – apesar da brutal oposição e pressão dos EUA, que chegaram a se retirar da Unesco.
Foi um momento muito importante de resistência ao neoliberalismo, que queria reduzir também a capacidade de cada povo, de cada nação, de cada setor da sociedade, de afirmar suas identidades específicas, dissolvidas pela globalização. Queriam desregulamentar também a cultura, deixá-la ao sabor das relações de mercado, sem proteção de regulações estatais.
Mas o embate não terminou por aí, porque o poder avassalador dos capitais privados, nacionais e internacionais, é um fluxo permanente, cotidiano, buscando expandir seu poder de mercantilização. As TVs públicas, por exemplo, se debilitam no seu papel diferenciado dos mecanismos de mercado que regem as TVs privadas, enfraquecidas pela falta de financiamento, apelam ao mercado e induzem seus mecanismos – como aconteceu tristemente com a TV Cultura de São Paulo.
Programas como o de Pontos de Cultura, do MINC, surgiram na contramão dessa lógica homogeneizadora da globalização na esfera cultural, buscando incentivar e proteger todas as formas de diversidade de cultural, de afirmação da heterogeneidade das identidades de setores sociais, étnicos, regionais, diferenciados.
Muitos outros debates atuais hoje no Brasil – o dos Commons, da propriedade intelectual, dos direitos de autor – são também objeto de duas concepções diferenciadas, uma regulamentadora – anti-neoiberal – outra desregulamentadora, neoliberal, mercantilizadora. No marco mais geral do embate entre neoliberalismo e posneoliberalismo, é que a natureza das posições fica mais clara. Por um lado, as normas protetoras que consideram a cultura como um bem comum, de outro, a desregulamentação, que a consideram uma mercadoria como outra qualquer. Do seu desenlace depende a natureza da cultura no Brasil na segunda metade do século XXI. (Emir Sader)
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Todo o terrorismo midiático sobre o retorno iminente da inflação tem objetivos marotos. Visa defender os interesses do capital, em especial da oligarquia financeira. Para manter seus altos rendimentos, os neoliberais pregam, na maior caradura, a retirada de direitos dos trabalhadores. A mídia rentista cumpre o papel de bater o bumbo!
Dois ataques estão em curso. O primeiro é contra o salário mínimo. A mesma mídia que criticou as centrais sindicais por exigirem um aumento maior em 2011 – acusando-as de “romperem acordos” –, agora prega um reajuste menor em 2012. A desculpa é que o aumento previsto provocará a indexação dos preços, elevando a inflação. Contra os trabalhadores, a mídia defende a manutenção do acordo; já quando o acordo beneficia os trabalhadores, ela defende que seja rasgado. É muito cinismo!
Terceira reforma da Previdência
O segundo ataque também já está no forno. É por uma terceira fase da “reforma” da Previdência. A mídia, a serviço da oligarquia financeira, defende o aumento do tempo de aposentadoria e das contribuições previdenciárias. Em seu editorial de hoje (23), a Folha volta a bater nesta tecla – retomando velhas teses neoliberais.
O conteúdo é o mesmo; o invólucro é que muda. Desta vez, a Folha cita os exemplos da Europa para justificar o ataque. Afirma que no velho continente, devido à grave crise econômica, o tempo de aposentadoria já é mais elevado. Só não explica que a crise não decorre das pensões e aposentadorias, mas sim dos socorros bilionários aos especuladores – que já quebraram as economias da Grécia, Irlanda, Portugal e que contaminam outras nações européias.
Merkel, a heroína neoliberal
Marota, a Folha relata que Angela Merkel, premiê da Alemanha, exige que os países mais abalados pela crise elevem o tempo das aposentadorias para terem acesso a novos empréstimos. A medida, obviamente, esbarra em forte resistência – é uma das razões principais das greves recorrentes na Grécia e da atual onda de protesto na Espanha. Mesmo assim, a Folha afirma que este é o caminho. “Toda proposta de mudança no sistema previdenciário costuma trazer sério risco para a popularidade dos políticos”.
Tendo a neoliberal Merkel como heroína do deus-mercado, a Folha sugere a mesma “coragem” à presidenta Dilma e elogia o novo ministro da Previdência. “Garibaldi Alves Filho acerta ao colocar o tema em discussão. Ele propõe um plano para elevar a 65 anos a idade mínima. A regra valeria só para quem começar a trabalhar após a mudança”.
Alerta ao sindicalismo
A única ressalva à proposta do ministro é que ela ainda manteria o diferencial entre os sexos. “A expectativa de vida das mulheres é superior à dos homens. Parece recomendável, do ponto de vista econômico, a extinção desse diferencial no limite de idade”.
Como se observa, o salário mínimo e as aposentadorias estão no alvo da mídia neoliberal. O sindicalismo precisa ficar bem atento. Prepara-se uma nova ofensiva contra os direitos dos trabalhadores! (Altamiro Borges)
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Assassinato de Bin Laden é peça publicitária para eleições nos EUA, diz historiadora
Uma pesquisa de opinião realizada após o anúncio da morte de Osama Bin Laden indicou um crescimento de 11% da popularidade do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama. O líder da rede Al Qaeda se tornou o homem mais procurado do mundo após assumir a autoria dos atentados que vitimaram cerca de três mil pessoas em 11 de setembro de 2001.
A professora Maria Aparecida Aquino, do Departamento de História da Universidade de São Paulo (USP), em entrevista à Radioagência NP, classifica a ação militar dos EUA como execução sumária e acredita se tratar de uma “peça eleitoreira”. Ela lembra que até mesmo os criminosos nazistas tiveram direito a um julgamento ao serem submetidos ao Tribunal de Nuremberg (1945-1946), na Alemanha.
Além de violar o direito de defesa, as decisões de Washington desrespeitaram a soberania do Paquistão ao determinar a invasão do espaço aéreo e terrestre sem o consentimento das autoridades do país. A professora condena as práticas de tortura que indicaram a localização do esconderijo e avalia que, no plano geopolítico, os EUA se comportam como se estivessem no faroeste.
Radioagência NP: Professora, como a senhora avalia a ação militar que resultou na morte de Osama Bin Laden?
Maria Aparecida Aquino: É um assassinato sumário. E ninguém, principalmente no plano das relações internacionais, tem direito disso. Então, está se criando uma situação em relação ao Paquistão extremamente grave. Porque não ocorreu simplesmente a morte de um indivíduo que naquele momento não tinha defesa, sem direito a um julgamento. Ocorreu ainda a invasão do espaço aéreo e do espaço terrestre de outro país. O Paquistão agora afirma com todas as letras que não tinha conhecimento algum. Afinal de contas, se o presidente dos Estados Unidos vai a público e mente para o mundo inteiro, isso é tão grave, tão sério.
RNP: A narrativa oficial é uma peça publicitária para as eleições presidenciais do próximo ano?
MAA: O presidente George W. Bush, quando se elegeu pela primeira vez, era colocado em dúvida se ele de fato teria vencido porque parece que teria ocorrido alguma fraude eleitoral. Aí, veio o 11 de Setembro de 2001. Por conta disso, ele não só ganha legitimidade, como consegue se reeleger. Eu lamento tentar fazer qualquer comparação, é muito grave chegarmos a esse ponto, mas o presidente Obama estava com a popularidade em baixa e de lá [morte do Bin Laden] para cá a popularidade dele subiu. Então, passa também a ser considerado como uma peça eleitoreira.
RNP: Como os EUA deveriam ter agido?
MAA: Em qualquer situação democrática, se tem alguém que cometeu um crime, você não executa essa pessoa, você a submete a um Tribunal. Por mais criminosos que os nazistas foram, eles foram submetidos ao Tribunal de Nuremberg. O mundo inteiro assistiu ao julgamento. Houve um julgamento. O próprio Adolf Eichmann [diretor do Escritório de Assuntos Judeus do regime nazista de Adolf Hitler], considerado um dos maiores criminosos nazistas, quando foi recuperado – digamos sequestrado – pelo comando israelense na Argentina, foi julgado em Israel.
RNP: O presidente Obama declarou que “a justiça foi feita”. Comente.
MAA: É a justiça do saloon. Eu sempre vejo faroeste com aquele barzinho onde todos se reúnem – bandidos e não bandidos. Eu vejo passar o cara armado (os Estados Unidos estão sempre armados, é uma sociedade militarizada, onde todos têm armas). Então, eu vejo passar o sujeito armado e a portinha vai e vem. De repente, duas pessoas se estranham e um atira no outro e fica por isso mesmo. Os Estados Unidos vivem a justiça do saloon. E não é assim. Nós estamos num mundo que tem outras regras civilizatórias
RNP: Como o mundo recebeu a notícia da morte de Bin Laden?
MAA: Fica para trás o crime que ele – não sozinho, mas a Al Qaeda – teria cometido. Extremamente grave. O mundo inteiro se condoeu. Todo mundo dá direito de justiça às vitimas. Ninguém diz que a Al Qaeda estava correta, mas a maneira como os EUA agiram faz com que você esqueça o terror que foi o 11 de Setembro e passe a pensar no terror que foi instaurado agora. Quando eles dizem “o mundo está mais seguro”, seguro para quem? Quem é que está mais seguro agora?
RNP: Qual sua avaliação sobre o fato do corpo ter sido jogado no mar?
MMA: É necessário que se tenha o corpo, com todas as condições que se possa imaginar. E não estou nem falando de não terem obedecido à regra Mulçumana, não estou entrando nesse detalhe. A coisa mais absurda que existe é você imaginar que o corpo foi jogado no mar. Que justificativa tem para isso? Foi tudo coordenado de forma a deixar mais dúvidas do que esclarecimentos. O país que se diz guardião da democracia quebrou todas as regras democráticas.
RNP: As informações sobre a localização do esconderijo foram obtidas mediante tortura. Isso é um agravante?
MMA: Já foi exibido inúmeras vezes o que acontece em Guantánamo [Cuba] e causa horror em todas as pessoas. Todos os países que viveram a experiência da tortura sabem como é terrível se libertar desse mal. E também não se tem muita ideia, quando você vive num ambiente como esse que permite a tortura, como isso está destruindo a própria população. Se você permite a tortura, você diminui como ser humano e como civilização. Não interessa se você está torturando uma pessoa que é criminosa. Nenhuma Constituição do mundo – democrática – admite a tortura. (Jorge Américo - Radioagência)
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Oxi: Nova droga ainda mais destrutiva que o crack
Com aparência e efeitos muito próximos ao do crack, a droga conhecida como oxi, ou oxidado, está chegando em diversos estados do Brasil. As primeiras notícias do seu consumo foram no estado do Acre, na Região Norte do país. Na sua composição podem ser encontrados – além da cocaína, como no crack – cal virgem, querosene e gasolina. Em algumas amostras foram encontrados solventes químicos.
A preocupação com essa nova droga se deve ao fato de ser mais tóxica e mais barata do que o crack. Isso pode influenciar no aumento do consumo e o número de mortes que esse tipo de droga causa. O oxi pode ser encontrado a partir de R$ 2, valor abaixo que o do crack.
Para debater o assunto, a Radioagência NP entrevistou o diretor do Centro Brasileiro de Informação sobre Drogas Psicotrópicas (Cebrid) e professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Elisaldo Carlini. Ele defende que o uso do crack e do oxi precisa ser tratado como um problema social, e não de saúde pública.
Radioagência NP: Prof. Elisaldo, quais são as semelhanças e diferenças entre o oxi e o crack?
Elisaldo Carlini: Tanto o oxi quanto o crack estão sob a forma da chamada cocaína básica. A única forma de fazer com que a cocaína básica chegue até o organismo humano é através de fumar. E essa cocaína é absorvida muito rapidamente através do pulmão, e em cinco a dez segundos já está fazendo seu efeito. Agora pode haver diferenças de impurezas. Por exemplo, o oxi é mais tóxico porque ele é feito a partir de cal virgem, querosene ou gasolina. Quando o indivíduo vai fumar o oxi, ele pode estar fumando a cocaína básica e mais impurezas. E as impurezas do crack são menores.
RNP: E quais são os efeitos provocados por essas drogas nos usuários?
EC: A pessoa perde totalmente o apetite e apresenta uma insônia muito persistente. Isto acaba com qualquer organismo em três ou quatro dias. Além do mais, produz efeitos psíquicos muito claros: inquietação, nervosismo e pode chegar a produzir sintomas de uma pseudo-psicose, chamada psicose cocaínica. Pode ter delírios e alucinações. O que normalmente as pessoas descrevem é que a primeira “pipada” [tragada da droga] dá uma sensação de extraordinário prazer. E eles procuram constantemente repetir esse “tuim” [efeito de prazer], que cada vez fica mais difícil.
RNP: E quanto aos problemas causados no longo prazo?
EC: O continuar do uso é que é o grande problema. Se o oxi foi feito com gasolina, com querosene, quantas porcarias se têm? Então, se tem reações tóxicas secundárias, que são devidas aos problemas das contaminações. Pode levar a problemas no fígado, pode irritar a mucosa brônquica e pode anestesiar a boca, a mucosa da boca. Não percebendo isso, ele pode ter fissuras nos lábios, e passando essa latinha de boca em boca, ele pode se contaminar e contaminar os outros. E o outro aspecto também é o processo da degeneração social. As pessoas fazem de tudo, como roubo e a prostituição de ambos os sexos.
RNP: Pode ser traçado um perfil do usuário de oxi?
EC: Do oxi eu não conheço, mas pelas fotos e descrições que eu vi, não tem muita separação. Atinge várias classes sociais, antigamente eram os mais pobres, não é mais. Aqui em São Paulo e Rio de Janeiro pelo menos, nem em Pernambuco. Começa a atingir mais as classes médias. São jovens, eu não conheço nenhum caso de adultos. E quase todos, quando começam, eles não param. E eles atingem uma degradação muito grande, o aspecto físico é lamentável. É um perfil comum do usuário fim de linha, como a gente chama.
RNP: Na opinião do senhor, como o debate sobre o problema do crack e agora do oxi deveria ser feito na sociedade?
EC: Temos que pensar aqui que não é um problema de saúde pública, mas um problema de prevenção. Fazer uma prevenção para evitar que a pessoa chegue até o crack. Segundo lugar, o usuário de crack já perdeu seus elos sociais, familiares, de emprego, situação econômica, amizade. Ele está praticamente isolado do mundo. Se ele se trata e consegue se curar, ele volta pra onde? Ele volta pra uma família que já o rejeitou? Ninguém confia nele para um emprego. Os amigos já foram embora. Ele é jogado de volta exatamente na condição em que ele estava. Teria que haver um programa muito sério de reabilitação social, de procurar um reemprego, ensinar uma profissão, fazer com que ela possa ser reaceita em uma escola. Enfim, fazer com que ele passe a ter um novo ambiente social. (Vivian Fernandes - Radioagência)
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A(s) histeria(s) da(s) crise(s)
Em tempos de bonança, as classes dominantes apregoam cinicamente que vivemos no melhor dos mundos. A própria burguesia, em sua infância revolucionária, nos idos do séc. 18, condenava os “excessos” da aristocracia e avocava para si os signos de equilíbrio, rigor e harmonia, cuja expressão estética mais conhecida foi a literatura árcade e a arte neoclássica em geral. Já em tempos de crise, não há lugar para o comedimento, como nos atesta o exuberante Barroco espanhol, síntese dos contrastes vividos pelo mundo ibérico após a unificação com os reis católicos Isabel e Fernando. Senhora formal de um império, mas empenhada nas mãos dos capitais estrangeiros, a monarquia viveu a tensão entre a miséria e a acumulação, o material e o espiritual, o lixo e o luxo... Não por acaso, tamanha inquietude iria gerar um dos símbolos mais notáveis de suas letras: o “conquistador” Don Juan, sublimação última talvez da depressão que se estenderia até a perda de Cuba e Filipinas em 1898.
Nascia o império de Tio Sam, ainda sob o reinado da Inglaterra, e o “curto” século 20 passaria a vivenciar ciclos cada vez mais imprevisíveis de crise e distensão, amplificados, por fim, pelo processo de globalização neoliberal e a atual etapa biocibernética de acumulação de capital. Em tempos tão “voláteis”, um clima de permanente histeria parece incorporar-se à vida pública cotidiana. Como já dissera o sábio Karl Marx, tudo que é sólido se dissolve no ar... – e o risco de mais um colapso do sistema capitalista nas matrizes (e periferia) do G7 parece anuviar o sono de muitos governantes.
Contudo, quanto mais iminente a queda, maior a desfaçatez e ostentação das elites. Até aqui, nesta venal Bruzundanga, os historiadores recordam o fausto e a mesa farta dos “coronéis” nordestinos, quando os engenhos de cana ficaram de “fogo morto” no limiar do séc. 20. Pois esse é o clima atual, após a crise financeira global deflagrada pela bolha imobiliária dos EUA e acirrada por insólitos eventos ao redor do planeta. Que o diga o bom-mulato Obama, já em plena campanha para a sucessão em 2012: como não pode sanar a astronômica dívida pública de Tio Sam, nem evitar a incursão voraz dos chineses nos mercados alheios, trata de alimentar a histeria doméstica (e, se possível, a europeia), anunciando em tom épico o assassinato (?) de Bin Laden, cujo corpo, em “respeito às tradições muçulmanas” (!), teria sido lançado ao mar em menos de 24 h. (Pano rápido...)
Que semana alucinada essa, meus caros leitores! Eu já tivera de suportar a overdose midiática de mais um casamento da realeza britânica (uma reedição modernosa do velho conto da carochinha, com o príncipe e a plebeia), coberto ao vivo pelas principais redes de TV, assim como o vertiginoso processo de beatificação do Papa João Paulo II pelo Vaticano. Isso sem falar na feérica sanha de invasão da Líbia, cujo roteiro foi (mal) escrito a várias mãos por Obama, Sarkozy, Cameron, Berlusconi & Cia. (pode-se ler CIA, sem problemas). É bem verdade que, após a entrada da OTAN em cena (o bom-mulato não gosta de sujar as mãos...), a aventura tornou-se um trágico pastelão e até a Igreja protestou contra o genocídio provocado pelos célebres bombardeios “cirúrgicos” da ‘Aliança Militar’, de triste memória na Iugoslávia.
Se não bastasse tanta arritmia, o próprio futebol padeceu as sequelas dessa onda. Falo do duelo entre Real e Barcelona: em meio à aguda crise da Espanha (com altíssima taxa de desemprego e risco enorme de bancarrota), os madrilenhos evocaram seu passado franquista contra a Catalunha (bastião da causa republicana) e, sob as ordens do arrogante português Mourinho, têm atuado em clima de ‘Guerra Civil’ (até a Globo, ávida por espetáculos, abriu espaço em sua sagrada “grade” para a peleja). Cá na terra de Noel, avesso a tamanha bulha, torço discretamente pelos catalães, que, embora não estejam imunes à histeria do capital (o futebol, antes de tudo, é um colossal negócio), jogam como um samba de Paulinho da Viola, tocando a bola, como o marujo “que durante o nevoeiro leva o barco devagar”... (Luís carlos Leitão - Brasil de Fato)
Org.: Genaldo de Melo
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