Aos 18 anos de idade, ela respirou fundo e se preparou para morrer. Com pouca habilidade para nadar, a norueguesa Emma Martinovic pulou em um lago gelado, certa de que provavelmente afundaria antes de pisar na terra novamente. Mas o risco não foi apenas uma aventura ou uma brincadeira perigosa. A adolescente tentava fugir de Anders Behring Breivik, o homem que matou a tiros os participantes de um acampamento juvenil de verão do Partido Trabalhista norueguês, na ilha de Utoeya, no ultimo 22 de julho.
Arquivo pessoal
A estudante Emma Martinovic durante um evento do Partido Trabalhista da Noruega
Dos 69 mortos no ataque, 14 eram amigos próximos de Emma. Seis deles foram baleados na frente da estudante. Ela nadou para escapar da ilha e, embora tenha tido dificuldades para se salvar, ainda ajudou uma amiga e um menino desconhecido a fugir. Emma foi atingida no braço antes de ser resgatada pela tripulação de um barco. De todas as perdas e dificuldades que enfrentou, nada a impactou mais do que a lembrança do sorriso do terrorista enquanto atirava nas pessoas. Em entrevista ao Opera Mundi, Emma contou como se amparou na família e nos amigos para tomar fôlego entre uma braçada e outra naquele dia. Apesar do terror, ela diz se sentiu obrigada a continuar viva.
Como você percebeu que estava em meio a um tiroteio?
Eu meus amigos ouvimos o barulho e nos escondemos atrás de um morro. Não tínhamos como ver muita coisa de lá. Então começaram a chegar mensagens nos celulares, com perguntas sobre como era o atirador e se ele estava sozinho. Depois nos avisaram que era um homem vestido como policial e que ele estava vindo em nossa direção.
Primeiro eu rezei, mas tentei ao mesmo tempo acalmar os outros ao meu redor. Em seguida, enviei uma mensagem para o líder do movimento juvenil trabalhista. Ele disse que estava a salvo e eu perguntei o que deveria fazer, já que éramos quatro encurralados em um rochedo. A resposta foi simples e direta: “Nade!”
Arquivo pessoal
A estudante Emma Martinovic durante um evento do Partido Trabalhista da Noruega
Dos 69 mortos no ataque, 14 eram amigos próximos de Emma. Seis deles foram baleados na frente da estudante. Ela nadou para escapar da ilha e, embora tenha tido dificuldades para se salvar, ainda ajudou uma amiga e um menino desconhecido a fugir. Emma foi atingida no braço antes de ser resgatada pela tripulação de um barco. De todas as perdas e dificuldades que enfrentou, nada a impactou mais do que a lembrança do sorriso do terrorista enquanto atirava nas pessoas. Em entrevista ao Opera Mundi, Emma contou como se amparou na família e nos amigos para tomar fôlego entre uma braçada e outra naquele dia. Apesar do terror, ela diz se sentiu obrigada a continuar viva.
Como você percebeu que estava em meio a um tiroteio?
Eu meus amigos ouvimos o barulho e nos escondemos atrás de um morro. Não tínhamos como ver muita coisa de lá. Então começaram a chegar mensagens nos celulares, com perguntas sobre como era o atirador e se ele estava sozinho. Depois nos avisaram que era um homem vestido como policial e que ele estava vindo em nossa direção.
Primeiro eu rezei, mas tentei ao mesmo tempo acalmar os outros ao meu redor. Em seguida, enviei uma mensagem para o líder do movimento juvenil trabalhista. Ele disse que estava a salvo e eu perguntei o que deveria fazer, já que éramos quatro encurralados em um rochedo. A resposta foi simples e direta: “Nade!”
Não havia outra alternativa?
Era muito difícil achar um lugar para nos esconder. Fugir a nado pareceu mesmo a melhor opção. Quando pisei na água, vi um corpo boiando, com o rosto para baixo. Eu o puxei até a terra e vi que era um amigo -- havia um buraco na cabeça dele. Mas não tive tempo de reagir emocionalmente. Dei um beijo nele e voltei para o lago. Antes, ainda mandei mensagens de despedida para minha família e meu melhor amigo, Robin.
Você duvidou que poderia se salvar?
Não nado bem e parecia claro que acabaria afundando. Me senti preparada para morrer afogada. A morte estava muito próxima.
É difícil dizer de onde tirei forças. Provavelmente das pessoas que eu queria ver de novo. Cada vez que tirava a cabeça da água, pensava: "um fôlego para minha mãe, um para o meu pai, um para os meus amigos". Em um determinado momento, olhei para trás e vi o sorriso satisfeito no rosto do atirador. Ele apontou a arma na nossa direção e começou a disparar, rindo. Nunca irei me esquecer dessa cena. Foi naquele instante que nadei ainda mais depressa.
Quem te acompanhou na água?
Várias pessoas, mas me lembro em especial de um garotinho. Eu disse que ele era um excelente nadador e ele respondeu: "Meu pai está morto". Pedi que ele não pensasse naquilo e se concentrasse em nadar. O menino parecia confuso e disse: "Pensei que a polícia deveria ser boa conosco."
O assassino não queria deixar ninguém vivo. Um dos meus amigos estava prestes a pular na água, mas acabou sendo atingido, na minha frente. Vi a cabeça dele explodir. O terrorista atirava nos que estavam na terra e também naqueles que tentavam nadar. Um garoto que nadava próximo a mim foi baleado e o sangue dele se espalhou imediatamente na água.
Acho que alguns morreram afogados. Uma amiga minha gritou: "Emma, não consigo fazer mais nada". Voltei e pedi que mantivesse o ritmo, que respirasse por ela e por mim, pois logo estaríamos a salvo. Deixei que ela se agarrasse aos meus ombros e nadasse usando apenas as pernas. Nós estávamos em pânico. Eu mesma cheguei a quase desistir no meio do caminho. No fim, o garoto que perdeu o pai, minha amiga e eu fomos resgatados pelo mesmo bote.
No seu blog você diz que foi atingida por uma bala. Como foi isso?
Minha amiga gritou atrás de mim: "Emma, você está sangrando!". Olhei para baixo e vi o sangue jorrando do meu braço esquerdo. Só naquele instante eu entendi porque doía tanto, mas não quis parar. Ainda era possível ouvir tiros, gritos e a risada, a inconfundível risada do desgraçado. Ele gritava e dizia que não escaparíamos.
Você frequentava o acampamento em Utoeya há quanto tempo?
Foi minha primeira vez. Todos os anos minha família viaja para a Bósnia e para Montenegro, mas esse ano eu quis ir para Utoeya e voltei mais cedo das férias.
Lá tinha todos os atrativos de um acampamento de verão tradicional. Durante cinco dias, nós jogamos futebol e vôlei, dançamos, vimos shows de música, organizamos festas. Esse tipo de coisa. O diferencial eram as atividades com ênfase na política. Havia barracas onde os jovens podiam escolher o assunto em que queriam se aprofundar, como política internacional, relações partidárias etc. Eu sempre gostei muito de política e queria fazer algo pela Noruega.
O massacre mudou seus planos profissionais?
De forma alguma. É importante que cada um de nós continue a atuar da forma que quiser. Assim o monstro não vai achar que conseguiu vencer nossa política pacífica.
Já na vida pessoal, tudo mudou. Tenho medo de tudo o que me cerca. Tenho de medo de barulho, fico olhando para trás sem parar e nunca saio sozinha. Meu melhor amigo está sempre comigo. Ele nunca me deixa só. As pessoas me perguntam coisas sobre Utoeya a todo instante e, quando não consigo responder, é meu amigo quem responde por mim. Mas, mesmo com ele, eu continuo assustada. Estou sempre preparada para correr e nem mesmo sei o porquê.
O que você sabe sobre o atirador?
Sei que ele foi preso e que escreveu um manifesto de ódio. Mas eu não posso lê-lo. Não tenho condições de saber como ele planejou nos matar. Jamais vou perdoá-lo, mas não sinto nada por ele. A sensação é de vazio ao pensar naquela pessoa. Na verdade, chego a sentir ódio por dez segundos, só por causa das pessoas que ele tirou de mim. Mas depois esse sentimento ruim vai embora e não sobra nada mesmo.
Minha amiga gritou atrás de mim: "Emma, você está sangrando!". Olhei para baixo e vi o sangue jorrando do meu braço esquerdo. Só naquele instante eu entendi porque doía tanto, mas não quis parar. Ainda era possível ouvir tiros, gritos e a risada, a inconfundível risada do desgraçado. Ele gritava e dizia que não escaparíamos.
Você frequentava o acampamento em Utoeya há quanto tempo?
Foi minha primeira vez. Todos os anos minha família viaja para a Bósnia e para Montenegro, mas esse ano eu quis ir para Utoeya e voltei mais cedo das férias.
Lá tinha todos os atrativos de um acampamento de verão tradicional. Durante cinco dias, nós jogamos futebol e vôlei, dançamos, vimos shows de música, organizamos festas. Esse tipo de coisa. O diferencial eram as atividades com ênfase na política. Havia barracas onde os jovens podiam escolher o assunto em que queriam se aprofundar, como política internacional, relações partidárias etc. Eu sempre gostei muito de política e queria fazer algo pela Noruega.
O massacre mudou seus planos profissionais?
De forma alguma. É importante que cada um de nós continue a atuar da forma que quiser. Assim o monstro não vai achar que conseguiu vencer nossa política pacífica.
Já na vida pessoal, tudo mudou. Tenho medo de tudo o que me cerca. Tenho de medo de barulho, fico olhando para trás sem parar e nunca saio sozinha. Meu melhor amigo está sempre comigo. Ele nunca me deixa só. As pessoas me perguntam coisas sobre Utoeya a todo instante e, quando não consigo responder, é meu amigo quem responde por mim. Mas, mesmo com ele, eu continuo assustada. Estou sempre preparada para correr e nem mesmo sei o porquê.
O que você sabe sobre o atirador?
Sei que ele foi preso e que escreveu um manifesto de ódio. Mas eu não posso lê-lo. Não tenho condições de saber como ele planejou nos matar. Jamais vou perdoá-lo, mas não sinto nada por ele. A sensação é de vazio ao pensar naquela pessoa. Na verdade, chego a sentir ódio por dez segundos, só por causa das pessoas que ele tirou de mim. Mas depois esse sentimento ruim vai embora e não sobra nada mesmo.
Fonte: Ernani Lemos e Juliana Yonezawa | Londres (Opera Mundi)
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